Márcio Caetano teve a oportunidade de ser companheiro de time de Neymar da Silva Santos, pai do atacante Neymar do Paris Saint Germain
Márcio Caetano e o carregamento da tocha olímpica: uma vitória pessoal e intransferível (Divulgação)
Em qualquer lugar do Brasil, existe uma menina ou menino com desejo de ser jogador de futebol. De utilizar a bola para alterar o seu destino. Em Pradópolis, próximo a Ribeirão Preto, crianças e adolescentes corriam atrás de uma bola. Entre eles, Márcio Caetano, 52 anos, hoje um corretor de seguros ligado até hoje ao Mundo do Futebol. E ele não desgruda por um motivo: é impossível abandonar quem mudou sua vida para melhor, mesmo que a carreira não tenha sido linear e chamativa.
Nascido em família humilde e de poucos recursos, o seu destino parecia ser o de seus pais, ou seja, a de trabalhar na Usina São Martinho, que na época era um dos pólos econômicos de Pradópolis. O roteiro mudava aos finais de semana, quando participava de campeonatos feitos entre as usinas da região. Residente em uma colônia próxima ao empreendimento, Márcio Caetano começou a despertar atenção e em certo dia, ao participar de uma competição em Lagoa da Serra. Fim de torneio, o então garoto de 12 anos foi abordado por um sargento do Corpo de Bombeiros que lhe fez uma proposta: fazer um teste no comercial de Ribeirão Preto.
Quando participou do treinamento, o retorno foi além do esperado. Os dirigentes nunca mais deixaram Márcio sair do estádio Palma Travassos. Sua vida nunca mais foi a mesma. “Um ano depois, eu comecei a morar na República do clube e ali me auxiliaram na questão de alimentos, estudo e vestuário”, disse Márcio Caetano. Aquele mundo era estranho para os seus pais. A mãe era dona de casa e o pai guincheiro de cana de açúcar. Eles não dimensionaram até onde o filho poderia chegar em um espaço inóspito e desconhecido. “Eles ficaram deslumbrados. Um filho que sai da roça e depois vai projetar a vida em uma cidade como Ribeirão Preto não era algo que estava nos planos deles. Tenho mais quatro irmãos e eu sou a ovelha desgarrada porque naquela época criava-se os filhos para trabalhar na usina e trazer o sustento para casa. E aos 14 anos eu disse que não queria trabalhar na usina e que sonhava em ser jogador de futebol”, conta Márcio Caetano.
Márcio Caetano mirou no essencial: virar um jogador profissional. Paulatinamente, as conquistas aparecem primeiramente nas categorias de base, sempre na posição de lateral-esquerdo. Depois ocorreu o deslocamento para a zaga, quando nunca mais abandonou a função.
Chega a década de 1990, e Márcio Caetano celebrou a oportunidade de conviver com treinadores do porte e quilate de Vanderlei Paiva e Galdino Machado no Bafo. Mas em 1990, ocorreu o primeiro empréstimo para a Internacional de Limeira que tinha Lica, chegou a ser convocado para a Seleção Brasileira de Juniores. “Ainda ali tive a chance de disputar a Copa São Paulo e enfrentar ícones como o (lateral-esquerdo) Roberto Carlos”, contou o ex-jogador. Depois, Márcio Caetano teve passagens por Sertãozinho, Radium de Mococa e Guararapes.
Sua principal estadia, no entanto, foi no União de Mogi das Cruzes, em 1995. Ali, ele foi comandado pelo ex-goleiro da Seleção Brasileira, Valdir Peres, falecido em julho de 2017.
Para quem afirma como a política não interfere no futebol, Márcio Caetano relembra como a implementação do Plano Real, em julho de 1994, atrapalhou a vida dos clubes médios e pequenos do interior de São Paulo e como esse quadro diminuiu seu espaço no mercado de trabalho. “Não conseguimos dar sequência na carreira e aos 26 anos tivemos que escolher entre ser jogador ou ser empresário”, lamentou. “Tive muitas propostas em 1996, mas os salários e as luvas eram muito baixos. Mas fiz muitas amizades”, esclareceu.
