Com know-how de quem conhece bem os desafios de ser empresário no Brasil, o mestre Roberto Ravioli aconselha jovens empreendedores da gastronomia
Comer & Beber ( Divulgação)
Todo gourmet que se preze já deve ter se deparado com os conselhos do chef Roberto Ravioli na mídia ou, quiçá, degustado alguma das delícias criadas por ele para os menus de suas duas casas, sediadas em São Paulo: Empório Ravioli e restaurante La Madonnina Ravioli. Ambas são dedicadas à culinária italiana e têm menus com inspiração nas tradições da Toscana. Ao longo de 25 anos de carreira, ele se consolidou como restaurateur referência e, também, consultor gastronômico. A quem acompanha a lida do empresário na TV, a associação ao programa Mais Você (Globo), de Ana Maria Braga, é imediata. Se, hoje, ele é mentor de candidatos em realities como Super Chef, outrora sagrou-se o “chef dos chefs” na mesma atração. Isso porque participou, em 2009 e em 2011, do concurso Chef versus Chef e os pratos criados por ele receberam a melhor votação de jurados e do público. Foto: Divulgação É claro que ele já foi sondado a estrelar atrações gastronômicas. Não aceitou, ainda, por estar focado nos restaurantes que capitaneia e nos projetos que coordena. “Sempre valeu a pena participar dos programas de televisão e estou à disposição para voltar quando for chamado”, afirma. O restaurateur sabe que é um desafio ser empresário no Brasil. E, apesar das agruras, da tamanha burocracia e afins, atua de forma bastante produtiva como consultor gastronômico. Nos dois últimos anos, participou de festivais gastronômicos em várias cidades do País e ministrou cursos de culinária italiana nos principais eventos do setor, a exemplo do Prazeres da Mesa ao Vivo, realizado no Senac. Entre os conselhos que costuma dar aos jovens chefs e empreendedores, ele destaca os mais sinceros, em italiano: “como diria a minha mãe, ‘quello che ci và ci vuole’, quer dizer: ‘o que é preciso é necessário’. É necessário e importante manter o padrão de qualidade do produto que você se propõe a oferecer. E ‘tutto che ci metti lo ritrovi’, ou seja, tudo o que você coloca ou agrega você encontra”, exemplifica, dizendo que quando se coloca um bom vinho numa receita o resultado será bom. Para bom queijo ralado, idem, e assim por diante. “Faça o que você gosta, antes de tudo, e bem feito. Você colherá um bom resultado. Se não for assim, a vida ficará difícil”, sintetiza. Food truck?Voltando à baila dos realities e das tendências gastronômicas atuais, entre elas a onda food truck, ele se mostra extremamente enlevado pela iniciativa de cozinheiros coerentes, mas pondera até que ponto a opção serve, de fato, como alternativa à minimização dos altos custos de operação de um restô convencional. “No Brasil, o que funciona é o bom, bonito e barato. Creio que não temos ainda grande consumo nas ruas, como acontece em outros países. Os restaurantes que participam das feiras gastronômicas têm produto adequado para isso, e pode ser uma forma de levá-lo para novos consumidores. Um food truck pode ser bom para um empreendedor autônomo, pois é uma renda a mais. Mas o custo de tudo no Brasil é muito alto, o investimento é forte e é preciso analisar se o custo/benefício compensa”, avalia. Lucca e outras memóriasEle nasceu em São Paulo, mas mantém raízes na Itália dos ascendentes – os pais imigraram para cá. Periodicamente, visita a região da Toscana (Lucca), terra dos avós, com quem aprendeu, ainda criança, a fazer pratos típicos da região Norte. Recorda que, em domingos como hoje, de almoço em família, e em datas comemorativas como Páscoa, Dia das Mães e Natal, a mãe e a avó dele preparavam ravioli e outras massas, com molhos deliciosos para acompanhar as carnes trazidas pelos caçadores, como marrecos, perdizes e codornas. “Fazia-se uma brincadeira. Quem encontrasse primeiro o chumbinho numa das carnes jogava no prato, fazendo um barulho. Nesse momento todos faziam um brinde com vinho”, sintetiza. Foto: Divulgação Stinco Di Maile Ele, que é membro da Federacione Italiana Cuochi e da Associação da Boa Lembrança, é do tipo que cozinha com a alma, independentemente do vulto que tenha o comensal sentado à mesa. “Todos os clientes que entram nos meus restaurantes são tratados da mesma forma. Cozinhamos com amor, para que o cliente goste daquilo que estamos oferecendo”. Guarda com carinho, claro, a lembrança de haver cozinhado para Rubinho Barrichelo e Michael Schumacker, num jantar especial da Fórmula 1. E também para o saudoso tenor Luciano Pavarotti, para quem criou o Gnocchi per Pavarotti, prato que está no cardápio de seus restaurantes – a massa da focaccia italiana, o feijão branco e o tomate estão unidos na receita. Tempero brasileiroÉ característica do chef, aliás, valorizar ingredientes bem tupiniquins e revelá-los nos pratos italianos que defende. Adora temperos como sálvia, alecrim, manjericão e pimentas, carne de porco, peixes como o filhote e o pirarucu, as farinhas de mandioca e fubá, as raízes, os queijos mineiros (que hoje possuem excelente qualidade), frutas e legumes. Mantém fornecedores fiéis e, ao lado deles, se incumbe da seleção dos ingredientes. Os tantos afazeres o afastaram do fogão, por contingência, algo de que sente falta. “Mas tenho uma equipe que está comigo há anos, muito bem treinada, que elabora as receitas tal e qual. Dentro do possível, cozinho e estou sempre nos meus restaurantes”. Foto: Divulgação Tortelli de Abóbora O projeto e a decoração de cada um deles são zelados de pertinho – bem como os demais que coordena. Arquiteto por formação, Ravioli nunca abandonou o primeiro ofício – ele se tornou cozinheiro a “convite” de um irmão que mantinha uma pizzaria na época da era Collor. “Tenho a arquitetura no sangue. Meu bisavô veio para o Brasil para construir as escadas do Museu do Ipiranga e meus familiares também seguiram a arquitetura, realizando grandes obras em Nova York. Faço o projeto e acompanho cada detalhe das minhas obras dos restaurantes”, resume.