HELIO PASCHOAL

Cristalino

20/10/2012 às 13:33.
Atualizado em 26/04/2022 às 20:19

O Copom do Banco Central poucas vezes deu um recado tão claro em uma ata de reunião como o que estava na que foi divulgada semana passada: o ciclo de cortes na Selic acabou e a taxa básica de juros vai ficar onde está, em 7,25%, por um período indeterminado. Interessante essa mudança de postura do Copom, cujas atas costumam ter que ser decifradas por especialistas de mercado, uma vez que sua linguagem é, no mínimo, hermética; para quem não é do meio, os termos técnicos e as múltiplas interpretações possíveis sobre eles costumam soar como um emaranhado de palavras confusas além da compreensão dos meros mortais.Desta vez, não. Desta vez, qualquer pessoa que batesse os olhos na ata da última reunião entenderia pelo menos este recado (ainda que todo o resto continue sendo de difícil compreensão): os cortes na Selic acabaram. Isso claramente entendido, é preciso agora tentar entender os motivos do Copom - e os possíveis caminhos que ele poderá tomar no futuro.Primeiro, os motivos: os integrantes deste Copom, ao contrário de seus antecessores, desde o início da gestão de Alexandre Tombini no BC, sempre deram mostras de que tinham um olho na inflação e outro no crescimento da economia (antes dessa turma, o normal era se manter os dois olhos na inflação, pouco importando o crescimento).Com base nesta postura, o Copom promoveu uma série de cortes sem precedentes da Selic, levando-a inclusive ao seu menor valor histórico - ainda que tivesse, para isso, de alterar a santificada fórmula de rendimento da caderneta de poupança, uma trava política que sempre impediu medidas mais ousadas antes, mas que foi tomada com respaldo da presidente Dilma Rousseff e que se provou, ao fim e ao cabo, menos custosa para a popularidade dela do que se previa em Brasília.Esses cortes foram feitos visando um objetivo bastante claro: criar condições macroeconômicas para que o PIB brasileiro parasse de patinar e voltasse a andar para frente - mesmo que ao custo de uma inflação sensivelmente maior. Na avaliação do Copom (que este colunista modestamente considera acertada), é muito mais importante nesse momento de crise que se priorize o crescimento da economia do que a busca inflexível dos índices de inflação propostos para o ano.Não que se deva descuidar da inflação - e ninguém defende isso; mas é preciso ter jogo de cintura suficiente para tolerar alguma gordura a mais nos preços, desde que haja um bom respaldo nos números do PIB. Jogo de cintura que este Copom, definitivamente, mostrou que tem.Isso, quanto aos motivos. Agora, os rumos possíveis. A aposta geral do governo e do mercado é que 2013 seja um ano de crescimento econômico mais consistente para o Brasil. Nada de índices chineses, claro, mas índices bastante positivos, de qualquer forma.Cumprida essa previsão, resta saber em que medida ela o será - pois é com base nessa medida que o Copom definirá o que fazer com a Selic no futuro.Se o PIB subir mais do que o considerado patamar produtivo sustentável - ou seja, se houver uma explosão de demanda a tal ponto que comprometa a capacidade da indústria de atendê-la, provocando escassez e forçando os preços para cima, gerando inflação - é absolutamente certo que a Selic subirá (e a depender do tamanho do risco, não subirá tão devagar quanto caiu).Se o PIB subir dentro das expectativas do próprio Copom, gerando riqueza mas sem ameaçar a capacidade produtiva (e portanto, sem risco de inflação de demanda), o Copom poderá estabelecer um voo de cruzeiro bem tranquilo, regulando a Selic com suavidade de acordo com a conjuntura do momento. Este, nem é preciso dizer, seria o melhor dos cenários.Por fim, se mesmo com a Selic no patamar que está, a economia não reagir como se espera no ano que vem, a tendência, dizem os especialistas, é que o Copom opte por não cortá-la ainda mais; por prudência e por bom senso, ela deverá ser mantida onde está por algum tempo, até que seus efeitos tenham sido plenamente absorvidos e devidamente avaliados. Novos cortes, só mesmo se a crise vier a piorar muito, a ponto de reverter por completo as expectativa do PIB brasileiro para o ano que vem de crescimento moderado para recuo brutal.E assim ficamos, em compasso de espera, aguardando a chegada de 2013 e seus números. Haverá inflação? Com certeza, e o Copom sabe perfeitamente disso. Haverá crescimento econômico? É quase certo, salvo novos terremotos na economia global. Haverá como equilibrar uma coisa e outra? Certamente, por difícil que seja (mas é justamente para chegar a esse equilíbrio que existe o Copom, afinal de contas). Pelo menos, desta vez, todo mundo já conhece os cenários possíveis, o que não é pouca coisa nesses tempos de incerteza.

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