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Chargista Dalcio e seus prêmios

Aos 17 anos o artista campineiro começou a trabalhar profissionalmente no jornal Correio Popular e suas charges, caricaturas, livros ganharam o mundo

Katia Camargo
30/06/2020 às 12:23.
Atualizado em 28/03/2022 às 20:37
Dalcio Machado começou a carreira profissional no jornal Correio Popular quando tinha só 17 anos (Divulgação)

Dalcio Machado começou a carreira profissional no jornal Correio Popular quando tinha só 17 anos (Divulgação)

O chargista Dálcio Machado dispensa apresentações. Aos 17 anos o artista campineiro começou a trabalhar profissionalmente no jornal Correio Popular e suas charges, caricaturas, livros ganharam o mundo. De lá para cá ele coleciona prêmios nacionais e internacionais. O mais recente deles foi conquistado no 22º PortoCartoon World Festival em Portugal, onde ele ganhou o primeiro lugar com uma caricatura de Chico Buarque. A competição contou com 2.600 obras de 600 artistas de 70 países. Em 1999, Dálcio também ganhou um prêmio no Salão de Humor de Piracicaba com outra caricatura de Chico Buarque. Mas, antes de falar da premiação Dálcio conversou com o Caderno C sobre liberdade de expressão e o caso recente de censura do chargista Renato Aroeira e o blog do jornalista Ricardo Noblat, após a publicação de uma charge de Bolsonaro próximo a uma suástica. Chargistas do Brasil e de outros países aderiram a #somostodosaroeira em defesa da liberdade artística. Caderno C - Antes de falar da premiação que você recebeu de primeiro lugar no PortoCartoon em Portugal recentemente, gostaria que você comentasse sobre a liberdade de expressão dos chargistas. Como exemplo, o recente caso do Renato Aroeira. Como você tem lidado com essa ameaça de censura? Dalcio Machado - Comecei como chargista na grande imprensa aos 17 anos, no Correio Popular e passei por oito presidentes, de direita e esquerda. Sempre fui muito crítico a todos eles, sem exceções. A democracia sempre me permitiu isso. Porém, em um retrocesso absurdo, no melhor estilo fascista, Bolsonaro decidiu que não aceitará críticas e que lançará mão, inclusive, da Lei de Segurança Nacional para calar quem ousar discordar dele.Foi o que aconteceu com o Aroeira e com o Ricardo Noblat. O Ministro da Justiça pediu um inquérito para a Polícia Federal para apurar a charge de Aroeira. Um absurdo desses não poderia passar em branco, a democracia e a liberdade de expressão estavam em jogo. Então, foi criado o #SomosTodosAroeira, onde centenas de cartunistas, inclusive de outros países, redesenharam a charge do Aroeira com os seus próprios estilos. Com isso, o camburão teria de ser gigantesco para levar todos nós. Você já teve algum episódio de censura no seu trabalho? Não, nada importante. Sempre tive a preocupação de me ater aos fatos, só a partir dali botar a imaginação pra funcionar. Por mais espinhoso que fosse o resultado de uma charge, a base sempre era real. Os governos, por mais incomodados que ficassem, aceitavam as regras da democracia. Bom, até agora... Você acredita que #somostodosaroeira representa a liberdade de expressão não só dos chargistas mas de toda uma nação? A liberdade de expressão não é um direito utilizado apenas por artistas ou jornalistas, é uma prerrogativa de todos nós que estamos sob o mesmo manto da democracia. Se aceitarmos que um chargista como o Aroeira perca o direito de se expressar, além de perdermos uma valiosa análise de nossa sociedade, devemos igualmente aceitar que amanhã nossa própria voz pode ser calada, mesmo que seja em uma mera postagem em uma rede social. Como foi receber a notícia de ganhar o primeiro lugar na premiação do PortoCartoon/Portugal com a caricatura de Chico Buarque? Fiquei muitíssimo feliz! O Festival PortoCartoon é um dos três mais importantes do mundo, só este ano recebeu para a competição 2600 trabalhos, de 70 países. Os maiores cartunistas do planeta estão por lá e, certamente, este troféu poderia estar nas mãos de qualquer um deles. Ainda assim, o resultado seria justo. Porém, um detalhe tornava tudo mais difícil. Eu já havia recebido um prêmio com uma caricatura do Chico, em 1999, no Salão Internacional de Humor de Piracicaba. Tive muita dificuldade em criar uma outra obra sem me repetir. Foi um tremendo desafio, mas valeu cada pincelada! Esta foi minha quarta premiação por lá. Agora, são três primeiros lugares em caricatura e um terceiro lugar em cartum. Pode falar um pouco da essência do que quis retratar na caricatura premiada no PortoCartoon? Como sou muito fã do Chico, antes de começar o trabalho, fiquei pensando em qual seria minha música favorita dele. Queria usá-la como pano de fundo para a caricatura. Foi bem difícil, mas Geni e o zepelim ganhou por um milímetro. A crítica ao falso moralismo e à hipocrisia da sociedade nos anos 70, infelizmente continua muito pertinente aos dias atuais. Foi uma homenagem ao Chico, mas também à Geni e ao que ela representa. Vinte anos depois de ter recebido seu primeiro prêmio com uma caricatura do Chico (hoje você coleciona muitos prêmios) sabe dizer quantos já recebeu em sua trajetória? E esse artista sempre te inspirou, na vida e na arte? Como também escrevo poesias e letras de músicas, além de livros infantis, sempre tive o Chico como uma grande inspiração. Se já o amava, agora depois dos dois prêmios que ele me deu, vou amar muito mais! (risos). O primeiro prêmio que recebi foi aos 17 anos, em um salão nacional de humor promovido pela UFRJ. Foi um segundo lugar com uma charge criticando o Collor. Fui receber o prêmio no Rio de Janeiro. Eu morava na roça, Fazenda Rio das Pedras, meu pai costurou o meu bolso com o dinheiro da volta dentro, dizia que o Rio era muito violento! Nunca mais deixei de participar de festivais e até hoje recebi 120 prêmios, em 12 países. Nesse tempo de pandemia, crises humanitárias, sanitárias, políticas e tudo mais, você sente que a reponsabilidade na arte (no caso na sua) fica ainda mais latente? Acho que a charge, antes de tudo, é informação. O chargista muitas vezes fica horas debruçado sobre um papel em branco, pensando em uma forma criativa de interpretar um determinado fato, em como traduzir em alguns traços um noticiário inteiro. Essa informação imagética tem um poder fantástico de comunicação. Para entender o mundo em que vivemos, precisamos nos informar. E essa informação pode vir de várias formas, inclusive, a partir de uma charge.

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