Primeira apresentação foi feita em setembro, no Centro de Progressão Penitenciária de Hortolândia
Reeducanda observa o show Geleia Geral, com o percussionista campineiro Ding Dong ( Leandro Ferreira/AAN)
Por trás das grades, por dentro do som. Foi o que significou a apresentação do percussionista Ding Dong e convidados na Penitenciária Feminina de Campinas, no bairro São Bernardo, na tarde da última terça-feira. O músico mostrou o show Geleia Geral, que reverencia clássicos do Tropicalimo e surgiu da pesquisa desenvolvida por ele em cima do disco Panis et Circenses (1968), pontapé do movimento liderado por Caetano Veloso e Gilberto Gil, e seguido por artistas como Torquato Neto, Gal Costa, Tom Zé, Wally Salomão e Hélio Oiticica, entre outros. O show já fez 14 apresentações, em Campinas e região, nos locais mais diferentes, de uma casa elegante do bairro Cambuí a outra popular no DIC 1. Ding conta que procurou um rapaz com quem havia trabalhado num projeto social em Hortolândia — César Lobato — e soube que ele é gerente regional da Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel (Funap), que atua em projetos educacionais do sistema penitenciário. “Quando ele me disse que estava na Funap tive a ideia de fazer o show em presídios.” Uma primeira apresentação foi feita em setembro, no Centro de Progressão Penitenciária (CPP) de Hortolândia. A segunda, na Penitenciária Feminina, levou um pouco do mundo exterior e de alegria para dentro dos muros da cadeia.“É muito legal ter esse tipo de atividade no presídio. Ajuda a fugir da realidade, é como se estivéssemos fora do ambiente carcerário. Atividades culturais ajudam muito no processo de ressocialização”, diz a reeducanda Fabiana Tomazini, de 33 anos. “O simples fato de você estar aqui conversando comigo, me faz sentir mais reintegrada à sociedade. Para quem traz o show pode ser muito simples, mas para nós representa muito”, reforça.“Vivemos num lugar tenso. Atividades culturais distraem e quebram a tensão do dia a dia”, afirma Érika Ramos, de 28 anos. “É ótimo, um alívio para a rotina, que quase nunca acontece aqui”, avalia a também reeducanda Maria Arlete Buzzo, de 55 anos. Todas afirmam que eventos do tipo deveriam ocorrer mais vezes. Processo de ressocialização Para a diretora-geral da Penitenciária Feminina, Daniele de Freitas Melo, as atividades culturais e educativas são fundamentais para o processo de ressocialização das detentas. “Temos vários projetos e parcerias nesse sentido, como o Plano de Educação para o Trabalho (PET), que busca capacitar as reeducandas para terem outra perspectiva fora daqui. E a música cria uma identificação imediata”, afirma. Elisande de Lourdes Q. de Oliveira, coordenadora do PET, explica que o programa é desenvolvido em dez módulos e que a primeira turma se forma em novembro. “Trabalhamos várias frentes, desde a questão do empreendedorismo, meio ambiente, até comunicação e expressão. A meta é que elas saiam daqui preparadas para encarar o mercado de trabalho.” Fabiana está entre as futuras formandas e animada com a possibilidade de ajudar na formação de outras reeducandas. “O PET está ajudando a criar diretrizes para quando sairmos desse universo.” Erika, que está presa há sete anos e meio, atua como monitora na biblioteca e conta que as detentas sempre pedem atividades e produtos diferentes. “A procura por livros e revistas é grande aqui. Muitas se refugiam nos livros. Pena que nosso acervo ainda é insuficiente para atender a demanda.” Elisande adianta que a unidade está em vias de implantar o projeto Ciranda da Leitura, que prevê a remição da pena pela leitura. “Elas retiram os livros e têm 30 dias para ler e fazerem uma resenha que será avaliada por uma comissão. Cada 30 dias de leitura representam quatros dias remidos da pena.” Para incrementar o projeto e a biblioteca, a unidade está recebendo doações. “Temos todo tipo de livro, mas pouca literatura”, diz Erika.