vetores do medo

Dos filmes de zumbis ao pânico social

Entre precedentes históricos e fantasias dos "filme de zumbis", os vírus são uma fonte de medo no inconsciente coletivo

France Press
26/02/2020 às 14:26.
Atualizado em 29/03/2022 às 20:37

Entre precedentes históricos e fantasias dos "filme de zumbis", os vírus são uma fonte de medo no inconsciente coletivo, e as autoridades, como a mídia, devem pesar suas palavras sobre o novo coronavírus chinês, para não criar pânico irracional, de acordo com especialistas entrevistados pela AFP.- Por que os vírus provocam medo? "As doenças epidêmicas são fonte de medo inato porque o inimigo é invisível a olho nu", explica o professor Adam Kamradt-Scott, especialista australiano em doenças infecciosas.Isso é particularmente verdadeiro para os vírus, já que existem "poucos medicamentos, ao contrário das bactérias, que combatemos com antibióticos", acrescenta outro pesquisador australiano, o professor Sanjaya Senanayake.E no inconsciente coletivo, esse medo de epidemia ocupa um lugar especial: "é o medo da guerra de cada um contra cada um", observa Laurent-Henri Vignaud, historiador francês da ciência."É o medo de que o Outro - vizinho, irmão, irmã, pais... - se torne um perigo que deve ser evitado", continua ele. "É nesse cenário psicológico que se passa os filmes de terror em que as pessoas são contaminadas e se tornam zumbis". "É extremamente destrutivo porque questiona o vínculo social", segundo Vignaud. "A especificidade das doenças contagiosas é que temos medo dos doentes. Isso muda a natureza da ameaça". Último fator suscetível de alimentar o medo: o fato de um vírus ser novo, portanto desconhecido, independentemente de seu real perigo. - Exemplos históricos? "O que vem à mente imediatamente é a peste" (uma doença que não é causada por um vírus, mas por um bacilo) na Idade Média, observa Vignaud, mencionando "o conceito de patocenose"."Inventado pelo historiador Mirko Grmek (1924-2000), mostra que cada época tem sua doença", continua o historiador francês.Segundo esse conceito, "dependendo do contexto econômico, político, social, esta ou aquela doença é concretamente, mas também psicologicamente, uma ameaça maior do que outra: é uma espécie de competição entre doenças contagiosas e certas se impõem de acordo com o contexto"."Por exemplo, a cólera e a tuberculose foram as duas principais doenças que aterrorizaram o século XIX, e estão ligadas à urbanização, com água suja, superlotação e moradias insalubres", analisa Vignaud. Hoje, segundo ele, "há um efeito de época ligado ao medo de uma pandemia global". "É a contraparte da globalização: o lado bom é que você pode voar e ir a qualquer lugar do planeta em poucas horas. O lado ruim é que, de repente, o vírus também pode viajar", acrescenta.- Qual a atitude das autoridades? "A comunicação é a chave", considera a cientista australiana Raina MacIntyre. "As autoridades sanitárias devem fornecer informações transparentes, que não escondam nada, mas sem criar pânico". "É um equilíbrio delicado", reconhece o professor Senanayake.Informar bem é importante, sublinha MacIntyre: "pode ajudar a reduzir o risco de infecção, graças a conselhos aos viajantes ou recomendações sobre estratégias de prevenção" (uso de máscaras, lavagem das mãos etc.)No entanto, é preciso evitar passar sentimentos exagerados."Após a epidemia de gripe A/H1N1 de 2009, a OMS foi questionada porque emitiu imediatamente o alerta máximo", lembra Vignaud. "A comunicação foi muito mal feita, as autoridades não conseguiram transmitir dados objetivos e isso pode causar pânico"."Para manter a confiança do público, é importante que as autoridades de saúde sejam honestas sobre o que sabem sobre uma epidemia e também sobre o que não sabem", estima o professor Kamradt-Scott.Outro ponto importante, segundo ele: à medida que a epidemia avança, as autoridades devem poder "contrariar teorias da conspiração e boatos".- Qual o papel da mídia? "A mídia tem uma responsabilidade crucial: deve divulgar apenas informações verificadas e factuais, e evitar especulações e exageros o máximo possível", diz o professor Kamradt-Scott."O simples fato de falar o dia todo sobre um assunto, mesmo com a intenção de informar, pode criar preocupações", comenta o professor Senanayake. "No entanto, é papel da mídia manter o público informado sobre novos desenvolvimentos de uma história", continua ele, observando que essa epidemia "está apenas no início e que aprendemos coisas novas todos os dias"."Por outro lado, há a questão das redes sociais, uma área nebulosa onde coexistem informações excelentes e falsas", conclui o professor Senanayake.

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