No final de novembro do ano passado escrevi nesta coluna um artigo que intitulei “Nenhuma data para homenagear?”. Nele, deixava minha insatisfação por ver que não mais homenageamos datas importantes na denominação de nossas ruas, praças e muito menos nossos feriados. Esses, ainda bem, pois já temos número mais que suficiente.
Por algum motivo, não declarado, todas as homenagens são para pessoas que, até talvez, tenham sido responsáveis por datas memoráveis. Curiosamente, terminei o texto da seguinte maneira: “Sou ruim em história, embora o professor Milton Tapajós Roselino tenha feito muito esforço para que isso não acontecesse. Será que depois do 9 de Julho de 1932 nenhum fato importante aconteceu em nossa história para merecer nome de rua?
Nossa história sem encerra a 9 de julho de 1932? Bem, pode ser que no próximo ano teremos a Rua 16 de Dezembro? Por quê? Oras, é a data que o Corinthians tornou-se campeão do mundo. Fica a sugestão para os vereadores e, claro, a esperança para a nação corintiana”.
Minha previsão ou sugestão não foi lida ou se lida foi interpretada de maneira errônea, pois vimos na última semana estampado nos jornais a seguinte notícia: "Foi sancionada a lei 15.741, de autoria dos vereadores Goulart, Juscelino Gadelha e David Soares, que inclui no Calendário Oficial de Eventos da Cidade de São Paulo, o dia 4 de Julho, como o Dia da Independência Corintiana, em referência à data em que o Corinthians foi campeão inédito e invicto da Copa Libertadores da América, em 2012.De acordo com o comunicado oficial da assessoria de Goulart, "A importância desse dia para o torcedor corintiano é muito grande, pois há anos era alvo de gozações dos rivais, que já tinham conquistado o torneio, enquanto o Corinthians sofria com traumáticas eliminações".
O número de críticas endereçadas pelas redes sociais aos autores do projeto foi muito grande. Evidentemente as paixões clubísticas se misturaram tanto nas críticas quanto nos elogios. Se considerarmos que a massa de torcedores do Corinthians (e portanto de votos) é maior, tenho certeza que os vereadores citados estão dando muito pouca atenção às críticas. Mas será que é essa a função do legislativo municipal? Estamos sendo injustos com os nobres vereadores, pois eles estão cumprindo suas funções?
As câmaras municipais do Brasil têm origem nas tradicionais câmaras municipais portuguesas. A história das câmaras municipais no Brasil começa em 1532, quando São Vicente foi elevada à categoria de vila. Durante esse período a administração municipal era toda concentrada nas câmaras municipais, que naturalmente exerciam um número bem maior de funções do que atualmente. Todos os municípios deveriam ter um presidente, três vereadores, um procurador,um escrivão, um juiz de fora vitalício e dois juízes comuns, eleitos juntamente com os vereadores. Eram as responsáveis pela coleta de impostos, regular o exercício de profissões e ofícios, regular o comércio, cuidar da preservação do patrimônio publico, criar e gerenciar prisões, etc.
Era função da câmara municipal discutir todas as leis e as ordens dos Prefeitos.As câmaras municipais foram o primeiro núcleo de exercício político nacional. Os nobres edis foram elementos importantes para a manutenção do poder de Portugal na Colônia, organizando a resistência às diversas invasões feitas por ingleses, franceses e holandeses. Também, com o surgimento do sentimento de independência, já no século XVII, as câmaras municipais foram o núcleo inicial de diversas revoltas. Podemos ver que as funções sempre foram vitais e muito nobres para os municípios e para o País.
Como ficou a função do vereador na República contemporânea? Esse tema é pouco conhecido pela maioria dos munícipes e ainda gera discussões. Mas vamos lá, cabe ao vereador em primeiro lugar legislar, ou seja, elaborar, discutir e votar as leis sobre os assuntos de competência do Município. Outra função de um vereador é fiscalizar a administração, cuidar da aplicação de recursos e a observância do orçamento municipal.
Além disso, o vereador é assessor do Executivo, julga as contas públicas e apura infrações político-administrativas tanto do prefeito como de seus pares. Com essas poucas linhas de obrigação podemos dizer que os nobres vereadores de nosso País têm a palavra final sobre o destino de R$ 160 bilhões de reais/ano e eles próprios custam R$ 5 bilhões/ano.
Depois de ler e tentar entender a legislação, concluo que certamente não há nada de errado em um vereador redigir, discutir e aprovar com seus pares de Câmara Municipal o projeto instituindo o Dia da Independência Corintiana. Mas, será que as outras funções são cumpridas? Pelo que acompanho pelos veículos de comunicação, não creio.