De volta à cidade, Contrações, com Débora Falabella, mostra o lado sombrio das relações de poder no ambiente de trabalho
Debora Fallabella e Yara de Novaes em Contrações, de Mike Bartlett: relação abusiva no ambiente de trabalho é mostrada com humor ácido (Divulgação)
Sucesso de crítica e de público, e há cerca de cinco anos em cartaz, o espetáculo Contrações, do dramaturgo inglês Mike Bartlett e vencedor de vários prêmios na versão do Grupo 3 de Teatro, retorna a Campinas para curta temporada no Teatro Municipal José de Castro Mendes neste fim de semana. Com direção da dramaturga, atriz e diretora mineira Grace Passô – que dirigiu também a peça Os Bem Intencionados, do Grupo Lume - o espetáculo conquistou os prêmios APCA, APTR, Questão de Crítica e Aplauso Brasil, e, só na capital paulista, já foi encenado no Centro Cultural Banco do Brasil (2013), Itaú Cultural, Teatro Porto Seguro (2015), Teatro Shopping Frei Caneca (2016) e no Auditório do Ibirapuera (2017 – Mostra Petrobras Premmia de Teatro). Em Campinas, se apresentou em meados de 2016 no Teatro do Sesi Amoreiras. Com Débora Fallabella e Yara de Novaes no elenco – dupla que acaba de encerrar uma temporada de Love, Love, Love, também de Batlett, no Teatro Vivo -, a obra explora situações de assédio moral entre chefe e funcionária, mostrando com um humor cruel a faceta mais absurda de uma situação comum de trabalho. No escritório de uma grande corporação, a gerente solicita que a funcionária Emma leia em voz alta uma cláusula do contrato que proíbe aos colaboradores qualquer relação sentimental ou sexual com outro colega da empresa. Nos encontros seguintes, a gerente libera suas diferentes facetas para manipular Emma. Para manter seu emprego, Emma acaba por se render em detrimento de sua vida privada. “Quando lemos o texto, a primeira sensação é de ser absurdo, mas em seguida percebemos que todos já passamos por isso. Nos ensaios abertos que fizemos em cidades do interior do Estado, ouvimos relatos de situações similares e não só no ambiente de trabalho, mas entre professor e aluno, marido e mulher”, comenta Débora. “O espetáculo trata de uma relação abusiva, independente de onde ela acontece. O assunto fica na cabeça das pessoas e percebemos que a situação não é tão absurda assim.” Ensaios abertos No processo de criação, o grupo viajou por oito cidades do interior paulista, expondo os ensaios para grandes plateias. A peça foi construída e modificada com a presença do público, em um processo criativo no qual, ao fim de cada apresentação, a plateia podia colocar suas impressões e opiniões sobre o texto e a montagem. “Foi uma das experiências mais ricas que tivemos em nossa trajetória. Pude verificar o que já tinha percebido na primeira leitura, que o texto do Bartlett é preciso, objetivo e comunica de imediato com o espectador. Além disso, essa experiência influenciou diretamente a construção do espetáculo. O público direcionou o caminho que deveríamos seguir”, comenta Gabriel Paiva, um dos fundadores do Grupo 3 de Teatro, junto com Débora e Yara, três mineiros radicados em São Paulo, e que respondem pela direção artística do grupo. Dentro do contexto do mundo corporativo, o texto propõe uma reflexão sobre o sistema capitalista de produção, a desumanização do trabalhador – tanto o abusado como o que abusa. A relação de poder e subordinação ganha status de normalidade no espetáculo em função da encenação pelo viés do humor ácido. “A personagem diz que precisa de dinheiro para viver. Acaba enfrentando tudo por isso. Ela ultrapassa seus limites para chegar onde quer, para sobreviver”, aponta Débora. Parceiros do coletivo Grupo 3 de Teatro, Silvia Gomez assina a tradução do texto, Morris Picciotto é o autor da trilha original e André Cortez criou cenário e figurino da montagem.