Nos anos seguintes, Márcio Caetano foi um corretor de seguros e coordenador de crédito de um grande banco. Só que ele não ignora o fato que, sem o futebol, sua vida não teria inserido tantas aventuras e experiências inesquecíveis. “Se não fosse pelo futebol, eu não estaria em Campinas e não teria conhecido amigos que tenho em todo o Brasil e que foram ou são jogadores renomados”, completou Márcio Caetano, mais um produto deste milagre chamado futebol, que como dizia o escritor Eduardo Galeano é a “única religião que não tem ateus”.
A CONVIVÊNCIA COM O “NEYMAR PAI” E O GAROTO NOS TREINAMENTOS
Quando atuou no União de Mogi das Cruzes, em 1995, Márcio Caetano teve a oportunidade de ser companheiro de time de Neymar da Silva Santos, pai do atacante Neymar do Paris Saint Germain.
Segundo Márcio Caetano, o sistema tático da equipe de Mogi das Cruzes contava com Neymar “pai” como ponta direita, o que seguia a nomenclatura tática da época e o ex-zagueiro exercia a função de marcador do então jogador nos treinamentos. “Ele não tinha tanto a habilidade que o filho tem hoje. Ele botava a bola na sua frente e já era. Ele tinha um corte muito seco para o meio (campo). Ou seja, ele fingia que se dirigia para um lado, jogava para outro e aí era um abraço. Ele tinha uma agilidade muito grande”, disse. “Era um cara importante para a equipe porque ele chegava fácil à linha de fundo e cruzava”, completou.
Márcio Caetano recordou que, então com três anos, o atual atacante da Seleção Brasileira aparecia junto com o pai nos dias de rachões, que são as atividades descontraídas liberadas pelos treinadores. “Geralmente tinha um garoto ou outro e o Neymar estava no meio”, completou Márcio Caetano, que recorda ainda da presença na ocasião do lateral-esquerdo Julimar, que fez parte do elenco do Guarani que conseguiu o acesso na Série B do Campeonato Brasileiro em 1991.
OPERÁRIO DA BOLA SENTE SAUDADE DA FORÇA DO FUTEBOL DO INTERIOR
Atuante em uma época com protagonismo das equipes do interior, Márcio Caetano observa com atenção o atual momento em que aos poucos o futebol caipira retoma o seu lugar de destaque. O Red Bull Bragantino encontra-se na divisão de elite, enquanto que a Série B tem Guarani, Ponte Preta, Ituano, Botafogo de Ribeirão Preto, Mirassol e Novorizontino. Já na Série D, o certame conta com com Santo André, XV de Piracicaba, Internacional de Limeira e Ferroviária.
Mas Márcio Caetano considera que o quadro poderia ser ainda melhor. “Falta incentivo na categoria de base. É fundamental para revelar um atleta que possa lhe render frutos no futuro”, disse.
Para exemplificar a sua tese, Caetano exemplifica como os conceitos foram invertidos no futebol. “Existia um colegiado de equipes do interior (de São Paulo) que abastecia os gigantes do futebol brasileiro. Hoje são eles que fornecem jogadores aos clubes do interior”, disse.
A falta na atualidade de escolinhas de bairro, de áreas com campos de terra são outros fatores que explicam, segundo ele, o atual quadro. “Eu vejo muita falta de técnica e de empenho e inteligência. O futebol brasileiro é malandro. Estamos com jogadores muito robôs”, arrematou.
CARREGAR A TOCHA OLÍMPICA, UMA CONQUISTA PESSOAL
Márcio Caetano tem um título pessoal e intransferível, que foi a honra de carregar a tocha olímpica pelas ruas de Campinas às vésperas da Olimpíada realizada no Rio de Janeiro. Ele conta que durante um período ele foi funcionário de uma instituição financeira e disputou por cinco anos o Campeonato Amador de Osasco e com a camisa desta marca. Ali, o zagueiro deu lugar a um meia esquerda impiedoso e Caetano tornou-se artilheiro da competição. “Em 2016, chegou um telegrama em casa pedindo se eu poderia participar do revezamento da tocha. Eu relutei porque achei que era uma pegadinha”, disse o ex-jogador.
Quando o material chegou em sua residência, o sonho virou realidade. Foram apenas 300 metros percorridos em junho de 2016 em trecho da avenida Francisco Glicério. “Foi uma realização única. Foi a minha consagração que não tive como jogador de futebol de atuar em grande clube”, arrematou. ‘