No caldeirão: criado por pescadores italianos que migraram para os EUA em 1800, essa "sopinha" com peixes e frutos do mar pede delicadeza no preparo e é boa pedida para dias de clima ameno
Cioppino (CIÉTE SILVÉRIO/ESPECIAL PARA METRÓPOLE)
Caldeirões são panelas; algumas enormes, outras nem tanto. Junto da vassoura, estão associados às bruxas, que fazem neles uma mistura com asas de morcegos, crecas e outros trecos não comestíveis e que resultam em poção mágica. Para o bem ou para o mal, bem entendido. Se você aí de casa acessar qualquer site de bruxas pela internet, encontrará caldeirão de ferro representando o ventre da deusa (qual das deusas não sei). Dizem que é um dos elementos mais importantes como gerador de energias positivas ou malignas, pois, como o ventre da deusa, realiza desejos e pedidos. É um mistério. E eu estou fora. Caldeirão, aqui para nós, é uma panela de ferro, alumínio ou inox. É grande, mais alta do que a panela comum e contém duas alças para manipulação ou um pequeno feixe de arame ou aço que as unem nas laterais. Nada mais é do que um utensílio doméstico que pode ter formato redondo, quadrado e até retangular. Surgiu com o avanço da metalurgia, séculos atrás, para o preparo de alimentos, por ser bastante resistente ao fogo. Servia, também, para aquecer outras substâncias, como o óleo e os líquidos inflamáveis vertidos sobre guerreiros em uma tentativa de invasão de fortes inimigos. É desse utensílio que vem o termo caldeirada, utilizado para definir, entre ouras coisas, um guisado de peixes de espécies diferentes e frutos do mar. Ainda que batize outras receitas em cidades litorâneas, a palavra caracteriza um prato típico de pescadores. E acredita-se que seja um prato de resistência desses trabalhadores. Como não havia como estocar os produtos sem valor comercial ou que sobravam das vendas, eles eram encaminhados para as caldeiradas e divididos entre os pescadores após um dia de labuta no mar. Hoje, é absolutamente incrível a quantidade de sopas com frutos do mar que encontramos mundo afora. Elas consistem em entradas, mas há versões tão ricas que compõem uma refeição por si só. CIOPPINO (CALDEIRADA ITALIANA DE FRUTOS DO MAR)(para 8 pessoas)INGREDIENTES _4 colheres (sopa) de azeite_2 cebolas pequenas picadas_3 dentes de alho picadinhos_2 folhas de salsão, picadas com a ponta de uma faca_½ xícara (chá) de salsa picada_Mais ou menos 1kg de tomates picados, sem pele e sem sementes_½ garrafa de um respeitável vinho branco seco_1 fundo de colher (chá) de chili em pó ou outra pimenta qualquer_3 folhas de louro_2 batatas descascadas e cortadas em cubinhos_600g de filé de linguado (ou qualquer peixe de carne clara e branca; pode ser até o cação fresco)_600g de mexilhões limpos (guarde alguns com casca para decorar)_600g de camarões cinza limpinhos (reserve a casca para o molho)_200g de vôngoles limpos e com as conchas_500g de carne de caranguejo cozida ou só as patas_500g de vieiras limpas_400g de lulas em anéis_Sal, pimenta-do-reino moída na hora e 1 colher (chá) de orégano seco E VAMOS QUE VAMOSNum caldeirão, de preferência de ferro (se não tiver, use uma panela grande), esquento o azeite. Sempre no fogo médio, vai demorar um pouquinho. Quando o azeite aquecer, jogo a cebola, o salsão, o alho e as batatas, e espero que cozinhem por cinco minutos. Acrescento os tomates, a salsa, o orégano, o sal e as pimentas. Mexo delicadamente. Junto o vinho, abaixo o fogo, espero três minutos, junto três xícaras (chá) do caldo de camarão e as aparas dos peixes. Espero cozinhar por uma hora, sempre em fogo baixo. Depois disso, junto mais três ou quatro conchas de água quente e deixo por dez minutinhos. Ainda com a concha, retiro o máximo do caldo que consigo e reservo numa panela. No molho que sobrou na panela, acrescento os frutos do mar e os peixes. Mexo pra lá e pra cá, delicadamente, para não ferir os ingredientes. Despejo por cima do guisado o molho reservado. Mais uma vez, mexo não mais do que um minutinho. Ajusto o sal, as pimentas e deixo cozinhar por 20 minutos, abafando com uma tampa. Descanso o guisado por dez minutos e sirvo. Retiro do caldeirão e disponho em sopeiras ou travessas redondas. Geralmente, o cioppino é acompanhado por torradas de pão italiano, bruschettas e baguetes francesas. Veja só: na tradução, cioppino significa sopinha. É considerado um dos pratos ítalo-americanos mais populares. A receita é comparada com o brodetto (sopa de frutos do mar com tomates) e o cacciucco; e com pratos que têm origem no Mediterrâneo, como a bouillabaisse da França e os suquer de peix da Catalunia. O cioppino é feito com as capturas do dia a dia dos pescadores e pode absorver quaisquer frutos do mar, inclusive lagostim e lagosta, desde que não vendidos nos turnos do dia. Seu nome é originário de cuppin, um dialeto de Gênova que significa cortar ou picar para fazer ensopado ou coisa parecida. É uma receita italiana autêntica, que começou a ser preparada por pescadores que migraram para a Califórnia em 1800. Mais uma: no Brasil, existem algumas caldeiradas que podem levar dois ou três frutos do mar e alguns peixes. O processo de cozimento é o mesmo. Aí podem entrar o pimentão e o coentro. Elas são servidas com pirão ou farinha seca e arroz branco. Uma cachacinha vai bem.