DOAÇÃO

Espírito solidário guia Os Seareiros

Com núcleos em vários bairros da cidade, instituição oferece desde cesta básica até alfabetização

E-Braille
17/10/2013 às 19:12.
Atualizado em 26/04/2022 às 04:38

No começo da tarde, o cidadão toma o microfone, pede que as pessoas presentes orem, em silêncio, dando graças pelo alimento que recebem. Depois, uma a uma, as pessoas da plateia são chamadas à repartição anexa e recebem uma cesta com alimentos essenciais. O ritual acontece todos os meses em um núcleo assistencial construído em um terreno estreito às margens da Via Expressa Aquidabã. Muita gente que dirige pela movimentada Avenida General Carneiro nem percebe o imóvel modesto na paisagem. Rústico, simplório, maltratado por pichações, aparentemente abandonado. Mas aquelas paredes guardam comida, roupas, calçados. Doações recolhidas pela cidade toda e que ajudam a aliviar a vida dura de uma legião de campineiros carentes. O grupo espírita Os Seareiros foi fundado há 40 anos por cidadãos que seguiam à risca um ensinamento essencial da doutrina kardecista: a genuína caridade. E os voluntários não precisam se identificar. São pessoas bem-sucedidas, que ocupam cargos importantes em grandes empresas, universidades e repartições públicas. Mas que, ali dentro, se ocupam em separar mantimentos, ensacar doações, distribuir donativos, limpar o chão, preparar o cafezinho. Lá fora, usam gravata e despacham em ambientes refrigerados. Dentro do núcleo, são apenas operários de uma causa muito maior: ajudar quem precisa.  O terreninho estreito foi cedido em comodato pela Prefeitura ainda em 1985. Foi transferido para aquele cantinho da cidade, entre a Vila Industrial e a Ponte Preta, o serviço que os espíritas até então mantinham no Centro. Mas assistência não é assistencialismo. Antes de receber uma cesta básica, a família passa por uma cadastramento detalhado. Entrevistadores visitam cada lar, relacionam os motivos que os levaram a buscar ajuda e exigem que a própria família assuma o compromisso de mudar de vida.  José Natalino de Oliveira, bancário aposentado, faz parte da diretoria da entidade. Ele explica que o voluntariado é o alicerce de todas as ações. A sede administrativa do grupo, a Casa de Jesus, localizada no Jardim das Paineiras, possui 20 funcionários contratados. O pagamento dos salários conta com a ajuda estratégica da Prefeitura: um repasse de R$ 90 mil anuais. Outra fonte de renda é a venda de produtos entregues ao bazar dos Seareiros, no Jardim Campos Elíseos. Não são aceitas doações em dinheiro. E ninguém que trabalha nas ações socais recebe por isso. Brandina Poucos campineiros conhecem, de fato, o tamanho da obra. Os Seareiros mantém, em outros pontos da cidade, outros serviços assistenciais estratégicos. Como o Núcleo Mãe Maria, notabilizado pelo atendimento de jovens que nasceram e cresceram na Vila Brandina, núcleo urbano de habitações modestas, encravado entre bairros elegantes na região do shopping Iguatemi. Por ali, 120 crianças e jovens com idades entre 5 e 15 anos participam de atividades culturais e esportivas no contraturno escolar. Leonor Schaib, coordenadora socioeducacional do núcleo, explica que as atividades pedagógicas também beneficiam adultos, alfabetizados em turmas formadas ao longo do ano. O núcleo, diz, é um verdadeiro centro comunitário, onde se oferece assistência médica gratuita e onde medicamentos essenciais são doados mediante a apresentação de receitas prescritas em postos da rede pública de Saúde. O prédio também é usado para campanhas de vacinação. Para Leonor, existe uma identificação completa do núcleo com a comunidade ao redor. As paredes das salas de aula, no piso superior do prédio, são decorados por delicados quadros desenhados com giz de cera pelas crianças assistidas. Um time de 68 educadores se oferece dar suporte pedagógico à garotada, durante o ano letivo. “A gente conseguiu valorizar as pessoas, fazer com que os moradores tenham orgulho do bairro”, diz a professora, orgulhosa. Professora se dedica ao voluntariado há 20 anos  Heloísa Schimidt é uma senhora de 70 anos. Catarinense de Lages, se mudou para Campinas há 46 anos. Ela trabalhava como professora, mas há duas décadas, depois de se aposentar, se ofereceu como voluntária em uma obra dos Seareiros. E não parou mais. Hoje, é conhecida por todos os espíritas que, mensalmente, distribuem cestas básicas no Núcleo José Esteves, na Vila Industrial. Como ela, são ao todo mil cidadãos, das mais diferentes profissões, que se oferecem para trabalhar de graça pelos semelhantes carentes, cidade afora. São professores, médicos, dentistas, enfermeiros, economistas, engenheiros. Heloísa conta que a inspiração para a ação comunitária, começou bem antes de ser apresentada ao grupo espírita campineiro. Para ela, essa é uma vocação que vem de muito cedo. “Desde criança, a gente sente no coração que precisa agir, que há ao nosso redor pessoas que precisam de amparo. E trabalhar não é mais que a obrigação de todos.”  Ação nasceu em sessão mediúnicas  Há 40 anos, um pequeno grupo de amigos se encontrava para sessões mediúnicas: Sylvia e Orlando Paschoal, Mário e Geni Boari Tasmassia, Ivone e Rildo Benzi, Martha Cruz, Dirce Alcântara, Wany Costa. Em um daqueles encontros, o grupo teve a inspiração de fundar um centro assistencial voltado a pessoas carentes. A Casa de Jesus foi fundada em 1975. Era uma casa alugada, no número 358 da Rua Barão de Jaguara. Ali havia distribuição de remédios, mantimentos, roupas. Mas o espaço ficou pequeno. A sede própria começou a ser construída num terreno doado pela Prefeitura em uma gleba tomada pelo matagal, embrião do que se tornaria mais tarde o elegante Jardim das Paineiras. O salão principal da sede administrativa chegou a ser alugado para eventos e festas. E, com o dinheiro arrecadado, o grupo investiu na ampliação das dependências e na instalação de núcleos assistenciais espalhados pela cidade.

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