A presença de Débora Bloch é marcante. O tom grave de voz e o jeito sério indicam que a atriz é do tipo que defende suas posições até o fim
Atriz ressalta complexidade de sua personagem (Divulgação)
A presença de Débora Bloch é marcante. O tom grave de voz e o jeito sério indicam que a atriz é do tipo que defende suas posições até o fim. A postura confiante é compreensível. Ao longo de 37 anos de trajetória na televisão, ela conquistou autonomia artística e uma versatilidade cênica que a leva para a comédia ou para o drama com a mesma facilidade. Atualmente, são os conflitos e sofrimentos de Rosinete, papel que interpreta em Onde Nascem Os Fortes, que transitam os pensamentos de Débora. A mulher, inicialmente, conformada com o casamento fracassado e apática diante da traição do marido, é o extremo oposto da atriz. E é aí que está a graça para ela. “É muito mais interessante quando a personagem é diferente de você e é preciso descobri-la”, salienta. Na televisão desde Jogo da Vida, de 1981, Débora chamou atenção por sua atuação em algumas produções de comédia. Entre elas, TV Pirata, Doris para Maiores, A Comédia da Vida Privada e Separação!?. Mas também acumulou protagonistas e personagens de destaque em novelas como As Pupilas do Senhor Reitor, remake exibido pelo SBT em 1994, Andando nas Nuvens, de 1999, e Sete Vidas, de 2015, as duas últimas na Globo. Além de atuações consistentes nas produções mais recentes Justiça e Treze Dias Longe do Sol. Independentemente do gênero que interpreta, Débora preza pela variedade dos papéis. Mas confessa se sentir mais instigada atualmente pela linguagem proposta pelas séries. “Nesse momento em que estou na minha vida e na minha carreira, em que já fiz muita coisa, acho que são trabalhos mais desafiadores e que trazem mais novidades do que uma novela. Mas isso não quer dizer que eu não vá fazer novela”, avisa. Como você define Rosinete, sua personagem em Onde Nascem Os Fortes? A Rosinete é uma mulher casada com um homem muito rico e poderoso na cidade e tem uma filha com uma doença séria, incurável, autoimune, que é lúpus. Ela passa a vida cuidando da filha e rezando para que ela fique boa. É traída pelo marido e sabe disso. É também é uma mulher muito presa a valores tradicionais. Ela foi criada para casar, ter filhos e continuar casada apesar de tudo. Rosinete é uma mulher com o espírito maternal forte. Você se identifica com ela nesse sentido? Essa é a parte mais fácil da personagem para mim, esse lado da mãe que ama e que cuida incondicionalmente dos filhos. Acho que toda mãe entende bem esse sentimento e a Rosinete fica tentando salvar não só o casamento, mas também a família. Dentro dessa cabeça conservadora de que ela vai sempre se sacrificar pela família, uma hora a personagem vai descobrir que pode ter tudo: a família, os filhos e viver a vida dela, ser feliz e não ficar ali em nome de um casamento que não existe mais. Ao mesmo tempo em que é tradicional e uma religiosa fervorosa, Rosinete carrega elementos contemporâneos em sua personalidade, como o hábito de correr. Como você trabalhou a corrida na composição da personagem? É interessante isso porque a corrida é uma coisa de uma mulher bem contemporânea, não é associado às mulheres do interior. Mas tem isso na série, os personagens são do interior, mas têm um toque de contemporaneidade que representa o sertão de hoje em dia mesmo, a gente vive em um mundo conectado. É uma imagem interessante: uma mulher tradicional, de família e religiosa correndo no meio do sertão, da caatinga. Rosinete corre muito e corre rezando. A relação dela com a corrida é uma espécie de mistura entre descarrego e sacrifício. Como se fosse uma penitência. Como assim? Não é que ela se sinta culpada pela doença da filha, mas é muito pesado você ter uma filha doente de uma doença que não tem cura. Isso dá uma certa impotência. Eu digo penitência no sentido de sacrifício, mas isso é uma interpretação que eu faço, não é uma coisa clara. E você passou a correr mais por causa da personagem? Eu voltei a correr por causa da Rosinete. Eu já corria antes, mas machuquei