EDITORIAL

Deputados e a nova farra das passagens

O pacote de cortesias feito com o dinheiro do contribuinte passa a vigorar no dia 1º de abril, uma data bastante sugestiva

Correio Popular
02/03/2015 às 05:00.
Atualizado em 24/04/2022 às 00:51

Num momento em que o País passa por grave crise econômica, com inflação em alta, perspectivas nada animadoras para o setor industrial, e em meio a discussões para reduzir os gastos públicos, a Câmara dos Deputados age de forma acintosa e vergonhosa ao conceder a cônjuges de deputados o direito a passagem aérea para se deslocar do Estado de origem a Brasília e vice-versa. A extravagância com dinheiro público é o pagamento de uma promessa feita pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) às mulheres dos parlamentares durante a campanha que o levou à presidência da Casa. A tentativa de beneficiar familiares com passagens já havia ocorrido em 2009, mas foi barrada diante do escândalo conhecido como “Farra das Passagens”. Agora está liberado às custas do contribuinte.Mas, não é só isso. A benesse com o chapéu alheio faz parte de um pacote maior aprovado no dia 25 em favor dos ilustríssimos deputados (Correio, 26/02, A24), que eleva os gastos daquela casa em R$ 145 milhões. O pacote aumenta as verbas de gabinete, a remuneração de assessores e o auxílio-moradia dos deputados que não ocupam apartamentos funcionais. Então fica assim: um deputado federal, cujo salário é de R$ 33,7 mil, vai receber mais R$ 4,2 mil para ficar duas ou três noites por semana em Brasília. Nesse momento, vale lembrar que o salário mínimo recebido pela maioria dos brasileiros é de R$ 788,00. Cunha justificou o reajuste dizendo que não representa mais gastos para a Casa, pois serão cortados os mesmos valores em prestação de serviço, contrato de informática e redução de horas extras. Segundo ele, o gasto com a verba de gabinete destinada ao pagamento de funcionários, reajustado em 18%, corresponde ao IPCA acumulado desde 2012. A inclusão das passagens aéreas para cônjuges rompe a barreira do bom-senso e reforça a visão já estereotipada sobre os políticos de sanguessugas do dinheiro público. Diante da repercussão negativa, alguns parlamentares já anunciaram que não vão usar a verba. É esperar para ver. Um detalhe interessante é que o pacote de cortesias com o chapéu alheio passa a vigorar no dia 1º de abril. Uma data bastante sugestiva.Contrastando com tanta pujança, aqui na América Latina temos o exemplo do presidente uruguaio José “Pepe” Mujica, que mora em uma casa de apenas um quarto na fazenda de sua esposa, dirige um fusca 1978 e doa mais de 90% de seu salário de US$ 12 mil à caridade.

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