Difícil escrever qualquer coisa quando o assunto principal é a morte de um garoto de 14 anos que foi ao estádio para ver um jogo de futebol. Para o presidente do Corinthians, foi uma “fatalidade”. Para a Conmebol, foi um acontecimento que não merece nada além de um comunicado de condolências em seu site oficial, dirigido à Federação da Bolívia. Para Tite, é uma perda que, se fosse possível, ele trocaria pelo título mundial (só faltava não trocar, não é mesmo, professor?).
Para os 12 corintianos detidos em Oruro, a polícia e a justiça “sabem” que não foram eles que dispararam o sinalizador, apesar de dois deles portarem artefatos idênticos ao que colocou fim à vida de Kevin Douglas Beltrán Espada. Eles também reclamaram da falta de chuveiro e do tratamento da polícia boliviana. Em entrevista de dois minutos, em nenhum momento lamentaram a morte do jovem torcedor. Mas se despediram lembrando que “quarta tem jogo de novo e ‘tamo lá.”
Assim como o presidente Gobbi, muitos torcedores corintianos estão preocupados com a possibilidade de o clube ser punido pela Conmebol. Muitos torcedores rivais torcem para que isso aconteça e certamente o motivo principal aqui não é a dor pela morte de uma criança. Toda essa indiferença me deixa cada vez mais distante do futebol, esporte que eu adoro desde pequeno, a ponto de levá-lo em consideração na hora de escolher minha profissão.
Mas confesso a vocês, leitores, que o prazer e a paixão de acompanhar o futebol estão sendo gradualmente substituídos apenas pela sensação de dever profissional. Isso não vai mudar em nada a qualidade do meu trabalho porque procuro fazer sempre o melhor para o leitor da coluna e do caderno, independentemente da intensidade do meu interesse pelo jogo. Mas é notório que vejo o futebol com outros olhos.
Nem vou entrar na questão da desonestidade e da ganância. O futebol sofre muito com isso, mas infelizmente não é o único. É assim com a religião, com a política, com a medicina, com o jornalismo, etc.
Mas mesmo com a presença de quem está no futebol para sugá-lo, esse esporte maravilhoso poderia ser muito, mas muito melhor mesmo, tanto no Brasil como na América do Sul.
Infelizmente, os que têm poder para mudar esse quadro só estão preocupados com os próprios interesses. E para eles não importa se uma criança morre. Não é interessante combater o crime e muitas vezes bom negócio é ter os criminosos ao seu lado. Descanse em paz, Kevin. Vou rezar por você, por sua família e não vou, como já fiz tantas outras vezes, escrever o que poderia ser feito para evitar novas tragédias como a sua. Ninguém está preocupado e é por isso que tantas crianças como você não frequentam estádios de futebol.