ESTREIA

'Mapas para as Estrelas', de Cronenberg, chega a Campinas

Julianne Moore nunca se entregou de modo tão despudorado e tão visceral a um papel como neste filme: é o grande personagem dela em uma carreira recheada de bons papéis

João Nunes/Especial para o Correio
09/04/2015 às 05:00.
Atualizado em 23/04/2022 às 17:07
Julianne Moore em cena de 'Mapas para as Estrelas': Havana Segrand é o grande personagem dela em uma carreira recheada de bons papéis ( Divulgação)

Julianne Moore em cena de 'Mapas para as Estrelas': Havana Segrand é o grande personagem dela em uma carreira recheada de bons papéis ( Divulgação)

Julianne Moore levou o Oscar de atriz pelo simpático 'Para Sempre Alice' (em cartaz em Campinas); porém, ela o merecia por 'Mapas para as Estrelas' ('Maps to the Stars', Canadá, EUA, França e Alemanha, 2013), de David Cronenberg — que passou muito longe do tapete vermelho; a Academia o demonizou por antecipação e nem quis ouvir falar sobre.   Dona de beleza singular, Julianne fez um pouco de tudo, mas nunca se entregou de modo tão despudorado e tão visceral a um papel como neste filme. Seguramente, é o grande personagem dela em uma carreira recheada de bons papéis.   Remake em família   Ela não vacilou em se entregar sem medo a uma personagem (Havana Segrand), atriz de Hollywood decadente, intolerante, ciumenta, dona de si e pronta para assumir vilezas, enquanto, profundamente insegura, luta por encarnar na tela o remake de um sucesso interpretado muitos anos atrás pela mãe.   Arrogante, mesmo caindo pelas tabelas, ela vive mendigando o papel para o diretor, e droga-se, torna-se inconveniente (como na cena do banheiro) e chega ao topo da decadência disputando a atenção do motorista de limusine Jerome Fontana (Robert Pattinson) com a própria ajudante Agatha Weiss (Mia Wasikowska).   Ver Julianne Moore saindo de um lugar confortável para experimentar algo novo é um prazer em si, mas trata-se de David Cronenberg: se na estética sabemos o que esperar dele, prepare-se, pois o diretor não alivia um segundo sequer ao abordar o universo dos bastidores de Hollywood.   Pesado Ou melhor, alivia se o olhar do espectador pender para a sátira — boa leitura para 'Mapas para as Estrelas'. Do contrário, ele é pesado até para quem está acostumado com o cinema deste canadense pouco afeito ao lugar comum. Há incesto, suicídio, cena forte envolvendo animal, violência em diversas medidas e um pouco mais.   Agatha Weiss chega a Los Angeles e faz um tour pelas mansões dos astros de Hollywood. Para isso, contrata uma limusine dirigida por Jerome Fontana, ator desempregado. Ainda não sabemos que a jovem está de volta a um passado trágico, que envolve a família, em especial o irmão Benjie Weiss (Evan Bird), ator de série de TV, pirralho temperamental tipo o conterrâneo do diretor Justin Bieber (provável inspiração do personagem).   Tragédia Ágata tem os braços e rosto marcados por uma tragédia; ela volta para revelar o que se passou e acaba sendo ajudante de Havana Segrand. Com estes elementos, Cronenberg arma seu cenário de perversidades.   E que bom que assim seja. Em um tempo no qual fingimos viver um mundo maravilhoso e que certo tipo de comportamento busca apenas o conforto individual que esconde nossas mazelas, Cronenberg dirige na contramão e revela o quanto somos desagradáveis e o quanto estamos um lugar inóspito para se viver.   Desafio   Por que assistir a um filme com estas características? Eis um desafio: sair da mesmice (como Julianne Moore que decidiu que era hora de radicalizar) e ver algo que nos leve a entender um pouco do inusitado do ser humano. Quer dizer, nós sabemos, mas temos receio de trazê-lo à tona.   A violência e o destemor em dar nomes aos demônios de 'Mapas para as Estrelas' ficam conosco por um bom tempo; sinal evidente de que mexeu com as nossas cabeças. Mais que isso, nos permitiu pensar sobre um filme — algo raro nos dias de hoje. Convenham: não é pouco nestes dias que correm, nos quais Velozes e Furiosos 7 ganhou status de uma quase obra-prima.

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