POESIA

Elizabeth Bishop: uma flor redescoberta pela telona

Filme sobre a experiência da poetisa americana no Brasil desperta interesse pela obra da autora

Fábio Trindade
fabio.silveira@rac.com.br
15/09/2013 às 05:00.
Atualizado em 26/04/2022 às 02:52

A poetisa norte-americana Elizabeth Bishop (1911-1979) ( Divulgação)

“Ah, turistas, então é isso que este país tão longe ao Sul tem a oferecer a quem procura nada menos que um mundo diferente, uma vida melhor, e o imediato e definitivo entendimento de ambos após dezoito dias de hiato?”.  A chegada ao Brasil, em 1951, da poetisa norte-americana Elizabeth Bishop (1911-1979) não foi das melhores. Em busca de um sentindo na vida, ela deixou os Estados Unidos para conhecer a América do Sul e, no roteiro, havia uma escala de dois dias no Rio de Janeiro. “Após uma dieta frugal de horizonte, uma paisagem: morros de formas tão práticas, cheios — quem sabe? de autocomiseração, tristes e agrestes sob a frívola folhagem, uma igrejinha no alto de um deles. E armazéns, alguns em tons débeis de rosa, ou de azul, e umas palmeiras, altas e inseguras.” Assim era Santos, a porta de entrada de Elizabeth no País e onde ela pegou um trem para a capital fluminense.O inusitado cenário e a impressão negativa de um povo expansivo, entretanto, foram só o começo do que o Brasil tinha a oferecer à poetisa. Nessa busca por descobertas, ela encontrou a arquiteta brasileira Lota de Macedo Soares (1910-1967), com quem assumiu sua homossexualidade com surpreendente naturalidade para a época. O resultado foi o prolongamento de sua estadia de dois dias para 16 anos, entre idas e vindas. Uma história de amor, sob o difícil pano de fundo do Brasil dos anos 1950 e 1960, contada no veemente e dramático livro 'Flores Raras e Banalíssimas', de Carmen Lucia Oliveira — publicado em 1996, mas que acaba de ser relançado pela editora Rocco (222 págs., R$ 41,50). O enredo voltou à tona graças ao ótimo longa 'Flores Raras' (em cartaz em Campinas), baseado na obra de Carmen, do diretor brasileiro Bruno Barreto, tendo a atriz australiana Miranda Otto (em uma entrega impressionante ao papel de Bishop) e Glória Pires como Lota. O foco é a conturbada relação entre as duas, encerrada com o suicídio da arquiteta em 1967. Mas o filme faz mais do que resgatar essas duas figuras. Devolve para o holofote a obra primorosa de um dos maiores nomes da poesia americana do século 20, uma produção que, em boa parte, saiu em terras brasileiras.Além do relançamento, no embalo do sucesso chegou também às livrarias pela Autêntica o inédito 'Conversas com Elizabeth Bishop' (192 págs., R$ 39,90), organizado por George Monteiro, que reúne 24 matérias veiculadas na imprensa internacional e brasileira sobre a escritora. Ótimas oportunidades, incluindo o filme, para saber quem realmente foi essa mulher.Apesar do Brasil poder se orgulhar de ter sido fundamental para uma das poetisas mais importantes dos últimos tempos, nenhum livro foi publicado integralmente no País. O que mostra que os brasileiros não estão entre seus principais leitores. Os poemas de Elizabeth aparecem em apenas duas coletâneas, 'Poemas do Brasil' e 'Poemas Escolhidos', ambas publicadas pela Companhia das Letras e com tradução de Paulo Henriques Britto. Mas a editora prepara o lançamento de um livro com a produção em prosa da poetisa para 2014, incluindo alguns textos inéditos, também com seleção de Britto. O que mostra que o cenário para as obras de Miss Bishop está mudando por aqui, assim como o Brasil se transformou para ela na década de 1950. BiografiaElizabeth Bishop chegou ao Brasil com 40 anos e, nessa época, além de ser alcoólatra, se considerava a pessoa mais sozinha do mundo. Seu pai, William Thomas Bishop, morreu quando ela tinha apenas oito meses e, a mãe, Gertrude, foi internada em uma clínica psiquiátrica, onde morreu em 1934.Elizabeth se formou em literatura inglesa na Vassar College, em Poughkeepsie, estado de Nova York e, como não precisava trabalhar graças à herança que o pai deixou, se dedicou a viajar e a escrever o primeiro livro, Norte e Sul, publicado em 1946.No Brasil, ela foi recebida pela dançarina Mary Morse, ex-colega de escola em Nova York, que morava com a arquiteta Lota. No começo, Elizabeth e Lota se estranharam, mas acabaram por se apaixonar uma pela outra.Interessada pelo modernismo brasileiro, Elizabeth fez amizade com artistas como Vinicius de Moraes e Manuel Bandeira. O relacionamento entre a poetisa e Lota começou a se deteriorar, entre outras coisas, por conta do projeto da arquiteta para um parque no Aterro do Flamengo. As obras tomaram conta do dia a dia da paisagista e Elizabeth voltou a beber. Mesmo assim, em 1955, ela recebeu o Prêmio Pulitzer por 'Poemas: Norte & Sul - Uma Primavera Fria', seu segundo livro, escrito no Brasil, e o National Book Award por Poemas Completos, de 1969.

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