Colunista Zeza Amaral (Cedoc/RAC)
Qualquer coisa que traga alegria vale a pena curtir por estes tempos estranhos de pandemia – e a rima pobre que perdoe um escriba isolado de prosa de esquina e padaria; e de uma velha Lagoa do Taquaral da infância que bem lembro de pequenos barcos de namorados nos fins de semana. A lagoa não tinha cercas; apenas árvores protegendo seu entorno. E em suas águas nadava um menino chamado Sílvio Fiolo – anos depois campeão mundial, recordista, em nado peito. A Lagoa do Taquaral foi cercada pelo então prefeito Orestes Quércia. E os loteamentos do Parque Portugal nasceram sem eira nem beira água acima. E levantaram casas e mansões, todas elas despejando seus esgotos na lagoa, o que provocou a morte de muitos peixes. A ideia, na época, era transformar a área da lagoa em um centro cultural e comercial, teatros, cinemas e restaurantes. Orestes Quércia vetou o projeto do Contur – Conselho de Turismo Regional – e a Lagoa do Taquaral virou um gueto urbanístico; e, assim evitando a presença do populacho valorizou os terrenos do entorno – e centenas de empresários imobiliários ligados ao prefeito se esbaldaram em lucros milionários. O projeto inicial do teatro de arena do Centro de Convivência era para ser construído onde hoje está a Concha Acústica – onde só acontece shows de morcegos, baratas e capivaras se escondendo do frio ou da chuva. E o Centro de Convivência da Júlio Mesquita bem poderia virar um piscinão onde futuros campeões de natação poderiam treinar. Água infiltrada não falta, pois não? Um tal de secretário de cultura, Nei Carrasco, confessou, dias atrás, ao competente âncora Flávio Paradella, da CBN, que estava frustrado por não conseguir, após tantos anos no governo municipal, em reformar o Centro de Convivência. E os artistas da cidade estão frustrados também com o dito secretário de cultura que, após tantos anos sentado em sua poltrona ainda não apresentou um projeto sequer a respeito de incentivar a cultura local. Com a palavra o prefeito Jonas Donizete, que nomeou um frustrado para administrar uma histórica secretaria da cidade que, por mais de um século, foi conhecida como a Capital da Cultura do Brasil. E assim a pandemia cultural de Campinas segue o seu curso, contaminando a tudo e a todos, minando sonhos de nossos artistas e agentes culturais. E o FIC, Fundo de Incentivo à Cultura, é apenas um apêndice de um seleto grupo que orbita em torno da Secretaria de Cultura, politicamente unicampesco e seguindo os interesses de um secretário que desconhece os pioneiros artistas da cidade. A conversa é longa e o espaço é curto. E ele que fique jogando conversa fora e mantendo o emprego de seu ego. E assim jogo a minha conversa para dentro das minhas memórias. Thomas Perina, Geraldo Jurgensen, Jota Toledo, todos eles me visitam no meu isolamento pandêmico. E na parede lateral da sala do apartamento tem um quadro de Egas Francisco. Os três primeiros citados estão ausentes. E Egas segue carregando seus pincéis e lápis. E Jonas Lemos persevera no teatro. Oswaldo Guilherme e Denis Brean deixaram suas heranças musicais em antológicos sambas canções. Vilma Maris, Celia Artioli, Laine Carvalho, Tatiana Rocha, Celinha Niero, ainda nos encantam com suas belas orações cantadas pelas catedrais da madrugada. E assim sigo abençoado por todas elas. Qualquer cidade necessita de seus artistas. E nenhum deles precisa de um grande palco, holofotes e camarins. Um artista plástico quer apenas um teto ou uma parede para sustentar suas cores maravilhosas; e a música e a poesia desejam apenas um espaço para acalentar o existencial tormento de nossas almas. E não temos mais espaço físico para nada além de frustrados projetos culturais. E, por favor, tal carência cultural já vem acontecendo há muito tempo – com ou sem frustração de um acadêmico unicampesco. É isso. Bom dia. Zeza Amaral é jornalista, escritor e músico