Popularidade de séries, filmes e podcasts que tratam sobre o assunto, como "Pacto Brutal - O Assassinato de Daniella Perez", está em alta e alavanca produções culturais nacionais
Daniella e sua mãe Glória Perez: as duas trabalhavam juntas na novela “De Corpo e Alma”, em 1992, quando a jovem foi assassinada (Divulgação)
Poucos dias após o lançamento dos primeiros episódios de "Pacto Brutal - O Assassinato de Daniella Perez", a minissérie documental nacional já havia se tornado a produção original mais assistida na plataforma da HBO Max no Brasil e na América Latina. Ao longo de seus cinco episódios, o seriado faz uma reconstituição do crime que tirou a vida da jovem atriz e abalou o país há 30 anos. Para isso, traz relatos de pessoas ligadas à vítima, concentrando-se em sua mãe, a escritora Glória Perez.
Para a psicóloga Gabriela Marsioli, de Campinas, que atua na abordagem comportamental cognitiva e em programação neurolinguística, essa popularidade em torno do gênero está relacionada à curiosidade em entender o motivo que leva alguém a praticar o crime. "As pessoas também querem entender os comportamentos que esse criminoso desenvolve no decorrer do ato em si", aponta. A notoriedade do gênero em produções nacionais, de acordo com a especialista, pode ser explicada por causa da identificação do público que está mais próximo destes casos. "Além disso, muitas vezes ter acesso a esse conteúdo traz a oportunidade de discutir e refletir sobre a segurança pública do país", analisa.
A ascensão do "true crime"
Apesar de termos uma expressão simples em português para descrever este gênero que ganha cada vez mais fãs, o "crime real", sua versão em inglês, o "true crime", acabou se popularizando. Os conteúdos do gênero têm atraído a atenção do telespectador mundo afora, e no Brasil muitas produções nacionais analisando crimes locais vêm ganhando destaque nos últimos tempos. O podcast "A Mulher da Casa Abandonada", criado pelo jornalista Chico Felitti, gerou intensos debates dentro e fora da internet sobre limites da exposição de crimes ao contar a história de uma mulher que mantinha uma doméstica em condições de trabalho análogas à escravidão.
Serviços de streaming se apoiam em lançamentos como o documentário "Elize Matsunaga - Era Uma Vez um Crime" (na Netflix) e filmes relembram casos famosos, como "A Menina Que Matou os Pais" e "O Menino Que Matou Meus Pais" (no Amazon Prime Video) - os longas que recontam duas versões do caso Richthofen. O podcast "O Caso Evandro", criado por Ivan Mizanzuk sobre o menino morto no Paraná em 1992, atuou com um trabalho investigativo tão profundo que trouxe novidades importantes para o caso que incriminou pessoas inocentes.
Apesar de a psicóloga alertar para os riscos com o excesso de consumo de conteúdos "true crime", que podem gerar sentimentos e sensações prejudiciais como ansiedade, medo e insegurança, ela vê o lado positivo da popularização do gênero. "A partir do momento que a população tem acesso a esse tipo de informação, a curiosidade também dá espaço para a conscientização e a importância de não se calar perante a algum tipo de agressão. Então espera-se que medidas sejam tomadas antes de chegar ao extremo da violência e que não chegue a conclusão do crime em si", ressalta Gabriela.
Tirando o foco dos criminosos
A minissérie "Pacto Brutal" gerou muito debate nas redes sociais nos últimos dias principalmente por não ouvir a versão de Guilherme de Pádua e Paula Thomaz, julgados culpados pelo assassinato e que hoje estão soltos após cumprirem uma parte da pena determinada. Durante os anos em que o processo estava sendo investigado e julgado, no entanto, as várias versões do casal tiravam o foco do crime indicando que Daniella teria se envolvido romanticamente com Guilherme. A explicação da diretora Tatiana Issa, em entrevista a uma emissora de TV, pode dar uma luz sobre o porquê desta decisão: "É imprescindível que a série consiga esclarecer de uma vez por todas que isso (o romance entre Daniella e o assassino) nunca aconteceu. Essa narrativa faz parte de um viés sempre machista, de tentar culpabilizar a vítima, transformar os fatos a favor dos criminosos, perpetuar inverdades, muitas vezes convenientes para vender revistas e jornais. Isso precisa acabar". A cineasta reforça ainda que o documentário se baseia nos autos do processo, nos julgamentos e na verdade do crime.
Obras de autores brasileiros para quem quer saber mais sobre crimes reais: