Instituto Anelo representa o Brasil em solo asiático, em parceria com conservatório mundial de elite interessado em se relacionar melhor com suas comunidades
Professores do Instituto Anelo estão na China, trocando experiências com os profissionais de um dos mais influentes conservatórios musicais do mundo (Divulgação)
Atender a comunidade periférica de Campinas com formação musical de qualidade tem sido a missão do Instituto Anelo, que neste ano completa 25 anos de atuação. Essa sua experiência atravessou o mundo e está sendo compartilhada na China, em uma parceria inédita com a Juilliard School, um conservatório musical de 120 anos de história, considerado o mais influente do mundo no segmento de música, dança e dramaturgia. Desde o dia 9 de abril, o fundador do Anelo, Luccas Soares, e os professores Lucas Bohn e Levi Macedo representam o Brasil em vivências, performances e conversas com músicos da unidade da Juilliard na Ásia — a única da escola fora dos EUA.
Essa parceria abre portas para futuros intercâmbios entre alunos e professores do Instituto em Campinas e a escola de elite sediada em Tianjin, uma das maiores cidades da China. Com essa viagem, o instituto brasileiro entra em contato com a estrutura física e didática de uma escola voltada à formação clássica e, em contrapartida, leva à Juilliard a experiência de dialogar de forma mais próxima com as comunidades mais vulneráveis economicamente. A intenção é que alunos brasileiros e chineses participem de intercâmbios entre as duas instituições. Hoje, o principal intercâmbio dos alunos de Tianjin, para completar a formação em nível superior e voltar para ensinar novos estudantes, é com a Juilliard de Nova York.
Em Tianjin, estão sendo promovidas vivências (na Juilliard e em outras escolas) e performances para alunos e funcionários, sendo uma delas em academia de música de Pequim. Além do intercâmbio, os músicos brasileiros farão ainda uma apresentação pública no famoso Dusk Dawn Club em Pequim, com apoio da Embaixada do Brasil na China. Para Soares, "essa era uma parceria improvável, mas que só prova o poder que a música tem de conectar as pessoas do mundo". Ele afirma que o intercâmbio poderia ser classificado como "surreal por levar a viela até a China", em referência à fundação do Anelo em um pequeno espaço na viela em que vivia, no bairro Jardim Florence.
O PROJETO DOS SONHOS
A ideia dessa primeira visita é apresentar aos orientais um pouco mais sobre o contexto social do samba, como o gênero surgiu e usar exemplos mais conhecidos no exterior, como as composições de Tom Jobim, contam os professores brasileiros. "Falaremos um pouco sobre como Jobim, com sua formação clássica, incorporou elementos da nossa música popular em canções como Wave, Garota de Ipanema", revela Soares. Ele considera essa experiência que está sendo vivida em solo asiático como "muito proveitosa do ponto de vista didático e intensa, em relação às atividades".
Os músicos brasileiros se surpreenderam com a estrutura da escola oriental. Soares comenta que "só em sua sede, a Juilliard tem, por exemplo, três teatros. Há dentro da escola um grande telão que se divide em três telas, com uma apresentação diferente passando em cada uma delas. É muito interessante, o espectador tem uma percepção diferente da música, ou foco maior em uma apresentação, dependendo do banco que estiver sentado. Não é com orgulho que falo, mas no nosso país acredito que não há um espaço similar a este, e não só na música".
Para dialogar com alunos e a comunidade em geral da China de forma mais acessível, uma professora chinesa que atua no Anelo ajudou na tradução e adaptação de discursos, conta Lucas Bohn. Ele ressalta a qualidade técnica e de vanguarda da Juilliard na China, que traz a expectativa de que, de lá, saia a próxima geração de elite da música clássica. Com essa oportunidade, ele salienta: "queremos aprender como promovem as formações de musicalização, os caminhos escolhidos, pois acreditamos no potencial de nossos alunos e queremos agregar mais conhecimento para o desenvolvimento deles".
UM LONGO CAMINHO
A busca por uma pareceria com a Juilliard teve um primeiro capítulo em 2018, quando Luccas Soares, em uma viagem a Nova York, aproveitou para conhecer a escola. Sem avanço em uma possível parceria, o projeto ficou adormecido por um tempo, até ser retomado por intermédio de um apoiador. "No final do ano passado, conheci Stanley Ting, descendente de chineses que mora em Nova York. Comentei sobre nosso desejo de parceria e perguntei se poderia ajudar. Por coincidência, ele afirmou que tinha um amigo que era conselheiro da Juilliard na Ásia, e que tentaria construir essa ponte", conta.
Profissional do mercado financeiro, Stanley contextualiza que a Juilliard é uma das instituições mais rigorosas dos EUA, onde poucos alunos que ingressam acabam "passando na peneira" até a diplomação. Ele revela que esperava alguma dificuldade no contato com a Juilliard, "mas foi tudo muito fácil, demonstraram muito interesse, o que me surpreendeu. O Anelo pode suprir uma demanda deles, passando a experiência de como se comunicar melhor com as comunidades. Essa é uma meta da escola na China, ter uma metodologia para levar música e formação à população mais carente. Como instituição de elite, eles sentem essa dificuldade", relata Stanley.
O professor Lucas Bohn acrescenta que, para avançar numa parceria oficial, a Juilliard pediu informações do Anelo e sobre que tipo de colaboração pretendia promover, além de pedir um levantamento dos custos envolvidos. A partir de então, o próprio Stanley atuou de forma direta em uma mobilização para captação dos recursos necessários, a maior parte com pessoas físicas, mas também com a empresa chinesa Chen HSong, que tem representação no Brasil e, pela contribuição, recebeu uma apresentação musical do Anelo. A viagem atual é a primeira fase de um projeto que precisará viabilizar as etapas seguintes, que é levar outros professores para a China e promover o intercâmbio de alunos entre os dois países. No total, os três músicos brasileiros ficam 12 dias na China, com retorno marcado para sexta, dia 18. Siga o Anelo nas redes sociais: @institutoanelo
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