BASTIDORES

Fé e determinação para superar os desafios do futebol

Seja com o Ministério Atletas de Cristo ou de modo individual, Cristãos Evangélicos trabalham para deixar mais leve o clima de cobrança do futebol

Esportes Já
02/06/2025 às 14:53.
Atualizado em 02/06/2025 às 14:53

O preparador físico Walter Grassmann participa das reuniões com jogadores na concentração (arquivo pessoal)

Fé e Futebol estão juntos. Para sempre. Em todas as rodadas das divisões do Campeonato Brasileiro, somos testemunhas de jogadores comemorando os gols com as mãos direcionadas ao alto. Nas entrevistas pós-jogo, o autor do gol da vitória agradece a Deus por tudo que ocorreu no gramado. Antes e depois, nos vestiários, ninguém abre mão do cerimonial do fechamento, em que um círculo é estabelecido e os jogadores rezam o Pai Nosso na versão católica. A fé, a busca de uma estabilidade espiritual, ganhou contornos relevantes com o ministério dos Atletas de Cristo. Surgido no dia 4 de fevereiro de 1984 por João Leite, Baltazar e o Pastor Abrarão Soares, o movimento ganhou musculatura com o ex-atleta Silas Pereira e tem um núcleo em Campinas, cujos clubes têm atletas cristãos evangélicos. 

O futebol reflete o movimento detectado por pesquisas. Segundo dados apurados em censos do IBGE, o contingente de cristãos evangélicos no Brasil saltou de 26,2 milhões para 42,3 milhões em 2010. Os números relativos a 2022 indicam que os evangélicos são 22,2% da população brasileira. Resultado: o percentual de evangélicos em relação à população do país avançou de 15,5% para 22,2%. Em 1991, eles representavam apenas 9%. Em contrapartida, os católicos, em 10 anos, caíram de 73,6% para 64,6%. A estimativa é que, na atualidade, o percentual de cristãos evangélicos esteja entre 27% a 34%, de acordo com estimativas. 

Frequentador da Igreja do Nazareno em Campinas, o ex-meio-campista Silas é integrante dos Atletas de Cristo desde 1984. Segundo ele, os passos iniciais do trabalho em São Paulo começaram na casa do Fábio Fraga, um atleta de Remo. Depois, o trabalho foi expandido para Itália e Portugal. Ao então jogador, Silas coube ajudar o trabalho na Argentina, quando jogou no San Lorenzo. 

Nos dias atuais, a função do ministério é ajudar o atleta a superar desafios do cotidiano do jogador de futebol, como a fama, dinheiro, a construção da família e como isso deve ser vivenciado. Resultado: a expansão chegou à Seleção Brasileira e, segundo Silas, com resultados valorosos. “O Alex Dias Ribeiro foi capelão na Seleção Brasileira em cinco ou seis Copas do Mundo, mais jogos olímpicos. Foi muito legal e gratificante”, disse.

O trabalho em Campinas está sob responsabilidade de Marcelo Pelissari. Comandante das reuniões que ocorrem no meio de semana em uma unidade da Igreja do Nazareno, no Jardim Paraíso, Pelissari não tem dúvidas em apontar como o trabalho dos Atletas de Cristo e a fé evangélica auxiliam na superação dos problemas da carreira de jogador de futebol. “Nós sabemos que a pressão não é só no futebol ou em qualquer competição que envolve alto rendimento. O atleta sempre é cobrado por resultado e no esporte só um consegue a vitória ou é campeão. Sabemos que o estresse é grande”, disse. Nas reuniões, os atletas, segundo Pelissari, contam com a oportunidade de receberem apoio de outros jogadores e viverem momentos de confraternização. 

Fora do templo, os desafios são diferentes. Um deles é se colocar em um ambiente em que, por exemplo, insultos e palavras de baixo calão são costumes arraigados. “É preciso saber se colocar e testemunhar. Não pode agredir a pessoa que faz a interlocução do insulto. Tem que fazê-la refletir de que ela deve mudar o caminho. Claro que a gente tem que ter muito equilíbrio. Orientamos para ocorrer o domínio próprio, respeito, não só ao adversário, como também à arbitragem e outras situações, para que se foque no jogo. Quando o foco é total no jogo, você terá bom êxito nas suas ações”, arrematou. 

Vinculado ao Guarani, o atacante João Victor encontra-se no Tokushima Vortis, do Japão. No ano passado, ele estava no elenco que não conseguiu escapar do rebaixamento na Série B. Segundo ele, possuir uma vida de proximidade com Deus é vital para suportar tais adversidades. “Essa célula lá que eu participava com os meninos (no Guarani) era importante. A gente passava por uma situação difícil, mas em nenhum momento a gente desistiu”, disse.

Para ele, possuir um relacionamento com Deus faz a diferença nestes momentos. “Todos os dias a gente erguia a cabeça e buscava um ânimo que vinha mesmo do Senhor Deus, que nos reanimava, dava força todos os dias para a gente trabalhar e tentar buscar reverter a situação que a gente tava se encontrando”, disse. “A gente não pode deixar de buscar Ele em nenhum momento”, arrematou. 

