CINEMA

História sensível sem apelar para lições de vida

Assim é 'O Que Traz Boas Novas', longa do canadense Philippe Falardeau em cartaz em Campinas

João Nunes
15/06/2013 às 11:10.
Atualizado em 25/04/2022 às 12:02

O novo professor de uma classe de alunos do ensino fundamental no Canadá chama-se Bachir Lazhar (Mohamed Fellag), nome argelino cujo significado em árabe se traduz como O Que Traz Boas Novas, título em português do filme de Philippe Falardeau (Monsieur Lazhar, Canadá, 2012), em cartaz em Campinas.

E as crianças da escola estão mesmo precisando de boas notícias. Aconteceu uma tragédia com uma das professoras e presenciada pelo garoto Simon (Émilien Néron) e pela melhor amiga dele, Alice (Sophie Nélisse). E a diretora da escola não encontra ninguém para substituí-la.

Bachir aproveita para se apresentar como professor, mesmo sem sê-lo. Imigrante argelino, ele busca um modo de conseguir moradia permanente no Canadá, pois a situação do país dele não anda nada bem.

Quando, por falta de opção, ele se torna professor, a boa notícia também lhe bate à porta. Agora, as crianças terão de administrar nova experiência com desconhecido e estrangeiro e Bachir aguardará ansioso o desfecho do pedido de asilo no Canadá.

Obviamente, sem as manhas do ofício, ele irá se embaralhar todo nas aulas. Desfaz o semicírculo das carteiras e as coloca perfiladas como antigamente, dá uns tabefes em um dos garotos e faz ditado inacessível usando Honoré Balzac. Nada do que a professora anterior faria. E, portanto, gera mal-estar entre os alunos e com a direção da escola.

De seu lado, está às voltas com a imigração, relembra a dureza das últimas atividades dele e da família na Argélia, sente-se sozinho, encara as dificuldades na escola e espera que sua vida volte ao normal - dentro do possível.

Philippe Falardeau trata estes dois temas paralelos com delicadeza extrema, pois estamos em um terreno delicado. Como lidar com a perda na infância e tocar a vida em frente? E como falar uma vez mais sobre questões políticas sem parecer maniqueísta e sem transformar Bachir em sujeito vitimizado?

No caso das crianças parece simples. Com ajuda de uma psicóloga eles voltam ao normal das brincadeiras e da rotina. Mas isso não é real. Pelo menos não para Alice e Simon, que irão protagonizar o momento mais tenso e catártico do filme. A Bachir, perdido entre o passado recente e dramático, resta a lenta espera.

Se não tivesse a segurança necessária para segurar as rédeas, O Que Traz Boas Novas, apesar do lindo título, poderia escorregar facilmente para o dramalhão. Especialmente porque fala de um assunto praticamente proibido na vida cotidiana — mais ainda em uma escola.

Porém, a direção sabe conter os momentos em que tudo poderia desandar e apresenta uma história sensível, que não cai no excesso e tampouco reserva aquelas lições de vida tão caras a um tipo de cinema (literatura e teatro também) direcionado para edificar o espectador.

Nada disso: o drama de cada um nós continua a despeito das nossas tentativas de fingir que ele inexiste. O filme não esconde a tragédia, mas não abusa dela, assim como não passa a mão na cabeça do espectador. Parafraseando Ao Mestre com Carinho (James Clavell, 1966), alguém sugeriu adequadamente um subtítulo para o filme: Aos alunos com carinho.

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