TELENOVELA

O centenário da usineira de sonhos

Janete Clair, responsável por modernizar as telenovelas ao levar o cotidiano do País para as telas, completaria 100 anos em 2025 e é homenageada como a grande dama da teledramaturgia

Cibele Vieira/cadernoc@rac.com.br
08/06/2025 às 11:55.
Atualizado em 08/06/2025 às 12:38

Tony Ramos e Gloria Menezes em "Pai Herói", sucesso da Globo em 1979: novela terá remake feito pela HBO Max (Divulgação/TV Globo)

O Brasil já foi conhecido mundialmente como “o país das novelas”, pelas produções nacionais que, exportadas, fizeram sucesso também em outros países. E quando se fala em novela brasileira, um nome foi eternizado nesse segmento: Janete Clair (1925- 1983). A grande dama da teledramaturgia brasileira completaria, em 2025, 100 anos de nascimento e, assim, vem recebendo várias homenagens. Entre elas, duas vieram de seu filho Alfredo Dias Gomes, que regravou a obra do francês Claude Debussy "Clair de Lune" (1905) – responsável por seu nome artístico – e produziu um curta-metragem de animação chamado "A Escritora", ambos disponíveis em plataformas digitais.

O baterista e compositor Alfredo Dias Gomes revela que a mãe “era apaixonada por música clássica e ficava horas na discoteca da Rádio Difusora, onde iniciou sua carreira, e gostava de cantarolar ‘Clair de Lune’. Por causa disso, o diretor Otávio Gabus Mendes sugeriu que ela adotasse o nome artístico de Janete Clair". O Single "Clair de Lune in Jazz" foi produzido pelo filho da novelista como uma releitura da composição original e ganhou tintas jazzísticas. Participaram da regravação seu irmão Guilherme Dias Gomes (flugelhorn), o pianista David Feldman e o baixista Jefferson Lescowich. 

Em carreira solo desde os anos 90, o inquieto Alfredo Dias Gomes vem, nos últimos anos, se revelando também como roteirista e produtor audiovisual, produzindo pequenos curtas de animação que conquistaram prêmios no exterior. Foi usando essas habilidades que ele produziu o curtametragem "A Escritora", de 13 minutos. O filme foi feito com imagens geradas por Inteligência Artificial e narra, em um ambiente familiar cotidiano, um episódio da história de Janete Clair, quando ela escreveu um roteiro de novela em apenas duas semanas, para substituir uma novela assinada por seu marido Dias Gomes – pai de Alfredo – proibida pela censura no dia da estreia. O curta-metragem está no canal do YouTube do baterista (@alfredodiasgomes).

Outra homenagem à escritora é a exposição “Janete Clair 100 anos – a usineira dos sonhos”, inaugurada no aniversário da novelista (25 de abril) e aberta à visitação gratuita até 28 de dezembro, no mezanino do MIS RJ (Lapa). 

PAIXÃO PELA TELENOVELA

Telenovela é um tipo de produto que praticamente todo brasileiro consome ou já consumiu, seja na TV, seja pela Internet. “A novela reflete o nosso cotidiano, imita a vida, oferece histórias que prendem a atenção e personagens que despertam nossas emoções. Amamos odiar vilãs, torcemos pela vingança das vítimas, projetamos nas ações fictícias a justiça que gostaríamos de ver na realidade. Com as obras de Janete Clair, não era diferente”, afirma João Paulo Hergesel, docente da Escola de Linguagem e Comunicação da PUC-Campinas e pesquisador de narrativas literárias e audiovisuais. “Tanto nas décadas de 1950 e 1960, no rádio, quanto nas décadas 1960 a 1980, na televisão, suas novelas entretinham e divertiam, ao mesmo tempo em que propunham reflexões sobre temas que emergiam na sociedade.”

A busca pela liberdade, que guiou “Irmãos Coragem” (1971), o empoderamento feminino, presente em “Selva de Pedra” (1972), e a desigualdade social, retratada em “Pecado Capital” (1975), são apenas alguns exemplos citados pelo docente. Mesmo após sua morte, em 1983, suas tramas continuam sendo relevantes para a cultura audiovisual, comenta. Em 2009, o SBT produziu uma releitura de “Vende-se um véu de noiva”, radionovela de 1959 que teve uma versão televisiva em 1969. E o remake de ‘Pai Herói’, originalmente de 1979, foi anunciado pela plataforma de streaming HBO Max ainda para este ano. “Isso mostra como a obra de Janete ainda ressoa nas novas gerações”, diz o docente.

MODERNIZAÇÃO DAS NOVELAS 

Eternizada como autora de grandes clássicos da teledramaturgia brasileira, ela modernizou e levou o cotidiano do País para as telenovelas, se tornando referência em linguagem e estrutura para outros autores. É atribuída a ela a frase: “cada capítulo tem que ser um espetáculo”. Amada pelo público, muitas vezes foi acusada de alienar a audiência com suas novelas, enquanto o Brasil enfrentava a violência da ditadura militar. Entretanto, estudiosos dizem que a autora foi fundamental para incorporar a realidade brasileira à teledramaturgia.

A maior autora de telenovelas do Brasil começou no rádio, em 1943, como atriz, e escreveu 31 radionovelas. Sua estreia na televisão foi na TV Tupi com “O Acusador” (1964). Assinou 22 telenovelas, sendo 19 na Rede Globo, onde entrou em 1960, entre elas “Irmãos Coragem” (1970), “Selva de Pedra” (1972), “Pecado Capital” (1975), “O Astro” (1977) e “Pai Herói” (1979). Além das novelas, ela escreveu o romance “Nenê Bonet”, publicado originalmente no formato folhetim pela Revista Manchete em 1980.

VIDA COM PROPÓSITO

Mineira da cidade de Conquista, filha de uma costureira portuguesa e de um comerciante libanês, Janete Clair era o nome artístico de Jenete Stocco Emmer. Antes de ser escritora, foi datilógrafa, locutora e atriz de radionovela, iniciando no rádio sua carreira como autora. Casada com o dramaturgo Dias Gomes, recebeu os apelidos de “Maga das 8” – referência ao horário nobre das novelas – e “Usineira dos Sonhos” – epíteto concedido pelo poeta Carlos Drummond de Andrade.

Janete foi diagnosticada com câncer no intestino em 1980. Mesmo assim, escreveu mais duas novelas: “Coração Alado” (1980) e “Sétimo Sentido” (1982). Em 1983, estreou “Eu Prometo”, feita em parceria com Glória Perez. Morreu no dia 16 de novembro de 1983, aos 58 anos.

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