Para começo de conversa...

Edigar Contar fala sobre a história das artes cênicas de Campinas

Na última entrevista da série, o ator, diretor e produtor compartilha ideias e demonstra quão grande é o seu amor pelas artes cênicas

Karina Fusco
03/05/2022 às 10:02.
Atualizado em 03/05/2022 às 10:02
"O Teatro Municipal de Campinas era uma referência nacional como local das artes. Com ele, um período de muita riqueza e qualidade de produções locais e também dos espetáculos que vinham de fora, que faziam suas estreias aqui" (Gustavo Tilio)

"O Teatro Municipal de Campinas era uma referência nacional como local das artes. Com ele, um período de muita riqueza e qualidade de produções locais e também dos espetáculos que vinham de fora, que faziam suas estreias aqui" (Gustavo Tilio)

Com os pés fincados em Campinas, respirando artes cênicas com o foco local há sete anos, o ator, diretor e produtor Edigar Contar carrega consigo a paixão pelos palcos e também por ensinar a arte de atuação para as novas gerações. Ele, inclusive, também trabalhou como professor de teatro em escolas públicas e particulares ao longo de 21 anos.

Formado pelo Conservatório Musical Carlos Gomes e contabilizando 35 anos seguidos na ativa, tem em seu currículo trabalhos como ator e diretor em diversas produções, entre elas "Dom Quixote", "Anne Frank", "Antígona", "Pequena Trajetória do Amor" e "O Terceiro" (esses dois últimos de própria autoria).

Ele fala um pouco da história das artes cênicas na cidade, dos grupos, palcos e desafios que tem sido fazer teatro por aqui. Relembra com saudades dos tempos (principalmente até o fim da década de 1990) em que a cena era efervescente. "As peças de teatro e até os espetáculos de dança profissionais (em menor quantidade) campineiros eram recebidos com mais entusiasmo pela população: as estreias lotavam, conseguíamos fazer pequenas temporadas, a Campanha de Popularização de Teatro era efervescente, além de ser sucesso absoluto de público. As artes cênicas tinham fôlego", ressalta.

Para ele, o presente é morno e o futuro que também pode ser chamado de pós-pandemia ainda está em construção. Nesta última entrevista da série Para Começo de Conversa, publicada ao longo de dois meses, Edigar Contar compartilha ideias e demonstra quão grande é o seu amor pelas artes cênicas.

Como você avalia a cena cultural de Campinas em relação às artes cênicas, considerando tanto a formação de profissionais, a atuação de grupos e a produção e apresentação de espetáculos?

Há uma ruptura temporal muito evidente causada pela pandemia. Posso dizer, sem medo de errar, que temos uma cena cultural antes e outra pós-pandemia. Durante esses dois anos "pandêmicos", a classe artística campineira obviamente se recolheu (até literalmente falando), com algumas exceções de trabalhos audiovisuais. Mas em relação a este momento atual, é cedo para estabelecer um panorama ou uma dinâmica de atuação dos profissionais da arte, pelo menos, os de artes cênicas. As estruturas (cursos, produções e espetáculos prontos) estão se recompondo de forma ainda muito lenta. Sei que alguns colegas mudaram de profissão e de grupos teatrais que fecharam as portas. Esta cena cultural ficará mais bem definida a partir do segundo semestre.

Da história das artes cênicas na cidade, quais são os momentos mais importantes na sua opinião?

Bem, confesso que antes da metade da década de 1980 eu absolutamente não acompanhava o teatro na cidade, nem como criança que frequenta espetáculos. Sobre este período anterior, só posso dizer aquilo que estudei ou ouvi dizer: o Teatro Municipal de Campinas era uma referência nacional como local das artes. Com ele, um período de muita riqueza e qualidade de produções locais e também dos espetáculos que vinham de fora, que faziam suas estreias aqui. Quando comecei, em 1987, e até mais ou menos o fim da década de 1990, as peças de teatro e até os espetáculos de dança profissionais (em menor quantidade) campineiros eram recebidos com mais entusiasmo pela população: as estreias lotavam, conseguíamos fazer pequenas temporadas, a Campanha de Popularização de Teatro era efervescente, além de ser sucesso absoluto de público. As artes cênicas tinham fôlego. As companhias teatrais produziam espetáculos variados. As pessoas buscavam muito mais o teatro como prática e entretenimento. Os dois teatros municipais funcionavam. Tinha o TAO (Teatro Arte e Ofício), na Vila Nova, um símbolo de resistência e amor às artes (já que até hoje continua ativo). Outros espaços foram surgindo também nesta época. O Lume consolidou-se neste período. Grupos maravilhosos remanescentes da Unicamp surgiram. Acompanhando a evolução tecnológica, a internet, tudo começou a mudar, a arrefecer. Fazer teatro passou a ser uma batalha mais dura. Produções foram ficando meio que "reféns" de editais de cultura, uma vez que os teatros locais foram fechando e o público foi se tornando menos assíduo. Vejo, portanto, duas situações bem significativas da década de 1980 para cá e há o cenário pós-pandemia, que ainda é um mistério.

Quais são os principais focos de atuação dos atores que se formam na cidade?

De uns quinze anos para cá, a grande maioria dos atores que se formam na cidade se "dilui" em outras profissões. É triste falar isso, mas é a verdade. O mercado está restrito demais, desgastado demais para profissionais cênicos. Muitos migram para a profissão de arte-educadores e teimosos continuam conectados com o teatro, dando aulas para crianças em escolas públicas ou particulares. Como se não bastasse, os "performances" (pessoas que fazem esse tipo de comédia meio narrativa, sem figurino, sem cenário, sem história, sem pé nem cabeça) caíram no gosto popular. E são eles que estão dominando já há algum tempo as salas de apresentações que restaram.

De maneira geral, quais são os principais espaços artísticos (considerado as artes cênicas) que temos na cidade e quais são suas condições?

Um dos teatros municipais (do Centro de Convivência de Campinas) está fechado. Espaços alternativos falidos ou sobrevivendo a duras penas. O TAO é símbolo de resistência e persistência. Teatros particulares, em shoppings, cujas mantenedoras são grandes empresas, funcionam em boas condições e sempre atendendo às demandas de grandes ou superproduções de fora. Artistas locais não têm acesso (ou não têm condições de ter acesso). Posso citar dois espaços que são mais acessíveis e estão despontando como boa cobertura para os daqui: o espaço Paiol, das meninas maravilhosas (Juliana Hilal e Renata Nista) e o Auditório da Associação Campineira de Imprensa (ACI), cuja nova diretoria está empenhada em sua reforma e condicionamento.

Quais são as expectativas para esse momento de retomada? E como você vê o futuro desse setor?

Estamos vivendo um período de extrema incerteza, sob o ponto de vista político-social. As artes, querendo ou não, vêm a reboque disso.

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