ENTREVISTA

Gracindo Júnior fala sobre veia artística de sua família

Ator se apresenta ao lado dos filhos Gabriel e Pedro no espetáculo 'Canastrões'

Delma Medeiros
delma@rac.com.br
28/03/2013 às 17:38.
Atualizado em 25/04/2022 às 22:37

O ator Paulo Gracindo Júnior, que está no elenco do espetáculo 'Os Canastrões' (Leandro Ferreira/AAN)

Herdeiro de um dos nomes mais conhecidos da televisão e teatro brasileiros, Gracindo Junior enveredou pela dramaturgia muito jovem, com 15 anos. Integrou o elenco de radioteatro da Rádio Nacional nos anos 60; e atuou ao lado de Marília Pêra na primeira novela da Globo, 'Rosinha do Sobrado'. Em cartaz no Teatro Amil com a peça 'Canastrões', espetáculo que celebra o teatro, ele fala sobre a peça, que integra a série de homenagens pelo centenário de Paulo Gracindo, o ofício do ator e a importância do teatro na formação artística. “Para o ator, o teatro é uma opção de reaprender, de fazer textos diferenciados”.

Caderno C — Fale um pouco desse espetáculo, em que você atua ao lados dos dois filhos (Gabriel e Pedro). É uma experiência inédita essa?

Gracindo Junior — Sem dúvida. É inédito, primeiro ter dois filhos atores, que é uma loucura, tendo pai ator, neto ator. Então é engraçado, porque eu sou de uma geração em que ser ator era muito perigoso, a gente pertencia a uma classe não muito privilegiada, vamos dizer assim, pelo contrário. Hoje não, a classe dos artistas em geral é privilegiada, tem outros meios de você mostrar sua arte, de viver melhor da sua arte. Mas cada vez mais se rarefaz esse ator que a gente conta nesse espetáculo. Esse ator que começou do nada, pelo ofício mesmo, quando o glamour não era tão grande, não tinha muito dinheiro. Era um trabalho igual ao de um carpinteiro. É muito bonito contar essa história.

É um texto meio biográfico, sobre a saga da sua família?

Não é biográfica porque a gente não conta uma história específica do que aconteceu com meu pai ou comigo. A peça fala de como essa pessoa chegou a ser ator. Claro que vou saber isso do velho ator, de atores mais velhos até que meu pai, como Procópio Ferreira, depois meu pai, outros atores que conviveram comigo e hoje estão mortos, atores maravilhosos como Paulo Autran, Dulcina de Moraes, Cacilda Becker, pessoas com quem eu estive, com quem participei dessa vida de ator e que para mim são a minha família. O ator que começa em teatro tem um pouco essa questão de família, uma coisa herdada de pai para filho. Hoje não, hoje tem escolas maravilhosas, que ensinam a ser ator de teatro, de cinema, tem formações específicas. E teatro é a essência de tudo, a brincadeira com a poesia, com o cômico, com a tragédia, com os sentimentos mais profundos do ser humano.

E como surgiu a proposta de fazer essa celebração do teatro?

Meu pai sem dúvida foi um dos maiores atores brasileiros. Eu estava celebrando o centenário dele, já tinha provocado um livro ('100 Anos de Paulo Gracindo'), um filme (o documentário 'Paulo Gracindo - o Bem Amado'), os Correios (Empresa de Correios e Telégrafos) imprimiram um selo fantástico. E faltava algo em teatro. Como contaria a história do meu pai, como falaria dessa profissão que eu herdei, que ele deixou para mim? Tem uma cena na peça que um dos meus filhos pergunta: “mas ele morreu e não deixou nada, um dinheirinho, nada pra gente?”. Deixou esse baú, “essa porcaria?”. Até que no final do espetáculo ele percebe que é nesse baú que está a grande herança, que tem tudo que ele viveu, que legou como ensinamento, tudo que fez como ator. É um aprendizado do ver. É um ofício que passa de pai pra filho mesmo.

E o espetáculo, como foi o processo?

Meus filhos são um pouco a forma de eu contar uma coisa que aconteceu lá atrás e que só vale se tiver continuidade. É a coisa da saga, um que vem atrás do outro, que vai atrás do outro. Nosso espetáculo é isso. Meu pai ensinou a mim, que estou ensinando a meu filho, que ensina ao filho dele. Tenho uma coisa muito marcada na minha vida com a aveia Quaker (não é publicidade). Não sei se você se lembra que a lata tem um quaker segurando uma lata de aveia, o ícone deles. Naquela latinha que ele segura, tem um quaker segurando outra lata. É a história do espelho, da essência e da continuidade dessa essência.

Como o autor e diretor Moncho Rodriguez entrou nesse caldeirão?

