Jovens estão cada vez mais comprometidos com ações sociais, ambientais e humanitárias e sentem-se realizados e gratificados
No Brasil e lá fora muitos jovens despertaram para situações inaceitáveis como a desigualdade social, degradação ambiental, tragédias climáticas e dramas derivados de retrocesso ou desprezo aos direitos humanos. Um número expressivo deles tem aderido de forma crescente ao voluntariado e se engajado em programas assistenciais, em projetos de preservação ambiental e de ordem humanitária. Alguns ganharam projeção mundial enquanto outros desenvolvem suas ações de forma anônima, mas não menos importante. Como característica em comum, esses recém-saídos da adolescência têm muito brilho no olhar, falam com propriedade sobre seus propósitos de vida e lutam por um mundo melhor, não só para eles, mas para futuras gerações, também. Mesmo com pouca idade, acumulam experiências em atividades que contribuem para transformar a realidade, seja deles próprios ou de outras pessoas. Apropriam-se das questões mais complexas e negligenciadas pelos poderes públicos com muita determinação e coragem. A Metrópole traz nesta edição a história de alguns desses jovens inspiradores que têm feito a diferença na rua, no bairro, na comunidade, na cidade e até no mundo.Um deles é o técnico de alimentos Arthur Ferreira Dias. Formado pelo Cotuca aos 18 anos, o jovem não deixou escapar a oportunidade de viajar em 2015 para Moçambique, na África, pela Ong Fraternidade Sem Fronteiras, para ajudar a implantar uma padaria na aldeia de Muzumuia. “Foi uma experiência transformadora e percebi o quanto podemos fazer e aprender com os outros. Encontrei por lá muita pobreza, muita escassez material, mas o que mais me impressionou foram os sorrisos e a esperança de cada pessoa que cruzou o nosso caminho. Voltei diferente e percebi que não conseguiria mais deixar de me envolver nestes projetos humanitários. Sem dúvida, essa viagem me mostrou o que de fato dá sentido na minha vida”, conta o jovem. Arthur faz questão de ressaltar que herdou dos próprios pais esse olhar amoroso dirigido ao outro, após a inscrição de seus próprios pais no cadastro do Serviço de Acolhimento de Campinas. Sua família foi a primeira a receber uma criança dentro da proposta de família acolhedora. Com isso, o jovem cresceu tendo vários irmãos e, ainda novo, teve que aprender a lidar com o sentimento de desapego (mas da forma mais bonita de amar) quando alguma criança voltava para a sua família biológica ou era adotada. Hoje, aos 22 anos, o estudante de engenharia na Unicamp integra outros projetos da mesma Ong. Desta vez seu olhar está voltado para a crise migratória dos venezuelanos. Pelo projeto Brasil, um coração que acolhe, ele já esteve duas vezes em Boa Vista, capital de Roraima, para acolher os migrantes que chegam em busca de uma oportunidade. “A realidade deles me impactou muito. Fiquei extremamente tocado com um jovem venezuelano que conheci e andava, todos os dias, 12 quilômetros em busca de comida e um emprego. Acho que pela idade próxima, me coloquei muito no lugar dele. Eu sonho e acredito em um mundo melhor e vou tentar contribuir com o que eu puder”, disse.O Centro de Acolhimento que Arthur atua começou a funcionar, em outubro de 2017, em Roraima. Por meio dele, as famílias de venezuelanos são recebidas e para elas são fornecidas alimentação, orientação para serviços de saúde e educação, e aulas de português. “Ajudamos também a fazer os currículos deles e tentamos encontrar um local para trabalharem e assim conseguirem ter a dignidade de volta. São oportunidades de recomeços, redescobertas. Agradeço todos os dias a oportunidade que estou tento. Penso também na responsabilidade que carrego e pretendo seguir em frente e me envolver cada vez mais com isso. Sinto que este é o sentido da minha vida. Geralmente, eu sou o mais novo dessas viagens, mas tenho amigos da minha idade querendo embarcar nessa jornada repleta de amor, empatia e esperança”, conta Arthur.A música transformaAos 11 anos, Levi Macedo já sabia o que queria ser no futuro. À pergunta feita por uma repórter naquela época ele respondeu em tom de convicção: “Quero ser igual ao Luccas (Soares), meu professor de violão do Instituto Anelo.” O ano era 2004, mas Levi já sentia o poder transformador da música em sua vida, na do professor que o inspirou, e na de outras crianças e jovens do entorno do Jardim Florence, em Campinas. Hoje, aos 26 anos, seu