CECÍLIO

E a lei do talião?

Não é verdade nasçamos, os homens, todos iguais. Não o somos nem mesmo perante a lei

Cecílio Elias Netto
09/06/2016 às 22:56.
Atualizado em 23/04/2022 às 00:03

Não é verdade nasçamos, os homens, todos iguais. Não o somos nem mesmo perante a lei. Pois esta, ao final de tudo, nada mais é do que a ordem estabelecida por grupos dominantes. Ou há quem duvide das diferenças de julgamento, em crimes assemelhados, entre poderosos e humildes? Por que ladrões e criminosos de casaca têm direito a celas especiais, quando ladrões de galinha são jogados, feito lixo, em verdadeiras masmorras? Por justiça verdadeira, homens com diploma, com cultura, com conhecimento deveriam ser mais penalizados, pois sabem o que fazem. Em sua aplicação, seria, a lei, a mesma para o deputado e para o gari? Ora, não podemos ser iguais até mesmo pelo mistério da pessoa humana em si e por si mesma. Basta refletir sobre essa incrível realidade de, em bilhões de pessoas, não haver duas sequer com as mesmas impressões digitais. Nascemos, pois, com a marca da singularidade, destinados a um processo interminável de permanente construção. O humano é um projeto, misterioso projeto tal qual é a própria vida. Há que forjar-se, moldar-se e amoldar-se, burilar-se, aquele constante vir-a-ser tão a gosto dos pensadores. Logo, o homem não é aquele que é. Mas o que será. Não creio possamos acreditar pertencermos a uma só humanidade. Isso pode ser um sonho, algo ainda irreal. Humanidade é a forma acabada e estamos ainda em formação. Para constituir-se humanidade há que se ter homens também já acabados, pois é a isso que ela se refere. Na ordem real, estamos formando diversos tipos e modelos de humanidade. Algumas superiores a outras, com espírito mais elevado, mais próximas dessa aspiração quase divina a que chamamos de dignidade humana. Como admitir que um estuprador pertença à mesma humanidade de Tereza de Calcutá? A realização da ideia de humanidade será, dizem filósofos, o fim da história. Se ou quando acontecer, teríamos, então, alcançado a busca humana pela perfeição, pela harmonia, pela paz universal. Nossos dias, no entanto, revelam o contrário: o conflito, a discórdia, ódios, rancores, individualismos sem fim como bandos selvagens que buscam a destruição uns dos outros. São diversos tipos de “humanidade” em choque. De minha parte, por exemplo, eu me recuso veementemente a aceitar pertencer à mesma humanidade de Eduardo Cunha, Renan Calheiros, no reino miserável da política brasileira. E nem admito pertencer à humanidade na qual vivem estupradores, traficantes de drogas e de pessoas, banqueiros usurários, bandidos animalescos. Ora, tenho consciência de o mundo precisar de compaixão, de misericórdia, de amor, de compreensão, de tolerância. E, com firmeza, acredito na vitória do bem sobre o mal, do belo sobre o feio, do bom sobre o mau. Acredito, sim; não mais, porém, em dimensão universal. Essa harmonia pode e deverá ser alcançada em microcosmos, em núcleos menores, na família, em sociedades unidas pela mesma busca comum. Não existirá, todavia, entre povos que se odeiam ancestralmente. No fim das contas, somos tribos. E se humanidade houver, essa nada mais tem sido do que miríades de tribos conflitantes. Vejo-me, então — ao dedilhar tais palavras — diante do desafio de civilizações, de civilidade. Ora, o homem civilizado — no princípio de tal conceito – era o que morava na cidade. Será que deveríamos — ou ainda podemos — usar do mesmo conceito? Se, para ser civilizado, bastasse morar na cidade, ser da cidade, em quê, afinal de contas, nos transformamos? Hoje, o homem urbano tornou-se um bruto, um egoísta, um ser reativo intoxicado pela violência, pelos ódios, frustrações, rancores. E — quando civilização e cultura começaram a conjugar-se — esse homem da cidade, político — da “polis” grega — era polido, cortês, tinha polimento. Onde ele foi parar? Inquietamente, tenho pensado nas razões que levaram os ancestrais à lei do talião: olho por olho, dente por dente. Ou seja: o ofensor deve sofrer o mesmo mal que causou ao ofendido. A justiça, como retaliação, foi defendida pelos pitagóricos, existiu na lei mosaica e até Dante, na 'Divina Comédia', tomou-a como modelo para o seu Inferno e Purgatório. Será que não seria hora de repensarmos isso? Por que não castrar estupradores e pedófilos? Por que não cortar a mão de ladrões habituais? Políticos brasileiros – mergulhados nessa sujeira do Lava Jato – deveriam ser julgados pela lei do talião. Eles não são apenas ladrões, corruptos, canalhas. Eles são genocidas, pois levam, com seus roubos, um povo à miséria. Genocídio é, também, submeter povos a condições insuportáveis de vida. Não é esse crime que eles estão cometendo contra o povo brasileiro? Pela lei do talião, nossos principais políticos, quase todos, deveriam sofrer o mesmo mal que causam à nossa gente. Cortar as mãos seria pouco? O talião responde.

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