um espaço feminino nas artes

Exposição reúne artistas mulheres em iniciativa inédita que discute o machismo no mundo artístico

Mostra coletiva "Nós Que Habitamos o Mundo Alheio" será aberta nesta terça-feira (20), às 17h, na Galeria Arqtus, no Taquaral

Cibele Vieira/ [email protected]
20/06/2023 às 09:36.
Atualizado em 20/06/2023 às 09:36
A curadora Ligia Testa defende a necessidade de debater a questão da igualdade de gênero nos acervos e a importância de contemplar a arte produzida do ponto de vista feminino (Divulgação)

A curadora Ligia Testa defende a necessidade de debater a questão da igualdade de gênero nos acervos e a importância de contemplar a arte produzida do ponto de vista feminino (Divulgação)

A mostra coletiva "Nós Que Habitamos o Mundo Alheio! (NQHMA)", que reúne 14 mulheres em torno de um tema pouco discutido, que é a minoria feminina em exposições pelas galerias do mundo, será aberta nesta terça-feira (20), às 17h, na Galeria Arqtus, no Taquaral. O instigante nome agrega reflexões multilaterais sobre a presença ocultada da mulher no mundo artístico. Todas as participantes são brasileiras, algumas com carreira internacional, mas unidas pela mesma motivação de mudar essa realidade. Com organização e produção da curadora Ligia Testa, a exposição revela as histórias das artistas que são colocadas no centro das atenções.

"A proposta é mais uma de muitas iniciativas para provocar conversas, reações, discussões, para adensar a busca pela igualdade de gênero nos acervos mundo afora, e para propiciar que as pessoas contemplem a arte produzida do ponto de vista feminino", explica Ligia. As 14 artistas são de diferentes cidades, técnicas, idades, classes sociais e formações acadêmicas. São brancas, negras, periféricas, mães, donas de casa, profissionais em diversas carreiras, todas reivindicando reconhecimento e um novo paradigma à história da arte. "Precisamos criar mais - e sempre, sem descanso - condições sociais, políticas, culturais e intelectuais para que as mulheres tenham seu espaço na arte", enfatiza.

Nessa coletânea de histórias pesa a consciência de que não é fácil morar no mundo alheio, onde as mulheres não são convidadas naturalmente a participar. A descoberta da necessidade de produzir arte veio de maneiras diferentes e em tempos próprios a cada uma, mas hoje elas tentam abrir outros espaços para que novas gerações de mulheres artistas os ocupem.

Participam da mostra Cristiane Maschietto, Cristina Sagarra, Di Miranda, Doris Homann (in memoriam), Duda Clementino, Fernanda Carvalho, Flavia Jackson, Gisele Faganello, Josie Mengai, Mariana Gadelha, Nadir Santilli, Nenesurreal, Olívia Niemeyer e Tania Martins.

Muita diversidade

A artista alemã Doris Homann (1898-1974) terá suas obras expostas como homenagem a seu papel como pintora, ceramista, escultora e gravurista. Ela conviveu com os maiores nomes da cultura europeia e deixou um legado ainda pouco conhecido no Brasil, país que escolheu para viver com as duas filhas, uma delas residente em Campinas. Migrante da Segunda Guerra Mundial, Doris queria um mundo menos desigual e pintava as dores da guerra e as transformações de seu tempo. Sua primeira obra produzida logo que chegou ao Brasil foi um registro de suas memórias da imigração.

Outra artista que conta sua história na mostra é Nenesurreal, que direcionou seu talento para o grafitti. "Minha guerra faço com arte", afirma. E isso fica claro ao contemplar as mulheres de suas obras, que têm o olhar infinito e instigante, buscando a visibilidade da mulher negra na sociedade, lutando contra o preconceito étnico-racial e de gênero. Ela, que estará em Campinas pela primeira vez na abertura da exposição, conta que começou sua trajetória artística em vivências diárias, sendo aprendiz de artesã com a avó. Atuante nas artes desde 1996, ela se define como "mulher negra, periférica, mãe, avó, artista plástica, artesã, educadora social, escultora, pintora, artista visual e grafiteira".

Obra “Memórias da Imigração”, de Doris Homann (Divulgação)

Obra “Memórias da Imigração”, de Doris Homann (Divulgação)

Machismo oculto

Desde 2019, quando saiu um artigo de pesquisadores americanos sobre a minoria feminina nos espaços expositivos (divulgado pelo National Museum of Women in the Arts) o tema começou a ganhar repercussão internacional. O estudo mostra que a maioria das obras nas coleções dos 18 maiores museus dos Estados Unidos foi produzida por homens brancos. Eles compõem cerca de 75% dos acervos, enquanto as mulheres brancas representam 11%. Homens asiáticos e latinos, juntos, somam cerca de 10%, e menos de 1% das coleções é reservado a todos os outros grupos que não se encaixam nessas categorias.

Em Campinas, a Secretaria de Cultura não tem números que indiquem a participação de homens e mulheres em exposições instaladas em espaços públicos. Mas no Museu de Arte de São Paulo (Masp), apenas 6% dos artistas do acervo em exposição são mulheres, e 60% dos nus são femininos. Essa é uma situação recorrente no mundo. "As mulheres precisam estar nuas para entrar no Metropolitan Museum, em Nova York? Na seção de arte moderna, 5% dos artistas são mulheres, mas 85% da nudez nas obras é feminina", alerta a Guerrilla Girls, grupo nova-iorquino de artistas feministas anônimas que combatem sexismo e machismo no mundo da arte.

"Estamos em pleno século XXI, é verdade, mas a igualdade de gênero no universo das artes está longe da superação", diz Linda Nochlin, historiadora da arte, que reivindica um novo paradigma mostrando que as barreiras da sociedade impediam (no passado) e ainda impedem (no presente) as mulheres de desenvolver seu lado artístico e de obter reconhecimento como artistas. Um dos sinais dos novos tempos está na reforma do Museum of Modern Art (Moma), também em Nova York, que tem a proposta de aumentar a diversidade, contemplando mais obras de artistas femininas e de trabalhos de outras regiões do mundo. Dentro dos novos acervos, especula-se a inclusão da obra "A Lua", da brasileira Tarsila do Amaral.

PROGRAME-SE

Exposição "Nós Que Habitamos O Mundo Alheio"

Quando: Abertura terça-feira, 20/06, das 17h às 21h.

Visitação até 20/08, sob agendamento

Onde: Galeria Arqtus - Av. Dr. Heitor Penteado, 1611, Taquaral

Entrada Gratuita

Informações: Instagram @arqtusconcept ou WhatsApp (19) 99792-7221

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