Grupo musical, formado no Instituto Anelo, acaba de estrear EP com composições autorais
As cantoras Simone Janita e Renata Alves são as duas mulheres do grupo Pretas&Pretos, em ensaio junto dos outros 13 integrantes: expectativas de levar suas melodias e debates antirracistas ao palco em eventos além do mês da Consciência Negra (Isabelle Andrade)
Por meio da música, eles encaram uma luta, infelizmente, constante e ainda necessária. São 15 artistas, entre cantores e instrumentistas negros, unidos na periferia de Campinas para formar o Pretas&Pretos, grupo que leva para o palco melodias e debates antirracistas. O conjunto acaba de lançar nas principais plataformas digitais de áudio o EP "Resistência", que inclui quatro composições autorais e sua versão da canção "Tributo a Martin Luther King", e ainda prepara dois shows gratuitos na cidade: o primeiro encerra a Marcha Zumbi dos Palmares nesta segunda-feira, 20, às 12h, no Largo do Rosário; e o segundo acontece na quarta-feira, 22, às 19h30, no Shopping Parque das Bandeiras.
O cantor e compositor Luccas Soares, integrante e um dos idealizadores do grupo, reforça que o Pretas&Pretos existe não por "felicidade, mas por uma necessidade". "Não ficamos felizes em ter de combater algo que não deveria existir (o racismo)", explica. O conjunto nasceu em novembro de 2020 dentro do Instituto Anelo, cujo fundador é Luccas. Inicialmente, o objetivo era reunir os protagonistas da luta negra, homens e mulheres músicos pretos da organização, para gravar um clipe de "Tributo a Martin Luther King", canção de Wilson Simonal. Uma homenagem para o Dia da Consciência Negra. Mas, uma vez unidos, eles não quiseram se separar. "O pacto foi que a gente ia manter o grupo enquanto houvesse racismo no Brasil. A gente espera que o grupo acabe logo. Mas enquanto o país não admitir que tem um problema, nunca vai resolver", aponta.
Ao longo de três anos, o conjunto desenvolveu quatro músicas autorais: "Carapuça", "Deixa a Senzala", "SambAcolá" (as três composições de Luccas) e "Resistência" (composta por Maykel) - esta última nomeia o EP. Todas elas discutem a temática de combate ao racismo. "Eu gosto de falar de amor, de vida. É muito cansativo falar sobre racismo. Mas cansa mais passar por isso todo dia", detalha Luccas. Nos shows, os integrantes do Pretas&Pretos vão apresentar as canções do EP e também interpretar clássicos de outros artistas negros brasileiros.
PARTICIPAÇÕES ESPECIAIS
Duas das composições autorais do EP tiveram participações especiais. Em "SambAcolá" há um trecho vocal cantado pelo produtor e instrumentista Walmir Borges, enquanto "Carapuça" conta com a voz do músico Wilson Simoninha. "Nós não gravamos juntos, mas fomos até o estúdio dele acompanhar a sua gravação", lembra Simone Janita de Souza Rodrigues, que faz um dos solos ao lado do cantor filho de Simonal. "Foi muito emocionante ouvir depois o nosso solo. Eu já ouvia as músicas dele e admirava. Ele nos recebeu super bem e foi tudo muito bom", indica a cantora.
Para Simone, que é uma das duas integrantes femininas do Pretas&Pretos, representar mulheres pretas no grupo é bastante importante, pois o ambiente musical ainda é muito voltado para homens. Ela recorda já ter sofrido preconceito por ser mulher quando tocava bateria. "É difícil vermos mulheres em bandas maiores, especialmente como musicistas. É bem significativo estarmos aqui, podendo inspirar outras pessoas e fazendo parte dessa discussão", relata.
EMBATE NOS PALCOS
Para os integrantes, cantar e tocar sobre a temática que os move como grupo é natural. Maykel, filho de uma mulher vítima de violência doméstica, sofreu racismo dentro da igreja que frequentava e leva para os versos de "Resistência" a necessidade de combater a brutalidade. "Não vão nos calar, não vamos parar", "Junte-se a nós em uma só voz, vamos reagir" e "Queremos respirar" são alguns dos trechos da canção. Já Renata Pereira Alves, vocalista de Pretas&Pretos, lembra do racismo no ambiente de trabalho por causa do seu cabelo e se emociona com o verso "Preta, teve abuso, depois de tudo, jogada no mar", de "Deixa a Senzala".
"A gente quer mostrar que a cultura e o diálogo podem mudar a sociedade, a música pode ser uma ferramenta de sensibilização e de transformação, junto com políticas públicas e acessibilidade", afirma Luccas, que explica que as composições nascem de suas percepções de vida. O idealizador e compositor, no entanto, expõe que o grupo é pouco convidado para performances em shows, lembrado somente em épocas próximas ao Dia da Consciência Negra. "A gente fala de uma questão social bem delicada trazida através do nosso racismo estrutural. Recebemos convites para tocar outras músicas, não essas", aponta o fundador do Anelo.
Luccas revela ainda que o grupo procura parcerias e patrocínios que viabilizem o projeto em 2024: "O potencial do Pretas&Pretos é também para grandes festivais, Rock in Rio, Lollapalooza. A ideia é ter material para tocar dentro de casa e nas casas de todos. Minha dica é que as empresas levem essas pautas para discussão em seus espaços, nos convidem". Para o futuro, o grupo pretende homenagear grandes artistas negros brasileiros, que já morreram ou que ainda estão vivos.
PROGRAME-SE
Shows de lançamento de "Resistência"
Quando: segunda-feira, 20/11, às 12h
Onde: Largo do Rosário
Quando: quarta-feira, 22/11, às 19h30
Onde: Shopping Parque das Bandeiras - Av. John Boyd Dunlop, 3900 Jardim Ipaussurama
Entrada gratuita
Informações: Instagram @pretasepretos.br
BOX:
Números do grupo Pretas&Pretos
✔ 3 anos de grupo
✔ 15 integrantes
✔ 5 músicas gravadas
✔ 4 composições autorais