Goleiro titular da Ponte Preta, Diogo Silva utiliza as suas redes sociais para propagar a sua fé e transmitir pensamentos com base na Bíblia Sagrada e na passagem de Jesus Cristo pelo planeta Terra. Após o jogo contra o Náutico, no dia 24 de maio, a seguinte mensagem foi postada pelo goleiro. “Gratidão a Deus pela sua bondade para conosco, mais três. A Deus toda honra e toda a glória”, escreveu o goleiro, que não abre mão deste sustentáculo em sua vida.

DESEMPENHO E RELAÇÃO COM DEUS DEVEM FICAR SEPARADOS, AFIRMA PREPARADOR FÍSICO

Ex-preparador físico do Guarani em diversas ocasiões, sendo a última passagem em 2011, Walter Grassmann não tem receio de declarar sua fé cristã evangélica. Apesar de não ser ligado formalmente ao ministério Atletas de Cristo, em todos os clubes nos quais exerce seu trabalho, ele separa um tempo para, com alguns jogadores, estudar a palavra, a Bíblia Sagrada e promover reuniões informais. 

A sabedoria precisou ser adotada em muitas ocasiões. Na parceria de 16 anos com o então técnico Oswaldo Alvarez, o Vadão, o preparador recebia a orientação para que tomasse cuidado ao abrir espaço para encontros religiosos. “O Vadão me pediu o seguinte: Walter, não convide ninguém, porque se você convida um pastor, amanhã vai um padre, amanhã vai um rabino. Então, não convide ninguém. Faça entre vocês”, revelou o preparador físico, hoje no Água Santa. 

O pedido era aceito, mas Grassmann esclareceu que, em alguns clubes, pastores e outros líderes religiosos são convidados. Ao contrário do que muitos imaginam, o preparador físico e os atletas envolvidos não fazem pedidos e súplicas que envolvam as quatro linhas. “Nós nunca pedimos por vitória ou nunca pedimos para termos supremacia sobre nosso adversário, porque isso é você que tem que realizar. Deus distribuiu dons e talentos a cada um de nós e temos que colocar isso em prática. Deus não vai evitar um gol, Deus não vai fazer um gol de cabeça para você”, analisou o preparador físico. 

No Água Santa, assim como em outros clubes, existe a separação de uma sala para os encontros com os atletas vinculados à fé cristã evangélica. A liderança do clube precisa conceder autorização. “A pessoa traz uma mensagem e nós oramos juntos, ouvimos a palavra e cantamos duas ou três músicas”, disse. 

Segundo o preparador físico, o cristianismo evangélico dentro do futebol pode ser exercido de maneira saudável e sem avaliações desconexas. “Nenhum dos atletas, nem membros de comissão, tem poder para nada. Você não melhora porque participa da reunião. Você melhora profissionalmente, porque você treina melhor, se alimenta melhor, se hidrata melhor, dorme melhor e, quando torna esse profissional, evidentemente o resultado de campo é diferente”, arrematou o preparador físico.

EX-LATERAL BUGRINO RELATA COMO FÉ CRISTÃ AJUDOU EM SUA TRAJETÓRIA

Alheios aos preconceitos que vivem quando se convertem ao cristianismo evangélico, ex-atletas não imaginam o que poderiam fazer de positivo sem a presença na vida deles do ministério dos Atletas de Cristo e também a conversão que alterou os destinos deles no quesito pessoal e profissional. O ex-lateral-esquerdo Rubens Cardoso é um exemplo disso. Revelado pelo Botafogo-SP em meados da década de 1990, Cardoso desembarcou no Guarani em 1997 respaldado por uma experiência de vida. “Eu tive uma experiência com Cristo na minha conversão no Botafogo de Ribeirão (Preto)”, disse Rubens Cardoso.

Ele considera que, quando existe um procedimento honesto e sem equívocos na experiência com Jesus Cristo, o processo flui de maneira natural. “Quando eu cheguei no Guarani, eu vivia o chamado primeiro amador, mas não conhecia o ministério Atletas de Cristo”, disse.

Em Campinas, quem lhe apresentou o trabalho foi o então líder Carlinhos Mercadante. Os preceitos do trabalho, na visão de Rubens Cardoso, são úteis até hoje aos atletas profissionais. “O ministério é muito voltado às peculiaridades do atleta profissional de futebol ou daquele que está ingressando na carreira.

Quem está fora do futebol talvez não tenha a dimensão do que é você ficar sob pressão e com medo, que tenta tomar conta geral da sua vida, da sua carreira, daquilo que Deus tem para você, das suas promessas, do seu talento. Às vezes o talento você começa a enterrar por falta de confiança”, disse Rubens Cardoso.

Para ele, o ministério até os dias atuais trata muito bem as questões de relacionamento com os atletas, mesmo daqueles que estão no exterior e não têm família e amigos próximos. “Isso ajuda demais os atletas a possuírem uma boa cabeça para conquistar o êxito com sucesso”, completou.

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Anuncie
(19) 3736-3085
comercial@rac.com.br
Fale Conosco
(19) 3772-8000
Central do Assinante
(19) 3736-3200
WhatsApp
(19) 9 9998-9902
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por