Exploração de petróleo em águas profundas volta a colocar a carreira em destaque no Brasil
Centro de Engenharia Naval e Oceânica da USP, o mais antigo laboratório do País a estudar novos sistemas e equipamentos
(Foto: Divulgação)
O estudante João Ricardo Ettrecht, de 17 anos, teve o interesse despertado pelos navios em viagem de lazer
(Foto: Gustavo Tilio/Especial para a AAN)
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Depois de ficar toda a década de 90 estagnada, a engenharia naval ressurgiu em meados dos anos 2000 com a promessa de exploração de petróleo e gás em águas profundas do Litoral brasileiro. Hoje, há falta de profissionais. O bacharel na área é disputado tanto por companhias que desenvolvem projetos, quanto por por empresas de logística e de exploração de petróleo. Para atrair os engenheiros, são oferecidos salários iniciais de R$ 7 mil, além de benefícios generosos.
Durante muitos anos, apenas a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) formaram engenheiros para atuar na área. Com a demanda crescente, o governo criou cursos públicos em Belém (PA) e Recife (PE), mas a indústria ainda precisa importar mão de obra de outros países. Por isso, a profissão foi apontada pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) como uma das que vão estar em alta até o final da década.
O engenheiro naval cuida do projeto, da construção e da manutenção de embarcações e seus equipamentos. Para projetar a estrutura dos navios, precisa considerar o uso dos barcos, a quantidade de passageiros ou carga a ser transportada, a distância a ser percorrida e o local de operação — rio, lagos, mares ou oceanos. Pode ainda planejar as etapas do comércio fluvial e marítimo e conceber e aplicar novas tecnologias na operação de sistemas flutuantes.
O curso de engenharia naval da USP foca também a parte oceânica, como plataformas marítimas e sistemas de transmissão de petróleo. Segundo o professor André Luis Fujarra, o aluno formado pela universidade precisa ter base nas engenharias elétrica, mecânica e mecatrônica. “Ele acaba tendo uma visão bastante ampla e sistêmica de todas as operações dentro do navio. É um dos engenheiros mais completos”, disse.
Por isso, muitos formados são requisitados por empresas de outras áreas, como aeronáutica e logística, segundou Fujarra. “Depois da Petrobras, a companhia que mais emprega ex-alunos de engenharia naval da USP é a Embraer”, disse o professor. Cerca de 40% dos alunos da universidade deixam a área naval de lado e acabam trabalhando somente com o planejamento e escoamento de insumos.
A alta demanda por profissionais dificulta a manutenção de alunos em cursos de pós-graduação e programas de mestrado e doutorado.
Os estudantes conseguem colocação no mercado antes mesmo de se formar. “O que é uma pena, pois os alunos com mestrado e doutorado são os que conseguem os melhores cargos dentro das empresas. Vale a pena um pouco de paciência para ir mais longe dentro da profissão.”
Laboratório
O Centro de Engenharia Naval e Oceânica, no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) da USP, é o laboratório mais antigo do País no estudo de novos sistemas de transportes marítimos, equipamentos navais e produção de petróleo. Outra importante linha de trabalho é a instrumentação e monitoramento em escala real de navios e estruturas offshore, como provas de mar, medições de forças e movimentos, extensometria e análise de desempenho de equipamentos navais. Os ensaios incluem o uso de equipamentos de alta precisão, capazes de medir o comportamento dos navios e plataformas em ondas.
Os testes duram, em média, dois meses, e incluem a construção do modelo, a preparação e o ensaio em si, com conclusões e recomendações. Um robô que vale cerca de R$ 1 milhão constrói os protótipos em fibra de vidro, madeira ou poliuretano em dois a três dias.
Profissional investe em tecnologia
Depois de se formar na USP, o engenheiro naval Fabiano Pinheiro Rampazzo, de São Paulo, encontrou uma forma de empreender e ainda produzir conhecimento para a universidade. Com outros três colegas, Rampazzo abriu uma spin-off (empresa de alta tecnologia que tem suporte de universidade ou instituição pública) especializada no desenvolvimento de projetos para o setor de óleo e gás. “Ficamos durante um tempo incubados no Cietec (Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologias) e temos parceria com o Tanques de Provas Numéricos, dentro da universidade. É bom, porque produzimos conhecimento que pode ser empregado na indústria e também repassado aos alunos.”
Esse foi o jeito encontrado por Rampazzo para não perder bons pesquisadores para o mercado. Todos os profissionais da Technomar, nome da spin-off, tem alguma especialização, mestrado ou doutorado, titulações necessárias para obter o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Simulação
A empresa é especializada no experimento de equipamentos nas áreas hidroviárias, portuárias e offshore. “Já fizemos testes no Rio de Janeiro e até no Japão. Fazemos a simulação de todos os sistemas de uma plataforma ou navios acoplados.”
Rampazzo explicou que sempre quis trabalhar com embarcações, por isso, não foi atraído para a área de logística. “Entrei para a universidade quando a engenharia naval estava ressurgindo. Tivemos toda uma geração perdida de engenheiros navais que nunca trabalharam na área por causa do fechamento de diversos estaleiros no País. Agora, as indústrias sofrem com a falta de profissionais.”
Cruzeiro inspira escolha da profissão
O estudante do 3º ano do Ensino Médio em Campinas, João Ricardo Ettrecht, de 17 anos, sempre quis fazer engenharia, mas optou pela naval depois de fazer um cruzeiro. “Fiquei intrigado por toda a mecânica e pelos sistemas necessários para fazer um barco funcionar”, explicou. No fim do ano, João Ricardo vai prestar engenharia na USP e não tem preferência por empresas. “Claro que se eu trabalhasse na Petrobras seria ótimo, mas também tenho vontade de estar na área de logística, dentro dos portos brasileiros.”
O curso de engenharia naval tem dois anos de formação básica, com muita física, matemática, computação e química. Em seguida, começam as matérias específicas das engenharias e da formação profissionalizante, como hidrodinâmica, estruturas navais, projeto de navio e plataformas marítimas, construção naval e transporte aquaviário. Em aulas práticas em laboratórios, o aluno constrói e testa modelos e maquetes estruturais. A duração média é de cinco anos.