CINEMA

'Dentro da Casa' é um longa-metragem sobre sedução

Filme do francês François Ozon está sendo exibido no Topázio Shopping Prado 3, em Campinas

João Nunes
28/05/2013 às 02:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 14:24
Cena do filme 'Dentro de Casa', de François Ozon (Divulgação)

Cena do filme 'Dentro de Casa', de François Ozon (Divulgação)

Não foi mera coincidência 'Dentro da Casa' ('Dans La Maison', 2012) - em cartaz no Topázio Shopping Prado 3, em Campinas -, do francês François Ozon, ser comparado a 'Teorema' (1968), de Pier Paolo Pasolini — sem o tom político deste. No filme italiano, jovem visitante seduz uma família inteira. Não muito distante está o adolescente Claude (Ernst Umhauer). Aluno de literatura de Germain (Fabrice Luchini), Claude o surpreende ao revelar talento para a escrita.

A partir da composição sobre um amigo, o colega de classe Rapha (Bastien Ughetto), o estudante começa a entrar no universo da família do rapaz. E não é nem um pouco lisonjeiro com o amigo, tampouco com os pais dele, a quem chama de “família normal” classe média atrás de pequenos sonhos e feliz com irrisórias conquistas.

Estas observações estão na primeira redação entregue ao professor, que termina com um enigmático “continua” ao final. A propósito de ensinar matemática a Rapha, Claude invadirá perigosamente a casa e descreverá na redação o cotidiano, os diálogos e os segredos da família. Reticente em princípio, o professor se envolverá com o “trabalho” do aluno, pois enxerga talento literário nele. Chega a emprestar-lhe livros e o atende fora do horário de aula.

Claro que isso provocará intriga. O próprio Claude lhe pergunta o porquê de tamanho interesse. Os colegas do aluno suspeitam que Claude também tenha manipulado o professor. Até a mulher (Kristin Scott Thomas) deste imagina algo nesse sentido.

Há vários pontos curiosos a respeito desse anjo exterminador. Aliás, uma série de pinturas na casa de Rapha é identificada por Claude como “anjos”. E o rapaz traz um constante sorriso, que se posiciona entre o sarcasmo e o prazer pelo que está executando, ou seja, invadindo a privacidade alheia.

Se de um lado vemos rescaldo do fenômeno do olhar pelo buraco da fechadura expandido com os reality shows televisivos, de outro, temos um mergulho no entendimento do que seja literatura. O roteiro do próprio diretor não apenas cita os grandes nomes literários universais, como dá aula de como escrever um livro.

O professor ensina ao aluno o que falta à redação: ele precisa entender que o herói deseja algo, mas para consegui-lo enfrentará obstáculos e adversários. A grande questão para prosseguir narrando é: o que o herói precisa fazer para alcançar o desejado. Como se vê, estamos em uma aula de literatura e de roteiro para cinema, mas o professor que conhece as técnicas não sabe executá-las, pois é mau escritor.

Apesar de utilizar esses elementos externos, 'Dentro da Casa' está falando da sedução. O professor que esbanja conhecimentos quer seduzir o aluno; este, que sabe do interesse do professor pela literatura, tenta encantá-lo com seu texto sobre inconfidências de uma família. E, claro, há a própria família que se deixa possuir por esse garoto bonito que os conquista pela inteligência e pela carência — ele não tem mãe e o pai é operário desempregado.

A sedução é o objetivo do herói — segundo os ensinos do professor. E, para alcançá-lo, Claude não pensará duas vezes em ser venal. E o próprio professor entra no jogo sujo. Afinal, ambos buscam a conquista.

Com 'Dentro da Casa', François Ozon realiza um de seus melhores filmes. Não só escolhe atores sob medida, incluindo o jovem Ernst Umhauer, como dirige com sobriedade e eficiência, mas de modo apaixonado pelo objeto fílmico. Sabe que trata de tema delicado, porém, jamais vai além do limite, pois também lhe interessa a empatia do espectador e, assim como Claude, seduz com elegância e sutileza.

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