O texto foi ficando filosófico e consequentemente difícil de concretizar de forma que as pessoas entendessem. A gente queria encontrar uma linguagem. Nós fizemos muita pesquisa, tínhamos um material muito grande sobre meu pai e outros atores, mas ainda não sabíamos como falar disso. Através de livros, a gente descobriu o autor Moncho Rodriguez, um espanhol que faz um trabalho lindo no Norte de Portugal. Ele mantém um centro de criatividade fantástico numa pequena aldeia, em que trabalha tudo que se refere a teatro, não só a formação de atores, mas sobre tudo que se trabalha em palco. Ouvimos falar dele e resolvemos passar um tempo lá, em residência. Fizemos um trabalho sério como se tivesse começando em teatro, trabalhando das 8h às 22h, todos os dias, por quatro meses. Foi um trabalho muito cansativo, mas produtivo também. Uma residência em teatro, teatro, teatro, só se falava nisso. E daí criamos um espetáculo, nascido dessa relação com o Moncho, que já tinha sugado tudo que nós passamos para ele, da nossa relação, do que a gente pretendia com o teatro, somado ao que ele próprio pensa do teatro. Moncho é um pesquisador seríssimo, das pessoas que mais conhece essa cultura ibérica que foi passada para o Brasil, nessa área específica de representação em praça, festas, sobre como o teatro realmente começa. Lá, nós fizemos várias apresentações em praça pra experimentar, pedindo o dinheiro no chapéu. Vivenciamos isso e foi um exercício muito bom que tem a ver com esse espetáculo.

Você chegou a pensar em fazer outra coisa, ou sempre foi o teatro?

Eu comecei muito jovem, com 15 anos já estava nessa área. A única coisa que aconteceu na minha vida foi que depois de um tempo, já com uns 30 anos, resolvi fazer uma faculdade. Fiz psicologia para dar um canudo para o velho (Gracindo), mas já era ator há anos. Só me formei, mais nada.

Com que espetáculo você iniciou a carreira?

Na realidade meu primeiro espetáculo foi uma peça de um espanhol chamado Alejandro Casona: 'As Árvores Morrem de Pé'. Mas começo mesmo em rádio, fazendo radioteatro, uma coisa que na minha época era muito forte. Tinha grandes atores fazendo radioteatro. Como falei antes, não tinha escola. A herança dos outros atores era o velho teatro português ou a radionovela.

Você faz teatro, cinema, televisão, produz, dirige, atua. Tem alguma área que goste mais?

Gosto muito de representar, mas acho que tudo depende do seu momento, do que se quer dizer. Como é o meu ofício e eu conheço um pouco, quando não tinha papel numa peça, fazia o som, a luz, era o contra-regra.

O importante era estar junto?

Isso mesmo, ficava no teatro, abria a cortina. O importante era estar celebrando e, por menor que fosse o dinheiro, o prazer era muito grande, porque eu fazia o que queria fazer. Hoje é muito diferente. Voltando 50 anos você descobre que, realmente, ou tinha vocação, ou ia embora. Não tinha esse charme, esse glamour que tem hoje, as revistas que vendem a profissão como uma coisa maravilhosa, não existia. Isso é um outro conhecimento.

Você atuou ao lado do seu pai, como hoje está ao lado dos filhos?

Atuei em teatro, fizemos uma peça junto como atores, chamava 'O Jogo do Crime'; fizemos muita coisa em televisão; a mais lembrada talvez seja a novela 'Casarão' porque fazíamos o mesmo personagem em épocas diferentes. Também dirigi ele em teatro em três espetáculos. Tivemos uma relação forte. Em final de vida, então foi muito. Acho que estávamos juntos nas três ultimas coisas que ele fez. O que disse agora sobre os meus filhos, é o que digo sobre meu pai. Começo a conhecer meu pai, graças a Deus, cedo, com 15 anos, quando passo a trabalhar com ele. É ai que a gente tem uma liga. Por isso digo para meus filhos: “quero vocês trabalhando comigo. É a melhor forma de eu conhecer vocês e vocês me conhecerem”.

O nome Gracindo chegou a pesar em algum momento?

Ah, pesa, não deixa de pesar, porque desde que eu nasci meu pai era sucesso, ele não deixou se ser nunca. Era sucesso em rádio, depois em programa de auditório, por causa do Albertinho Limonta, depois o primo rico, o Tucão. Ele não parou, foi de veículo a veículo sempre sendo sucesso. Paulo Gracindo é um nome que todas as gerações conhecem, menos essa última. Meu pai morreu em 1995. Um garoto de 25 anos não sabe quem foi Paulo Gracindo, mas o pai dele sabe. E volta e meia passa alguma coisa do 'O Bem-Amado'. É bom saber de quem se trata. Paulo Gracindo foi um grande ator.

De todos os trabalhos que fez, tem algum que te marcou mais profundamente?

Não tenho um mais especial, talvez um que tenha feito mais sucesso. Falei do 'Casarão' e acho que ficou uma coisa muito forte em televisão, porque é forte a história, o fato de meu pai fazer o mesmo personagem que eu fazia. Em teatro, gosto muito de um trabalho que fiz com a Marília (Pêra), chamava 'Exercício' e também era um estudo sobre teatro. Na época (1977/78), era um trabalho importante pra gente revisitar nossa profissão, como estou fazendo hoje, 53 anos depois, revisitando o que faço, o meu ofício.

E tem outros projetos em vista pra esse ano?

Estou contratado da Record e no final do ano vou fazer uma série que vai se chamar 'Os Dez Mandamentos'. Tem um filme meu sendo lançado: 'Bonitinha mas Ordinária'. Também está em cartaz o 'Tainá 3', um filme infantil, que conta a história de uma indiazinha e é um deslumbramento de filme. E esta peça que vai continuar, queremos muito mostrar esse trabalho.

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