Pesquisas mostram que cultivo, além de ser fonte renovável de matéria-prima, enriquece o solo e serve de abrigo e corredor de passagem para animais
Vanessa Tanaka* A eucaliptocultura ou silvicultura (cultivo do eucalipto) ainda sofre um pouco com uma imagem negativa, antiga e, segundo especialistas, equivocada, já que é comumente baseada em mitos sobre o empobrecimento do solo, da fauna e dos recursos hídricos. A pesquisa científica realizada em regiões do Estado de São Paulo com alta concentração dessa atividade pela Embrapa Monitoramento por Satélite, de Campinas, e a preocupação do setor e do mercado, vêm mostrando o contrário, já que a cultura em questão é recurso renovável, utilizado cada vez mais para a geração de energia, para o fornecimento de madeira, produção de papel e celulose, entre outros produtos. As iniciativas de pesquisa, de 2009 a 2013, estudaram os impactos da eucaliptocultura com o objetivo de oferecer subsídios para o planejamento regional e gestão ambiental das propriedades, considerando fatores como a biodiversidade, o balanço de carbono (emissão e sequestro de gases de efeito estufa), erosão do solo, sistemas de manejo e uso de geotecnologias para a delimitação de remanescentes naturais e áreas nativas protegidas por lei. “Observamos que o eucalipto quando não manejado comercialmente, tal como com cortes a cada sete anos, é capaz de regenerar um sub-bosque com árvores e arbustos nativos. O sombreamento impede a colonização por gramíneas como a braquiária e o eucalipto fornece ainda material orgânico através de suas folhas caídas ao chão, proporcionando maior umidade e nutrientes ao solo”, explica o pesquisador da Embrapa Carlos Cesar Ronquim. Na região de Brotas, dentro de uma propriedade que pertence à indústria de papel e celulose International Paper do Brasil, parceira no projeto, foram realizados também levantamentos de espécies de aves e mamíferos que ocorrem nas plantações de eucalipto e nos remanescentes florestais do entorno da área de estudo — o Horto Florestal Santa Fé, uma área da empresa que foi recentemente transformada em Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN). “Os eucaliptais, mesmo sendo manejados comercialmente, servem como corredores para o deslocamento dos animais entre dois remanescentes de vegetação nativa e podem oferecer ainda abrigo, áreas de pouso para as aves e de alimentação para roedores ou outros animais que predam pequenos invertebrados do solo”, afirma Ronquim. Após as primeiras campanhas de campo, foram registradas 53 espécies de aves, distribuídas em 23 famílias e 11 ordens diferentes. Os números ajudaram a compreender como as espécies silvestres usam as áreas de plantio de eucalipto e devem contribuir para a geração de índices de diversidade como um indicador de sustentabilidade para a atividade. Com relação à diversidade de flora, a amostragem realizada em um sub-bosque de eucalipto resultou no levantamento de cem espécies arbóreas e arbustivas nativas. Atualmente, a eucaliptocultura vem ganhando espaço sobre outros agrossistemas, principalmente as pastagens, tornando-se uma alternativa para pequenos e médios agricultores, além da atuação de grandes empresas do setor de papel e celulose. E a Embrapa desenvolve estudos para subsidiar o planejamento ambiental e a gestão sustentável das propriedades agrícolas, indicando, por exemplo, alternativas mais adequadas no uso das terras. Esses dados são importantes ferramentas para atender às normas legais e ao novo comportamento do mercado, que exigem de diversos setores da economia uma nova postura em relação ao meio ambiente. No setor florestal, essa postura tem-se definido na reestruturação das áreas cultivadas com florestas comerciais, promovendo a adequação ambiental. Áreas de preservação permanente e áreas de reserva legal, por exemplo, que foram impropriamente ocupadas por atividades florestais, contrariando a legislação vigente, estão sendo restauradas de forma a promover a reocupação com espécies arbóreas nativas. Estudo avalia impactos com expansão da cultura Ideia é criar piloto de sistema integrado entre a lavoura, a pecuária e a floresta A expansão da eucaliptocultura na Bacia do Rio Paraíba do Sul, no Estado de São Paulo, é o foco de outro projeto de pesquisa da Embrapa. Conhecido como GeoVale, vai avaliar alguns dos impactos ambientais decorrentes do crescimento da atividade na região. A iniciativa propõe uma avaliação da mudança de uso e cobertura das terras verificadas ao longo do tempo e das alterações ambientais em uma das principais regiões econômicas do País e uma das bacias paulistas com maior concentração de eucalipto. Além de mapear a dinâmica da eucaliptocultura, o estudo vai avaliar fatores como biodiversidade, balanço de carbono, taxa de erosão do solo e sistemas de manejo, entre outros. Segundo o pesquisador da Embrapa Carlos Cesar Ronquim, se manejadas corretamente, as florestas plantadas podem propiciar a regeneração arbórea natural e prover habitats favoráveis à fauna silvestre nessas áreas, amenizar os extremos de temperatura e a maior fixação ou menor liberação de carbono para a atmosfera ao ocupar áreas que anteriormente eram usadas para pastagens, principalmente aquelas degradadas. “O projeto de pesquisa GeoVale pretende desenvolver um projeto piloto de sistema agropecuário com integração entre lavoura, pecuária e floresta para conciliação da produção sustentável envolvendo as pastagens e o eucalipto”, afirmou o pesquisador. Os objetivos serão treinar técnicos da região para que auxiliem e conscientizem os produtores sobre os benefícios econômicos e ambientais dessa tecnologia de integração lavoura-pecuária-floresta, conhecida pela sigla iLPF. A adoção de tecnologias sustentáveis mais sofisticadas requer conhecimento, o que só é possível com um processo de transferência de informação com forte interação entre pesquisa, assistência técnica, sistema financeiro e setor produtivo.