Elas reclamam de falta de fiscalização, preço alto de empreiteiras e serviços mal feitos
Famílias dizem que serviços mal feitos causam infiltrações e danos aos túmulos no Cemitério da Saudade (Janaína Ribeiro/AAN)
A situação de abandono vivida no Cemitério da Saudade, revelada em reportagens pela Agência Anhanguera de Notícias (AAN), é confirmada por famílias que se dizem prejudicadas pela administração do local. Ao menos quatro leitores informaram que enfrentaram ou ainda enfrentam problemas que, muitas vezes, prejudicam a manutenção dos túmulos. Alguns criticaram os trabalhos das empreiteiras que fazem obras nos túmulos, que têm parceria e são indicadas com a Setec. Por ser tombado como patrimônio histórico, algumas intervenções precisam ser autorizadas pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas (Condepacc). Em dezembro do ano passado, o jazigo da família do funcionário público Maurício Barbosa de Oliveira, de 41 anos, foi furtado. Foram levados um vaso e alças de bronze. A tampa da sepultura foi danificada e as placas de concreto que ficavam dentro também desapareceram. "Comunicamos a administração do cemitério, mas houve pouco caso. Ficou um jogo de empurra-empurra e resolvemos fazer um boletim de ocorrência", contou. Descaracterização Só depois de ter apresentado o registro policial, uma providência foi tomada, mas que não agradou em nada a família. "Eles trocaram a tampa e colocaram uma que descaracterizou completamente a sepultura. O túmulo era todo de granito, tinha um capricho, e colocaram uma tampa de um outro tipo de material", criticou. A mãe de Oliveira, proprietária do túmulo, teve de pagar para refazer o serviço. "Quando construímos, há cerca de três anos, gastamos quase R$ 7 mil e agora, mais R$ 500 para consertar o que fizeram." Raquel Soares, que visita jazigos de familiares toda semana, também se revolta com a situação. "Eu fico chocada. A situação é drástica há muito tempo. Eu saio de lá chateada toda vez." Levantamento Na tarde desta quarta-feira (12), funcionários da Setec faziam o levantamento dos túmulos com problemas. A estimativa é que mais de 5 mil precisem de algum tipo de intervenção. Nesta semana, a Secretaria de Serviços Públicos de Campinas foi acionada para socorrer a autarquia de Serviços Técnicos Gerais (Setec) e ajudar a resgatar o cemitério do abandono em que se encontra. O prefeito Jonas Donizette (PSB) solicitou uma manutenção "adequada" ao secretário, Ernesto Paulella, e ao presidente da Setec, Sebastião Buani dos Santos. De imediato, será feito o recapeamento das alamedas que dão acesso às sepulturas. Além disso, a Setec fará um novo mutirão de chamamento das famílias para a manutenção dos túmulos. Mal feito Proprietário de um túmulo no cemitério, um homem de 60 anos, que preferiu não se identificar com medo de represálias, criticou a situação do Saudade e afirmou que falta fiscalização da Setec obras em alguns túmulos são mal feitas e provocam problemas como infiltrações, acelerando a degradação. Apenas equipes da Setec têm autorização para fazer enterros. Já para a construção ou reformas de túmulos, terceiros podem ser contratados. "Quando minha mãe foi enterrada a tampa não foi fechada corretamente e começou a infiltrar água. Eu troquei tudo. Em dezembro do ano passado, abriram a sepultura novamente para enterrar meu irmão, fiquei até o final do trabalho dos coveiros para ver se fechavam direito" , contou. Ele sugeriu que alguns túmulos são quebrados de propósito. "Aquela destruição que existe lá não é só o tempo, é a mão do homem. Quem destrói eu não sei, mas muitos túmulos estão quebrados no pé, aí começa a infiltrar, o túmulo começa a cair e tem que ser reformado." Frequentador do cemitério há 50 anos, disse que nunca viu o local tão abandonado como hoje. "A Setec deveria fiscalizar mais para evitar esse serviço mal feito. Além disso, proibir que carros andem dentro do cemitério, o que ajuda a danificar o calçamento e alguns túmulos. É uma falha geral."Reclamações antigas Um dos leitores que entrou em contato com o Correio afirmou que teve que pagar R$ 5 mil na reforma do túmulo da família que foi danificado, há cerca de três anos. O serviço foi feito por uma empreiteira indicada na lista da Setec, "que poderia atender ao padrão Setec." "Fiquei assustado com o valor cobrado, muito acima de valores de mão de obra de mercado, mas não tivemos outra escolha" , afirmou o homem, que não quis ser identificado. As reclamações sobre os abusos nos preços praticados é antiga. Em 2000, reportagem mostrou que uma obra que não levava mais do que 40 minutos para ser concluída não saía por menos de R$ 640, quando um pedreiro particular cobrava R$ 380,00. Na época, a Setec prometeu reprimir os abusos e disse que a empreiteira que fosse flagrada cobrando preços abusivos para realizar reparos nos túmulos teria de devolver o dinheiro ao cliente e corria o risco de perder o direito de trabalhar no local. Mas, em 2009, em outra reportagem, o grupo de empreiteiros que domina o mercado de reformas e construções de túmulos no Saudade continuava agindo. Segundo um pedreiro ouvido pela reportagem naquele ano, a construção de um túmulo novo não custaria mais do que R$ 1 mil. O orçamento de uma das empresas procuradas pela reportagem chegou a R$ 6 mil para o mesmo serviço, com prazo de 30 dias para a entrega. Uma diferença de 500% no valor. Outro ladoA Setec informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não realiza reformas nos jazigos, cuja competência é exclusiva das famílias. Mas ressaltou que, para a realização de abertura e fechamento de túmulos em caso de sepultamento, possui uma lista de cinco empreiteiros que fazem esse serviço, sempre acompanhados por um funcionário da autarquia. Em caso de descontentamento, o proprietário da sepultura deve fazer a reclamação via protocolo, no balcão de atendimento da Setec que fica no cemitério da Saudade ou via Serviço 156. "Se o serviço for considerado mal feito, após análise da Setec, o empreiteiro poderá ter o cancelamento da permissão de trabalho dentro do cemitério" , informou. "Trata-se de um contrato entre particulares, a Setec não tem nada a ver com os preços nem com a forma de pagamento" , ressaltou, em nota. É preciso, no entanto, solicitar autorização via protocolo junto à autarquia, onde é anexado um croqui da obra a ser realizada. Reparo Em caso de túmulo danificado, a família é notificada, e tem 30 dias para concluir o reparo. Caso isso não ocorra, e os danos estejam prejudicando a sepultura ao lado, a Setec remove a parte de cima do túmulo e fecha com uma laje de concreto para evitar infiltrações. Em caso de roubo ou quebra do túmulo, o proprietário pode protocolar junto à autarquia pedido de ressarcimento, que será analisado pelo departamento jurídico para providências. Em relação à circulação de automóveis dentro do cemitério, informou que há controle de portaria e somente em casos especiais, quando há pessoas muito idosas ou com mobilidade reduzida que queiram visitar o jazigo da família, é liberado o acesso, além de veículos da própria Setec.