ESTREIA NESTA QUINTA

Cineasta faz belo retorno com Fragmentado

Tudo o que ele lança é posto à prova de uma forma diferente: precisa ser incrível, inusitado e surpreendente, assim como foi O Sexto Sentido, ou será um grande fracasso

Fábio Trindade
22/03/2017 às 21:07.
Atualizado em 22/04/2022 às 19:56
James McAvoy como Kevin em Fragmentado: criado para Corpo Fechado, personagem ganhou filme próprio (Divulgação)

James McAvoy como Kevin em Fragmentado: criado para Corpo Fechado, personagem ganhou filme próprio (Divulgação)

O diretor M. Night Shyamalan não tem o direito de ser apenas bom ou muito menos razoável. Depois de ter se lançado no mundo cinematográfico com seu maior sucesso até hoje, O Sexto Sentido (1999), com o qual concorreu, entre outros, ao Oscar de melhor filme, diretor e roteiro original, tudo o que ele lança é posto à prova de uma forma diferente: precisa ser incrível, inusitado e surpreendente, assim como foi O Sexto Sentido, ou será um grande fracasso. O fato de ter criado uma marca — grandes viradas no roteiro, daquelas que realmente ninguém espera — fez o cineasta ter espectadores que sempre entram no cinema com a esperança de ficarem de queixo caído com a tal grande reviravolta. E Shyamalan correspondeu bem às expectativas nos anos que se seguiram após O Sexto Sentido. Lançou outros dois grandes sucessos, Corpo Fechado (2000) e Sinais (2002), o que lhe rendeu o status de “novo Steven Spielberg”. Mas tudo desandou depois disso. Começou com A Vila (2004), filme que ainda lhe garantiu boa bilheteria, mas foi destruído pela crítica, mostrando que Shymalan, como qualquer outro cineasta, inclusive Spielberg, também pode falhar. Mas não ajudou o fato de o diretor, produtor e roteirista ter feito os três piores filmes da carreira logo após A Vila, e, como muitos dizem, alguns dos piores filmes da história do cinema: no caso A Dama na Água (2006), Fim dos Tempos (2008) e O Último Mestre do Ar (2010). O que fez Shyamalan perder praticamente toda a credibilidade com crítica e público conquistada no início da carreira. Por isso, qualquer novo projeto do cineasta vem acompanhado do tal julgamento dito no início do texto: será que ele está de volta aos bons tempos ou vai nos presentear com mais um enorme desastre? “Agora, com todos esses anos de experiência, eu estou muito mais em paz com isso e compreendo, na verdade, de onde vem essas coisas”, começa a responder a questão um carismático Shyamalan em entrevista ao Caderno C no Hotel Emiliano, durante sua passagem por São Paulo para divulgar seu novo filme, Fragmentado (Split), que chega hoje aos cinemas. “Não há como comparar certos filmes. Você não pode julgar obras como Invocação do Mal 2 e A Lista de Schindler da mesma forma, eles não estão no mesmo barco, você não pode esperar a mesma força das atuações e nem nada mais. Você entra no cinema para ver Invocação do Mal sabendo o que esperar, assim como vai ver toda a herança judaica de Spielberg em A Lista de Schindler. É no mínimo esquisito julgá-los com o mesmo olhar”, continua o diretor, para chegar ao seu ponto de vista. “Quando faço um thriller psicológico, é algo simples, porque a métrica é clara. Mas quando faço um filme diferente que mistura gêneros, isso soa estranho para quem esperava ver só um thriller. E a verdade é que se produtores, marketing, atores, eu mesmo, críticos e o público tivéssemos a mesma expectativa, seria muito fácil. Só que por mais que eu tenha servido Coca-Cola muitas vezes, quando eu sirvo chá, as pessoas dizem, ‘este é o pior chá que já tomei’. Só que eu disse que estava fazendo chá e não Coca, porque não adianta achar que vou servir Coca-Cola sempre. Às vezes, estou querendo servir um chá.” Shyamalan serve mais do que Coca-cola ou chá em Fragmentado, longa estrelado por James McAvoy que recebeu o rótulo de “o retorno de Shyamalan” pela imprensa norte-americana. Para começar, o filme que foi escrito, dirigido e totalmente bancado pela cineasta (US$ 9 milhões no total, uma medida adotada por ele depois que grandes estúdios ficaram, digamos, preocupados com os últimos fracassos do diretor) se mostrou uma fábrica de dinheiro, pois já faturou US$ 258 milhões ao redor do mundo. “Trabalhar com baixo orçamento tem sido o ideal e o próximo filme também será assim. Isto me permite fazer no set coisas que não seriam usuais caso estivesse fazendo um filme de estúdio. Hoje, quando filmo uma cena, posso resolver filmar tudo de novo no dia seguinte, pois posso ter novas ideias. E não tenho que perguntar para ninguém se acham que devo fazer. Se estivesse filmando com o dinheiro dos outros, teria que perguntar a quem está dando o dinheiro. Só que neste caso o dinheiro vem de mim. Então se quiser gastar alguns milhares de dólares para refilmar uma cena três vezes, nós vamos gastar.” Mas, melhor do que isso, é o fato de Shyamalan apresentar uma trama engenhosa, obscura, muito bem carregada por McAvoy e, para deixar tudo ainda mais interessante, com fortes ligações com Corpo Fechado. “Eu escrevi este personagem (Kevin, vivido por McAvoy) há muitos anos, e acabei deixando ele de fora do roteiro porque eu achei que ele seria só um enredo silencioso perto da forte conexão que havia entre os dois personagens originais do filme (vividos por Samuel J. Jackson e Bruce Willis). Eu tinha que escrever cenas extras que não queria para mantê-lo no filme, até o ponto que percebi que o Kevin merecia algo mais, algo só dele. E foi isso o que aconteceu.”  Final foge ao esperado, mas surpreende   Fragmentado, como todos os grandes filmes de Shyamalan, tem uma cena final que traz grandes, e impensadas, revelações. Mas se trata de um caso diferente. Não é algo diretamente relacionado com o enredo apresentado ao longo da projeção. Não descobrimos que o personagem principal estava morto o tempo todo, por exemplo, como em O Sexto Sentido. Aqui, a intenção é outra, muito interessante por sinal. É importante dizer isso porque o público deve se animar para ir ao cinema para ver uma boa história de suspense. Com ou sem reviravolta, porque ela, no caso, só funcionará para os fãs de carteirinha do cineasta. Então esqueça isso e se concentre em Kevin, um rapaz que sofre de distúrbio de múltiplas personalidades. Para ser mais exato, ele tem 23, que se misturam o tempo todo, e uma nova, chamada de Fera, está para nascer. Para isso, ele sequestra três meninas, que tentam, para se livrarem do cativeiro, entender como ele “funciona”. Qualquer coisa além disso, é spoiler.

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