o joelho uma época e parei. Comecei a nadar. Mas agora voltei a correr e corro de quatro a cinco quilômetros. O que mais fez parte do seu processo de composição? Primeiro, eu comecei a correr mesmo porque eu tinha de correr no sertão e precisava estar preparada para isso. Afinal, na hora de fazer a cena, sou eu mesma que faço. Além disso, foi uma maneira de começar a ter uma rotina parecida com a da personagem, como uma aproximação física. Também tivemos uma preparação com Chico Accioly. Com ele, fizemos alguns ensaios e trabalhamos em cima do texto. Depois de dois meses no ar, como tem sido a repercussão da supersérie? As pessoas me param muito para falar sobre a série e é engraçado que elas sempre comentam sobre a poeira, porque a poeira está muito em cena e é uma coisa presente lá. Além disso, na hora em que a gente ia gravar, tinha um contrarregra que ficava jogando mais poeira na frente da lente, para a poeira realmente aparecer porque é um elemento bem presente no sertão. A série está muito bonita e bem dirigida. A direção do José Luiz Villamarim é interessante e diferente do que estamos acostumados a ver a na tevê. Você passou alguns dias no sertão para as gravações. Quais foram as suas impressões da região? É muito bonito. Tem uma luz bonita, um céu muito bonito e é uma paisagem que a gente conhece pouco porque o Brasil é diverso e grande. Mas não fiquei muito tempo lá, tenho mais cenas no estúdio do que sertão. (Da TV Press) Séries dão à atriz mais tempo para respirar A presença de Débora Bloch em novelas é bissexta. A última da qual participou foi Sete Vidas, exibida pela Globo em 2015. De lá para cá, a atriz integrou o elenco das séries Justiça e Treze Dias Longe do Sol. Com mais produtos do gênero no currículo do que folhetins, ela se identifica com o ritmo de trabalho de um projeto que fica menos tempo no ar. “Eu considero que dei sorte. Porque nessas séries você tem mais tempo. Às vezes, você faz em uma série inteira o que gravaria em semana de uma novela”, compara. Recentemente, o público pôde acompanhar Débora na pele de uma personagem completamente diferente de Rosinete: a ambiciosa Gilda de Treze Dias Longe do Sol. Apesar de ter tido uma exibição próxima à da atual produção, os trabalhos da série escrita por Elena Soarez e Luciano Moura terminaram no início de 2017. “A gente começou no final de 2016 e foi para o GloboPlay no segundo semestre de 2017. Só depois que estreou na tevê aberta. Por isso, dá a impressão de que elas foram próximas”. avalia. INSTANTÂNEAS Onde Nascem Os Fortes é a primeira produção em que Débora Bloch contracena com Alexandre Nero 4 No início da carreira na televisão, ficou longe das novelas e se dedicou a algumas participações especiais, enquanto conciliava a agenda com o cinema e teatro Débora é filha do também ator Jonas Bloch, que a inspirou a seguir a carreira artística A estreia profissional da atriz foi na peça Rasga Coração, em 1980 FORÇA E FÉ Em Onde Nascem Os Fortes, Débora Bloch precisa trabalhar a religiosidade de seu papel com atenção. Afinal, é algo que influencia diretamente na personalidade de Rosinete. Mas, ainda assim, as crenças da personagem não impedem que ela tome determinadas atitudes na história. Como, por exemplo, se envolver com Ramiro, de Fábio Assunção, apesar de ser casada com Pedro Gouveia, interpretado por Alexandre Nero. É justamente esse paradoxo que instiga a atriz em cena. “A personagem tem uma coisa conservadora, tradicional, mas ao mesmo tempo é uma mulher contemporânea, querendo se realizar, ter outras experiências e recuperar o prazer com o marido”, justifica. Encontrar o equilíbrio entre religiosidade e liberdade é um exercício constante que Débora precisa fazer para protagonizar as sequências como Rosinete. Pessoalmente, no entanto, a religião não faz parte da vida da atriz. “Uma coisa eu acho interessante na personagem é que a realização dela como mulher não é algo conflitante com a religião. O mais legal da religião é a fé, não os dogmas ou o pecado e a culpa”, acredita. AGENDE-SE Onde Nascem Os Fortes Globo Segunda, terça, quinta e sexta, às 23h.