A diretora Lenita Mendes Nogueira revela que os papéis são os mais antigos registrados
Livro tem dedicatória de Carlos Gomes aos avós de Marcília de Souza ( Dominique Torquato/AAN)
O rico acervo do Museu Carlos Gomes, de Campinas, ficou ainda mais precioso no último sábado (3) com a doação feita pela professora Marcília Maciel de Souza, de 72 anos, de uma edição rara com partituras completas do poema coral-sinfônico Colombo e da ópera O Guarani, compostas pelo maestro campineiro. Rara, porque há uma dedicatória do próprio Carlos Gomes, datada de 18 de agosto de 1892, mesmo ano em que estreou o poema, para os avós de Marcília, o capitão engenheiro-militar Alfredo Pretextato Maciel da Silva e a pianista e compositora Lupercina Marcília Maciel da Silva. Um documento que entra para a história do compositor, de Campinas e do próprio País, mas que, por muito pouco, não foi esquecido ou levado para bem longe da terra do maestro.Moradora do Rio de Janeiro, Marcília conta que foi procurada diversas vezes por uma casa de leilões para se desfazer do livro, com proposta de cobrir “seja lá quanto ofereceram”. “Mas eu nunca quis leiloar, a minha intenção sempre foi doar para alguma instituição, um museu, justamente para fazer história, fazer algo a mais desse documento que sempre foi muito importante para mim”, afirma a professora, que ganhou as partituras da tia mais velha, a pianista Edith Maciel, há 36 anos. “Eu não conheci meu avô e a minha parente mais próxima foi ela. Exatamente por isso, o livro sempre teve um significado afetivo muito forte e me surpreendi, principalmente depois do contato da leiloeira, em saber que o documento tinha tanto valor também, digamos, fora de mim.”Ter documentos que fazem parte da história do Brasil levados, principalmente, para outros países, afirma o historiador Duílio Battistoni Filho, é comum. Ele cita como exemplo o legado do bibliófilo pernambucano Manoel de Oliveira Lima, que está guardado no subsolo da biblioteca central da Universidade Católica da América, em Washington, chamado de The Oliveira Lima Library. “Ninguém se interessou pelo acervo dele no Brasil, tanto que ele acabou doando para Washington. Faz parte da cultura dos americanos preservar documentos, por isso muita coisa vai parar lá, assim como na Europa. Carlos Gomes é muito reverenciado na América Latina, já foi muito cultuado na Europa também, então seria bem capaz que essas partituras fossem para algum lugar bem longe de Campinas.”Os papéis de Colombo entregues ao Museu, revela Lenita Mendes Nogueira, diretora da instituição campineira, são os mais antigos registrados e, por isso, ela compara a doação com outra feita há alguns anos, de manuscritos da obra A Noite do Castelo, a primeira ópera de Carlos Gomes. “Para nós, receber essa doação da professora é uma prova de reconhecimento do trabalho que estamos fazendo no museu, porque ela poderia ter doado para muitos lugares, como a escola de música da Universidade Federal do Rio de Janeiro ou o Museu Imperial de Petrópolis, que também guardam materiais do maestro. Mas escolheu entregar aqui, porque somos o único museu dedicado exclusivamente a Carlos Gomes. É mais uma relíquia que fica a disposição de Campinas”, esclarece.“O livro tinha de ir para a cidade dele, ficar na casa dele. Por isso minha escolha foi uma só”, lembra Marcília, que procurou o museu há cerca de dois meses. “Apesar de a minha filha estudar canto lírico, é apenas um hobby, e já estou com 72 anos. Eu não queria deixar aquela preciosidade solta, porque não sabemos o que pode acontecer e tudo poderia simplesmente sumir”, diz.“É um documento que não tem preço, porque não tem nenhum igual”, declara Marino Ziggiatti, presidente do Museu. “São partituras destinadas a canto e piano e que poderão ser acessadas pelo público especializado. Por isso, estamos trabalhando na digitalização dos 23 mil documentos sobre Carlos Gomes, para ficar ainda mais fácil resgatar partes importantes da história do maestro e de Campinas”, conclui. VazioResta agora saber como a família de Marcília conheceu Carlos Gomes, já que não há registro sobre isso. “Pode ser que eu não encontre nada, mas afirmo que vou me dedicar muito para conhecer um pouco mais dessa história”, conta a professora do Rio de Janeiro. Tanto que sua filha, Kátia Souza Almeida, já enviou diversas fotos dos avós ao museu campineiro para checar se eles constam em algum registro.