Brasil é eliminado nos pênaltis (Rodolfo Buhrer/Estadão Conteúdo)
A eliminação do Brasil na Copa do Mundo do Catar de 2022 foi diferente das anteriores pelo favoritismo que a Seleção tinha para ir mais longe. Ao contrário de quando caiu para França (2006), Holanda (2010), Alemanha (2014) e Bélgica (2018), o Brasil era favorito para a partida contra a atual vice-campeã do mundo Croácia, mesmo com o forte meio-campo do time europeu. Assim como ocorreu durante os outros jogos, o Brasil criou mais chances e finalizou mais que os adversários, mas não conseguiu converter a superioridade em tantos gols, com exceção das oitavas de final contra a Coreia do Sul.
A Croácia foi efetiva e aproveitou o pior momento defensivo do Brasil na Copa: um contra-ataque, um passe para a entrada da área e uma finalização que ainda desviou em Marquinhos para vencer Alisson e levar a decisão para os pênaltis. Uma câmera flagrou Neymar, depois do gol, dizendo ao volante Fred que não havia necessidade de subir para o ataque faltando cinco minutos para o jogo acabar e com o Brasil à frente do placar, mas o recado precisava ser dado antes.
É difícil apontar apenas um erro no gol de empate. Faltou ao Tite, talvez, a mesma ousadia que teve no início da Copa do Mundo ao botar Vini Jr no time titular e jogar com apenas um volante. Talvez fosse a hora de fazer o oposto, de recuar o time, povoar o meio-campo, substituir alguns jogadores esgotados durante a partida, como Casemiro. O passe do Pedro, o avanço de Fred para disputar a bola na linha de fundo, Rodrygo e Neymar esperando a jogada, Casemiro sendo facilmente batido por Modric no início da jogada... são muitos elementos que se somaram para ajudar a Croácia na criação da boa oportunidade que foi convertida.
Nos pênaltis, Rodrygo e Marquinhos erraram as suas cobranças e o sonho de conquistar o sexto título mundial ficou para 2026. Foram cinco copas disputadas sem título e o Brasil completará 24 anos desde a última conquista - o mesmo período de jejum que a Seleção passou após vencer a Copa de 1970 no México e só voltando a ganhar em 1994 nos Estados Unidos. Aliás, os EUA serão sede da 23ª Copa do Mundo, desta vez ao lado de Canadá e México.
QUEM SERÁ O SUCESSOR DE TITE?
E que Seleção Brasileira teremos em 2026? Ainda confiante? Traumatizada? Qual será o estilo de jogo? Embora grande parte dos jogadores que estiveram presentes no Catar sejam jovens, tudo vai passar por quem a CBF vai escolher como próximo técnico. Não há um nome claro, um sucessor natural, como foi na vez de Tite.
Entre os brasileiros, os nomes mais veiculados pela imprensa e por torcedores são os de Cuca, Dorival Júnior, Renato Gaúcho, Mano Menezes - todos longe do ápice da carreira - e Fernando Diniz - que faria muita gente se descabelar, mas que também teria apoio de jogadores que admiram o trabalho treinador.
O problema na escolha por Fernando Diniz seria a pouca paciência que o torcedor, imprensa e profissionais da bola têm com o estilo de jogo que ele gosta de aplicar nos seus times. Também não há paciência para qualquer coisa que seja feita fora do tradicional na Seleção Brasileira. Muitos analisaram após a derrota para a Croácia que o Tite poderia ter reforçado o meio-campo e entrado com um atacante a menos e mais um volante desde o início do jogo. Ele não teria sofrido críticas antes da bola rolar apenas por essa alteração? Será que a cultura do futebol brasileiro impede um treinador de jogar se adaptando ao adversário e não apenas em função de suas estrelas? A pressão atrapalha a criatividade?
Como seriam as reações às mudanças de Diniz nos primeiros jogos, à implementação das suas ideias? Também joga contra o fato de Diniz não parecer 100% pronto para a missão - mesmo sendo o técnico que mais me agrada no futebol brasileiro. A mesma coisa vale para Rogério Ceni. Ele conhece bem a Seleção, foi um dos maiores jogadores do futebol brasileiro, mas talvez seja ainda precipitado pensar em Ceni como técnico do Brasil.
