ENTREVISTA

De pai para filho, o gosto pelo estudo

Em vez de brigas e cobranças exageradas, adultos devem incentivar as crianças e os adolescentes a terem uma relação prazerosa com os livros

Karina Fusco - Especial para Metrópole
25/02/2013 às 15:56.
Atualizado em 26/04/2022 às 03:14

O ano letivo mal começou e muitos pais já estão preocupados com o comportamento dos filhos. É que, muitas vezes, eles se dedicam aos estudos diários apenas para fazer a lição de casa e deixam para se envolver mais com os livros, os cadernos e as apostilas somente nas vésperas das provas.

Como mudar essa realidade é um questionamento constante entre os adultos, que gostariam que seus rebentos tivessem melhor aproveitamento ao longo do período em que ocupam as carteiras dos ensinos fundamental e médio. Mas poucos sabem que cabe a eles dar o estímulo para que isso aconteça.

Para a coordenadora do curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Maria Márcia Sigrist Malavasi, pesquisadora das relações entre família e escola, o hábito de estudar no cotidiano precisa ser construído. Segundo ela, mesmo os adolescentes, que até então precisavam de muita cobrança para conseguir a aprovação, podem pegar gosto pelos estudos.

"O costume de estudar não é automático, nem natural. Ele é historicamente construído e começa na família, antes mesmo da fase da lição de casa", afirma. A especialista fala à Metrópole como os pais devem agir e se envolver com a rotina escolar das crianças e dos adolescentes e indica alternativas para fugir dos erros mais comuns que eles cometem.

Metrópole – Como os pais podem estimular os filhos a adquirir e manter o hábito de estudar diariamente?

Maria Márcia S. Malavasi – O exemplo é essencial. Ler para os filhos desde que são pequenos é muito favorável, assim como mostrar que a leitura é algo agradável e prazeroso. Pesquisas recentes mostram que mais de 50% das crianças com pais leitores adquirem mais facilmente o hábito de leitura. Práticas cotidianas e ambientes também favorecem, ou seja, ver o pai, a mãe ou outros familiares lendo é um grande estímulo, assim como levar os pequenos a visitar bibliotecas, museus e centros culturais. Isso tudo contribui para a formação do capital cultural da criança. Em suma, aprender a estudar começa em casa, muito antes do contato com a lição de casa.

E quando as crianças já frequentam a escola?

Os pais incentivam marcando presença e se envolvendo com as tarefas e a rotina escolar dos filhos. Perguntar cotidianamente como a aula, o que eles aprenderam e o que mais gostaram demonstra interesse e funciona como incentivo. Aquele pai que diz "não precisa fazer lição hoje" está prestando um desserviço ao filho. Quando a família admira um desenho ou uma pesquisa e elogia o que a criança fez está incentivando-a e isso deve crescer proporcionalmente à idade. Mas é preciso ter claro que estudar não significa apenas estar sentado diante dos livros. É um hábito amplo que inclui, por exemplo, decorar a letra de uma música ou ensaiar para uma peça que será apresentada na escola.

Hoje, é comum pais que trabalham o dia todo e por isso os filhos ficam o período integral na escola. Nesses casos, como deve ser o envolvimento dos adultos com os estudos?

Mais importante do que a quantidade é a qualidade do tempo passado com eles. Não adianta a mãe ficar o dia todo em casa e não dar atenção à criança. Vale muito investir um tempo, nem que sejam poucas horas à noite, para sentar ao lado deles e conversar sobre a escola e ver os cadernos e os livros. Com dedicação e interesse, os pais farão diferença na relação da criança com a escola.

Como agir se, mesmo com os estímulos, os pequenos resistirem à prática do estudo diário?

 

Estipular regras e horários é fundamental. Os pais devem conversar, colocar limites e dizer em qual período eles podem brincar, assistir televisão, ficar na internet e qual o tempo necessário de dedicação aos estudos. Limites devem ser postos para que a criança saiba se organizar e ter êxito nos estudos.

Os incentivos devem ser diferentes para as crianças e para os adolescentes?

Não. Carinho, companheirismo e parceria favorecem em qualquer idade. A única forma de incentivo que não dá muito certo é recompensar com presentes. A criança e o jovem compreendem o estímulo positivo independentemente do presente que se materializa em algo que desejam. Muitas vezes, o presente é tão prejudicial que teria um efeito melhor se não existisse, pois o aluno não o enxerga como uma troca, mas como uma obrigação dos pais.

Em quais fases é mais comum eles não quererem estudar?

 

Geralmente, na adolescência, uma fase de busca e reconhecimento de identidade e de maior instabilidade emocional.

Se mesmo com os estímulos e os limites, os filhos não adotarem o hábito de estudar diariamente, o que fazer?

 

Isso demonstra que o filho não vê os limites postos claramente ou é sinal que os limites estão colocados mas não são cobrados. Brigar não costuma dar resultado. Conversa e cobrança do cumprimento dos deveres são os melhores caminhos. Então, diariamente, vale olhar o material de estudos e checar se ele aprendeu o que foi explicado na escola. Isso só deve ser diminuído quando tiver certeza de que a criança ou o adolescente conseguiu assumir aquela responsabilidade e a cumpre com autonomia.

Nos casos de alunos que já tiveram baixo desempenho em anos anteriores, como despertar neles maior vontade de estudar?

Um novo professor, uma nova escola e um ambiente mais adequado para estudar são algumas das possibilidades para motivá-los.

E como influenciar positivamente os jovens que estão na fase pré-vestibular?

 

Nessa fase, o apoio, o carinho e a parceria são muito significativos. Normalmente os jovens estão mais acuados e apreensivos, então é preciso que os pais sejam companheiros de viagem nesse desafio que é o vestibular. Acompanhar sensações e sentimentos e dar afeto são atitudes que ajudam na elevação da autoestima e geram confiança. O pré-vestibulando que tem pais exageradamente autoritários ou afastados de seu cotidiano é o mais inseguro.

Quais são os benefícios que o hábito do estudo diário pode trazer?

 

Sucesso no mundo do trabalho; o saber, que é algo muito estimulante; poder conversar com as pessoas e sentir que consegue interagir com elas diante de assuntos universais são resultados muito agradáveis de tudo o que se estudou na vida.

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