MULHER NO APITO

Cartão vermelho para o machismo e o desrespeito

A luta das árbitras começou na década de 1960 com Léa Campos

Esportes Já
12/12/2022 às 15:25.
Atualizado em 12/12/2022 às 15:25

Renata Ruel, Renata Marçal e Juliana França (Divulgação)

A cada vez que elas entram em campo, uma nova vitória é obtida na partida em que se enfrenta o machismo, misoginia e desrespeito.. Árbitras e assistentes envolvidas no mundo da arbitragem tem saldo positivo para celebrar com a realização da Copa do Mundo. Um trio formado somente por mulheres dirigiu a partida entre Alemanha x Costa Rica, o que dá combustível para que no Brasil a luta por espaço não termine.

Uma luta que começou na década de 1960, quando Léa Campos quebrou uma barreira e chegou a ter que batalhar para que o então presidente da CBD, João Havelange lhe entregasse o diploma de formação de árbitra. A batalha por espaço continua nas décadas de 1980, 1990 e começo do Século 21 com Silvia Regina da Silva, formada no curso de arbitragem em 1985 em uma classe com outros 29 árbitros homens. Silvia Regina atingiu o ápice ao dirigir a abertura do Campeonato Paulista entre Mogi Mirim x São Paulo no dia 04 de março de 2001. Na sequência, outras desbravaram no futebol profissional ou amador, mas os números ainda demonstram que a luta ainda é longa. Outra pioneira é a jornalista Ana Paula Oliveira, hoje integrante da Comissão de Arbitragem da Federação Paulista de Futebol.

De acordo com dados fornecidos pela assessoria de imprensa da Confederação da Brasileira de Futebol, existem no quadro da Comissão de Arbitragem 277 árbitros habilitados para dirigir um jogo de futebol nas competições chanceladas pela CBF. São 247 homens e 30 mulheres.O contingente feminino representa 12,14% do total. Por outro lado, a entidade conta com 381 assistentes sendo que 93 são mulheres, o que corresponde a 24,40% do total.

Na Federação Paulista de Futebol, o que quadro é mais delicado. A entidade tem 430 profissionais da arbitragem, sendo que 22 são mulheres (11 árbitras e 11 assistentes), o que equivale a 5,11% do contingente completo.

Diante da complexidade do quadro, quem já esteve no centro do jogo para conduzir uma partida ou foi assistente, considera que foi um vitória assistir o trabalho do trio formado por pela francesa Stéphanie Frappart, pela brasileira Neuza Back e pela mexicana Karen Diaz na vitória da Alemanha sobre a Costa Rica por 4 a 2. “A importância de um trio feminino em um jogo de Copa do Mundo e de assistente em jogo de oitavas de final é algo gigantesco. É um ganho histórico, um avanço muito grande, ainda mais em um país como o Catar em que a mulher é tão discriminada”, afirmou a comentarista de arbitragem dos Canais ESPN, Renata Ruel.

Na sua visão, o fato pode colocar um novo combustível para o aumento da presença da mullher na arbitragem brasileira. “Se você não tem uma referência você se desmotiva”, disse.

Ruel não deixa de citar exemplos de perseverança e resiliência, como a da árbitra Edna Alves Batista, que trabalhou em jogo de Série A, logo após os 14 anos do pioneirismo de Silva Regina e que no ano passado durante o Mundial de Clubes vencido pelo Chelsea foi escolhida pela FIFA para apitar a disputa de quinto lugar entre Al Duhail e Ulsan Hyundai FC, que perdeu por 3 a 1.. “Existem muitas mulheres que trabalham bem, mas na hora de serem árbitras centrais ou ser assistente, ela faz a opção de ser assistente porque terá mais oportunidades. Então, na hora que vemos as mulheres trabalhando como árbitras na Fifa, isso é um passo gigantesco porque motiva mais mulheres a procurarem a arbitragem”, completou Renata Ruel, que atua como comentarista. Ana Paula Oliveira foi procurada pelo Esportes Já para participar da reportagem, mas a assessoria da Federação Paulista de Futebol afirmou que ela encontra-se em viagem.

NO FUTEBOL AMADOR, O DESAFIO DE IMPOR RESPEITO E LIMITES

Se existem desafios para quem batalha por espaço na arbitragem do futebol profissional, os desafios não são menores para as mulheres que trabalham nos jogos de futebol amador que são realizados na Região Metropolitana de Campinas e em outros municipios do interior do estado de São Paulo.

Residente em Vinhedo e atuante na arbitragem do futebol de Campinas, Renata Pires Marsal não nega as dificuldades para realizar um trabalho de excelência. “É muito dificil você lidar com o fato de ser mulher, negra e atuar como instrutora de futebol. Por isso atuamos de maneira mais rígida. E por ser também uma mulher negra, eu preciso lidar com a parte do machismo, do racismo, da falta de confiança de muita gente. Apesar de futebol amador, existem equipes que nos vetam em jogos”, afirmou. “Como mulher negra, eu tenho pensar duas vezes antes de tentar errar”, afirmou. Também atuante no Futebol Amador do interior paulista, Luciana França não renega as dificuldades vividas.

“Infelizmente nós só não temos mais mulheres porque o caminho é dificil especialmente pela preocupação da família. Então, é preciso contar com o apoio família para que elas não parem no meio do caminho”, disse Luciana Franca. “Quando vou trabalhar em qualquer jogo, eu fico quando vejo uma mulher que vai atuar junto comigo”, arrematou.

Com tenacidade, Luciana França acredita de que é possível colher frutos de maneira imediata quando o trabalho é bem conduzido. “Quando a gente mostra o trabalho e se é bem feito eles (os jogadores) aceitam nossa presença. O preconceito é mais por parte da torcida”, completou.

A PAIXÃO PELO FUTEBOL LEVA AO SACERDÓCIO DA ARBITRAGEM

Seja no futebol amador ou na seara profissional, as mulheres sempre tem a paixão pelo futebol como combustivel para sonhar com o trabalho de árbitra ou assistente em grandes jogos.

Aos 43 anos, Renata Ruel relata que começou sua paixão pela arbitragem logo aos 14 anos. Na ocasião, ela ligou para Federação Paulista de Futebol para perguntar sobre o Curso de Arbitragem.

Ao receber a informação de que o requisito mínimo era completar o ensino médio, a contagem regressiva foi iniciada e só se encerrou quando atendeu a um pedido dos pais e fez uma primeira gradução em Administração. “A partir dali, eu conheci o mundo da árbitragem. Eu não venho de família com árbitros e nem tinha amigos árbitros. Depois me identiquei mais em bandeirar do que em apitar jogos”, disse Ruel. Quando já estava no ambiente da arbitragem, Ruel graduou-se em Pedagogia, fez MBA em Gestão do Esporte, e, após abandonar as tarefas da árbitragem e atuar como comentarista de arbitragem, ela fez pós em Jornalismo Esportivo.

No futebol amador, a paixão não fica atrás. Luciana França conta que até 2014 era uma torcedora e dirigente de um projeto social e após se sentir prejudicada em uma partida, no dia seguinte ela compareceu a sede da Liga Campineira de Futebol para protestar. Ali, ela conheceu o então presidente Irdival Fressato, falecido no ano passado. “Ele me convidou para um curso de arbitragem e eu aceitei. Acabei me apaixonando e estou até hoje”, completou.

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Anuncie
(19) 3736-3085
comercial@rac.com.br
Fale Conosco
(19) 3772-8000
Central do Assinante
(19) 3736-3200
WhatsApp
(19) 9 9998-9902
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por