É difícil ver nos demais treinadores brasileiros a capacidade de fazer adaptações relevantes e melhorar a Seleção. Até mesmo de fazer um trabalho semelhante ao que Tite fez nesses seis anos. Ainda falta em muitos desses nomes a vontade para acabar com alguns tradicionalismos que ainda temos e nos atrapalham em período de Copa do Mundo, de um campeonato de tiro curto cada vez mais equilibrado, como modificar duas, três peças de acordo com o adversário que irá enfrentar ou mesmo um grande jogador começar no banco de reservas por estratégia ou necessidade tática.
PORTUGUESES NA MIRA?
Acredito que a CBF também esteja com a mesma dificuldade em confiar nos tradicionais candidatos brasileiros para o cargo, o que acarreta em outra polêmica: o sucesso dos portugueses no Brasil pode fazer com que Jorge Jesus ou Abel Ferreira sejam convidados para o cargo? Se parte da imprensa e dos treinadores brasileiros criticam a chegada de estrangeiros no Campeonato Brasileiro, como seria a reação em uma eventual chegada de Jesus à Seleção? O trabalho já começaria questionado, com um nível de cobrança maior? Como Jesus, que tem um temperamento forte, reagiria a isso?
A mesma coisa vale para Abel. O estilo de jogo da Seleção seria o mesmo que ele adota no Palmeiras? O que aconteceria se nos primeiros jogos a Seleção não brilhar? Vale lembrar que Abel também tem uma personalidade forte. Ainda há técnicos argentinos que poderiam ser cogitados, mas isso provocaria uma celeuma tão grande no futebol brasileiro que acredito que essa ideia será descartada tão logo surja.
Sonhar com Pep Guardiola e Carlo Ancelotti pode ser contraproducente, mas acredito que de todos os grandes técnicos das últimas décadas do futebol mundial apenas um aceitaria o desafio: José Mourinho. Ele não está mais no auge da carreira e, claro, fala português. Se a CBF quer um grande técnico estrangeiro, está de olho em portugueses, é impossível não considerar Mourinho. Pesa contra o fato de nunca ter trabalhado no Brasil e por também ter um temperamento difícil, mas pelo tamanho que Mourinho tem na história do futebol as críticas internas poderiam ser bem menores.
Não creio que seja o melhor nome para a geração de garotos brasileiros, mas seria uma grande surpresa e todos os olhos estariam voltados para a combinação entre a Seleção com a história mais vitoriosa e mais craques revelados e um dos maiores técnicos das últimas décadas.
Dito tudo isso, acredito que não há escolha fácil. O que não podemos é retroceder. Tite não foi bem na Copa do Mundo, mas preparou o Brasil muito bem durante as Eliminatórias e deu espaço a jogadores jovens que atropelaram a concorrência e foram por merecimento. Há um trabalho, que não rendeu o esperado, mas que foi iniciado por Tite.
Após o 7 a 1 em 2014 a Seleção estava ferida. Dunga assumiu pela segunda vez o Brasil em um erro claro da CBF, corrigido em 2016 com a contratação de Tite. A CBF não pode errar de novo. Inventar um novo Dunga seria um desastre. O Brasil perdeu duas Copas do Mundo com Tite, mas não pode jogar no lixo todo o trabalho que tem méritos e uma lógica.
O próximo técnico terá que adaptar, melhorar, construir, mas sem destruir totalmente tudo o que foi feito. Pela primeira vez em muito tempo há uma base interessante para o sucessor não começar do zero. Os jovens convocados por Tite (dos 11 meias e atacantes convocados, apenas dois têm mais de 25 anos) vão ter a responsabilidade de liderar uma Seleção que pode não ter mais Neymar, ídolo e referência de todos eles que cresceram assistindo e se inspirando no camisa 10.
A primeira missão e desafio do próximo técnico será a de não retroceder, não atrapalhar e colaborar com esses jovens que possivelmente estarão no auge de suas carreiras em 2026.