sonho de criança, não só virou realidade, pois ele dá aulas no Anelo, como foi além como professor também no Instituto Padre Haroldo.O jovem lembra que seu pai e seu irmão sempre tocaram e cantaram na igreja. Eles tinham até um violão. O sonho de ser músico já fazia parte da essência do garoto. Certo dia, um amigo falou sobre um local no bairro vizinho que ensinava a tocar o instrumento. Foi assim que ele entrou para o Instituto Anelo para não sair mais. “Na mesma semana que comecei o curso de violão, o professor teve que mudar para outra cidade. Mas, o Luccas, percebendo minha vontade de aprender se propôs a me ensinar, mesmo não sabendo tocar violão, pois sua especialidade era o teclado. Para me ensinar ele fazia aula de violão na noite anterior e depois ensinava para nós”, lembra.Levi destaca que recentemente se reconheceu na fala de um aluno dele no Anelo. “Um garoto me perguntou o que poderia fazer para virar professor da Anelo. Naquele momento me vi nele e entendi o quanto a música inspira e impacta a minha vida e de outras pessoas. E, mais ainda, da responsabilidade que temos uns com os outros”, diz Levi.Só para dar uma ideia de como a música impactou a vida de Levi, ele além de ser professor já teve a oportunidade de se apresentar na Itália e segue inspirando e sendo inspirado por outras crianças e jovens que, assim como ele, vêem na música a oportunidade de transformar suas vidas, suas realidades e construir uma história diferente.Nascido em 2000 do sonho de um grupo liderado por Luccas Soares, o Instituto Anelo já recebeu 3800 jovens que frequentaram suas aulas de música gratuitamente. Hoje, tanto Levi quanto Luccas, sabem o quanto a música transforma pessoas, lugares, cria laços e esperança, e ajuda a mudar a vida de muita gente. Reforma de escolas “Os incomodados que mudem o mundo”. Com esse lema estampado em suas camisetas, os jovens da Academia Educar, junto a alunos, pais, diretora e professores da EMEF Odila Maia Rocha Brito, no Jardim São Domingos, em Campinas, atuaram no último final de semana de agosto em um mutirão para ajudar a transformar a realidade da escola. Trata-se do projeto Oásis Educar, realizado uma vez por ano, que deixa marcas positivas na vida de muitas pessoas que se envolvem na iniciativa.Foram dois dias dedicados à reforma da escola, pintura de paredes, da arquibancada da quadra, reforma do parquinho com bancos de pneus, e grafitagem das portas do banheiro. Mas, acima de tudo, viram suas potências e capacidades quando unidos tornarem-se mais fortes. “A gente acorda cedo e feliz para botar a mão na massa. Sabemos quanto é importante essa transformação para quem estuda na escola e pra gente também. O projeto Oásis nos ajuda a sentir capazes de construir um mundo melhor para nós e para os outros”, conta Camila Pompermayer, de 15 anos, monitora da Academia Educar DPaschoal.Uma das alunas da EMEF Odila Maia Rocha Brito, Stefany Gonçalves, também de 15 anos, ficou feliz quando soube que a escola havia sido escolhida, por meio de votação para receber o projeto Oásis. “Foi muito bacana ver como a união conseguiu deixar a escola mais bonita, colorida em tão pouco tempo. Esse aprendizado eu vou levar para o resto da minha vida, pois conseguimos ver que juntos ficamos bem mais fortes e podemos fazer muita coisa boa”, conta a jovem.Inspirações pelo mundo A sueca Greta Thunberg, 16 anos, deu início a um movimento internacional de greves de estudantes contra as mudanças climáticas, iniciativa que lhe rendeu a indicação ao prêmio Nobel da Paz. Recentemente, a adolescente realizou o discurso de abertura da Cúpula do Clima, que ocorreu em Nova York e ressaltou que os jovens são uma força irrefreável em pressionar os líderes mundiais a favor do clima. A ativista sueca fez seu primeiro protesto em 20 de agosto de 2018. Começou sozinha. Sete meses mais tarde, na primeira greve mundial pelo clima, em 15 de março, 1,4 milhão de pessoas saíram às ruas.Já a mais jovem ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, Malala Yousafzai, 21 anos, é defensora do direito à educação para meninas e mulheres. Vítima de um atentado pelo fato de ser mulher e estudar Malala vê na escola o papel transformador da sociedade. A jovem ficou conhecida mundialmente após ser baleada pelo grupo Talibã, enquanto estava no ônibus voltando de sua escola, na aldeia de Swat, no Paquistão. Em 2012 a adolescente já era conhecida por sua luta pelo direito das meninas poderem estudar.