Longa rememora enfrentamento histórico da população do Chile contra ex-ditador
Cena do filme "No" (Divulgação)
'No' (Chile, França, Estados Unidos, 2012), do chileno Pablo Larraín, que estreia nesta sexta-feira (8) em Campinas, está longe de ser um grande filme, porém, foi indicado ao Oscar na categoria estrangeiro, fato mais ou menos simples de compreender. A referida categoria adora produções que mencionem lutas contra a opressão e falta de liberdades políticas/sociais em geral — neste caso, o filme está baseado em episódio que rememora um enfrentamento histórico da população do Chile contra o ex-ditador Augusto Pinochet.
E, para completar, é uma coprodução com Estados Unidos, e o roteiro de Pedro Peirano obedece uma regra elementar do cinema americano, que quase sempre se revela infalível como narrativa: centrar a atenção no episódio sobre o qual deseja falar sem se desviar aos outros elementos em volta.
Só para esclarecer, não é a história de Pinochet nem da ditadura, mas de um episódio em particular, que foi o referendo convocado pelo próprio governo e no qual convidava a população a dizer sim ou não para a continuidade do ditador no poder. Portanto, o roteiro fala do tempo (um mês) da duração do plebiscito e de como situação e oposição usaram o momento único para votar — prática incomum naqueles idos no Chile.
Ao estruturar o filme desta maneira, ele adquire certa leveza, pois a oposição, liderada pelo publicitário René Saavedra (Gael García Bernal), aproveita a chance para se valer do humor em um país marcado pela dor e violência. Tal iniciativa desagradou ativistas radicais, no entanto, tornou-se poderoso instrumento para desmontar o governo.
Veremos, assim, a disputa nos bastidores e o confronto de ideias centrado no programa diário de TV entre os aliados de Pinochet conclamando a população a dizer sim e os opositores chamando o povo a rechaçar a postulação do ditador com sonoro não.
Impressiona nessa história ocorrida em 1988 o fato de que nem a população nem os engajados politicamente (reunidos na equipe do programa) acreditavam que pudessem ganhar o referendo. O único objetivo era incomodar os militares e aproveitar a abertura dada pelo próprio ditador. Este se torna o ponto crucial do publicitário em defesa de uma campanha agressiva – mas sempre com humor. E, neste caso, usado como o inusitado, o inesperado visando desconcertar o governo. Assim, o que pareceria uma campanha sangrenta se torna brincadeira séria, provocação. E, como se sabe, a oposição venceu.
Pablo Larraín dirige em ritmo de suspense. Sim, porque apesar do humor, os militares não gostaram nem um pouco da provocação e ameaça, vigia e pressiona os opositores. Como tudo é velado em uma ditadura, acompanhamos a história em meio a esse clima tenso, mesmo sabendo com antecedência o que aconteceu.
A pressão militar servia mais para assustar a oposição, pois, assim como esta não tinha dúvidas de que perderia, Pinochet estava certo de que ganharia, mesmo porque o país cresceu economicamente desde a tomada do poder e muitos chilenos o elogiavam por isso. Mas a confiança foi tamanha que ele não deu importância para o avanço dos opositores.
Interessa ao diretor e roteirista este preciso recorte da história, ou seja, um episódio específico analisado a partir de duas questões: apoio ou não a Pinochet. Não há discursos, bandeiras ou passeatas, mas estratégia. Como o próprio filme, cuja proposta política e linguagem cinematográfica se completam, pois possui um bem desenhado roteiro como trunfo o que possibilitou a eficiente narrativa.