Ela faz parte do grupo de especiarias com perfume reconfortante e sabor exótico que deixou doidinhos da silva os europeus há um punhado de séculos atrás.
Ao lado da canela, do cravo, do cardamomo e da pimenta do reino, a noz moscada (do latim nux muscatus), fruto da árvore Myristica fragans (myristica vem do grego myron, que significa bálsamo, e fragans, perfumado e aromático), pertenceu à elite das mais cobiçadas especiarias quando as naus e caravelas do velho mundo romperam as fronteiras marítimas com suas bússolas apontadas em direção ao oriente, mais precisamente Índia, Ceilão, Malásia e Indonésia.
A Ásia, diferente do Brasil (que oferecia à época tão somente o pau-vermelho ou pau-Brasil e a mandioca), era um imenso e rico jardim de aromas e perfumes . Pouco antes, no início da era cristã, os povos do mediterrâneo já sabiam da existência da moscada e suas aclamadas propriedades medicinais, trazidas que foram, porém em quantidades ínfimas, pelos primeiros mercadores árabes que guardam a sete chaves suas rotas pelo oriente.
Relatos de Flavius Aetius, nascido no final do século 4 e um dos últimos grandes comandantes do então decadente exército romano, afirma que a noz moscada era conhecida e muito apreciada na corte de Constantinopla. Mas ela somente seria encontrada com mais frequência nas cozinhas dos palácios, conventos e dos lares dos mais abastados comerciantes da Europa no século 16, quando os portugueses descobriram sua origem no oriente e instituíram o monopólio de seu comércio.
E ela, a noz moscada, assim como suas outras cheirosas e cativantes parceiras, foi na época protagonista de batalhas e trapaças entre humanos. Lusitanos e holandeses logo se engalfinhariam em saques e mais saques em busca da especiaria, atropelando e dizimando milhares de nativos das pequenas ilhas Molucas, na Indonésia, onde originalmente foi encontrada a moscadeira, uma árvore frondosa e de grande porte que pode produzir seus frutos por mais de 50 anos.
O cenário é completado pela presença sorrateira de árabes e chineses, também em busca de fazer fortuna. As hostilidades para o domínio do comércio da moscada só terminariam no século 18, quando os franceses, com ajuda de nativos, na surdina, se valeriam do descuido da vigilância dos holandeses e contrabandeariam mudas para serem cultivadas na Ilha Maurícia.
Décadas depois que os franceses revelaram que a árvore das sementes de ouro se desenvolvia muito bem em outras regiões tropicais, de clima quente e úmido, sua cultura foi liberada e seus preciosos frutos logo estariam produzindo em colônias francesas, inglesas, espanholas e portuguesas, como Singapura, Sumatra, Índia, Colômbia, Caribe e até no Brasil, logo ali, no sul da Bahia.
FALSA NOZ
De natureza picante e morna, com notas adocicadas e amadeiradas, a noz moscada não é uma noz genuína e sim uma semente: é o caroço de um fruto amarelado que lembra um damasco. Sua planta é a unica que fornece duas especiarias, a semente (com uso mais comum entre nós) e o macis, um revestimento delicado que lembra uma película, de cor laranja-avermelhada, que é retirado após a semente secar, porém de aroma mais refinado e elegante que a noz moscada e, portanto, bem mais caro também.
Tanto a noz moscada quanto o macis são muito utilizados na gastronomia europeia e na maioria das cozinhas dos países árabes, como Marrocos, Tunisia, Líbano e Árabia Saudita, para compor suas encantadoras misturas aromáticas, muitas vezes indecifráveis para nós ocidentais; na Índia, por exemplo , é um dos condimentos principais do garam masala.
Sua essência ou óleo é importante na indústria da perfumaria e farmacêutica e na gastronomia a moscada e o macis deitam e rolam em pratos doces ou salgados, como bolos, biscoitos, cremes, pudins, suflês, molhos diversos, purês, sopas, peixes e carnes. Topam, de boa, qualquer parada na cozinha. Evite comprar a noz moscada ralada; assim ela é mais propícia a vir com misturas ou ser adulterada e seu aroma se esvai mais rapidamente. Compre os caroços e um pequeno ralinho próprio para raspá-la quando for usar. Mantenha sempre os caroços em um vidrinho hermeticamente fechado. E já pra cozinha!
Canelone de ricota, peito de peru e nozes
(para 6 pessoas)
Ingredientes
500g de massa pré-cozida e fresca para canelone ou lasanha;
2 colheres (sopa) de manteiga sem sal.
Recheio
300g de ricota fresca, bem amassadinha;
120 g de nozes, quebradas ou piladas grosseiramente;
2/3 de xícara (chá) de creme de leite;
250 g de peito de peru, cozido e desfiadinho;
2 colheres (café) de noz-moscasda raladinha na hora;
120 g de queijo parmesão ralado grosso;
6 ou 7 galhinhos de salsa verde, picadinha;
Sal, pimenta do reino branca e orégano a gosto.
Molho branco
2 colheres de manteiga sem sal, em temperatura ambiente;
½ cebola média, raladinha;
1 fio de azeite;
2 colheres cheias (sopa) de farinha de trigo;
400 ml de leite (integral ou semidesnatado);
2/3 de xícara (chá) de creme de leite;
Parmesão ralado para gratinar;
Noz moscada raladinha, sal e pimenta do reino branca a gosto.
Como fazer
Vamos lá, nosso trabalho levará menos que uma hora: caso queira preparar a massa em casa: 360 g de farinha de trigo, três ovos e um fio de azeite. Misturo tudo muito bem e abro com um rolo em uma superfície enfarinhada; recorto no tamanho necessário e cozinho lâmina a lâmina em muita água com um pouco de sal grosso, retiro, seco com um pano limpo e reservo separadas por um pedaço de filme plástico ou papel manteiga para que não grudem.
Você pode comprar massa semi pronta, que vai direto ao forno. Pra frente: cozinho o peito de peru com um galhinho de alecrim, um dente de alho amassado e uma colher de sal grosso; retiro, descarto a água e as ervas, desfio muito bem a carne com dois garfos e reservo.
Quebro as nozes, mas com cuidado para não fazer delas uma farofa (envolo-as em um pan o de prato limpo e bato algumas vezes com um martelo próprio para cozinha ou o cabo de uma faca) ou as coloco em um pilão ou mortar e soco levemente. Junto todos os ingredientes e amalgamo bem; temos o recheio. Enrolo a massa com o recheio formando canudos, que são nossos canelones.
Unto um refratário com a manteiga e acomodo, com carinho, os canelones. Ao molho: levo ao fogo médio uma panela de fundo grosso com a manteiga, o fio de azeite e a cebola ralada; espero a cebola murchar, junto o trigo, mexo e remexo até ele soltar do fundo e começo a agregar, aos poucos, o leite (deve estar em temperatura ambiente), mantendo este ritual durante aproximadamente 20 minutos.
Junto o creme de leite, a noz-moscada, pimenta do reino, confiro o sal e desligo. Cubro os canelones com o creme, salpico com parmesão ralado e levo ao forno pré-aquecido para gratinar. É isso.