CINEMA

'Casa Grande', que estreia nesta quinta-feira, é um filme sincero

Filme tem o mérito difícil de alcançar de unir sofisticação com uma narrativa simples

João Nunes
23/04/2015 às 05:00.
Atualizado em 23/04/2022 às 15:53

Pela inteligência e capacidade de interpretar o próprio trabalho — algo difícil de encontrar entre os cineastas — Fellipe Barbosa, diretor de 'Casa Grande' (Brasil, 2014), protagonizou um dos melhores debates do Festival de Paulínia do ano passado. Esta introdução fala muito do próprio filme, que ganhou quatro prêmios em Paulínia (ator e atriz coadjuvantes, roteiro e prêmio do júri), que se somam a outros nacionais (entre eles, júri popular no Rio e da Associação Brasileira de Críticos de Cinema - Abraccine, e na Mostra de São Paulo) e internacionais. Mérito 'Casa Grande', que estreia nesta quinta-feira (23) em Campinas, tem um mérito difícil de alcançar, pois une a sofisticação no tratamento dado aos vários elementos do filme (como roteiro, diálogos, maneira de filmar) com uma narrativa simples que vai ao encontro do grande público. Ou seja, tem linguagem apurada, mas nunca pedante ao ponto de se tornar hermético e, portanto, inacessível. Ao contrário, narra uma história linear e eficiente que pode soar simples demais (pelo menos ao olhar de certa crítica) e, no entanto, aborda de maneira clássica um drama familiar, em especial, de um adolescente e seu rito de passagem na direção do mundo adulto. Alguma novidade? Nenhuma. Mas a vida é feita de recorrências e a história do garoto Jean (Thales Cavalcanti) é uma delas. Entretanto, na sensibilidade do roteiro do próprio diretor (com Karen Sztajnberg) e na abordagem de Fellipe como diretor residem a força do filme. Classe alta Além disso, 'Casa Grande' (o título nada aleatório) toca num universo temido (sabe-se lá porque) no cinema brasileiro que adora favelas, misérias e violência na periferia, como se temas sociais tivessem valores intrínsecos neles mesmos. Ora, tema algum melhora ou piora um filme. Pois neste caso, um assunto desprezado, o mundo da classe alta, rendeu um belo trabalho. E as razões são muitas. A começar que o diretor faz um filme solar pautado por cores de diversos matizes e por uma fotografia (de Pedro Sotero) que não se esconde na nebulosidade — como se esta tivesse méritos só por não temer o escuro. Some-se uma mise-en-scène exemplar em se tratando de cinema nacional — muitas vezes precárias por puro preconceito contra a preparação de elenco. Pois a encenação do filme é convincente com a proposta realista dele. E isto valorizou os atores, caso do protagonista sem experiências anteriores e de Marcello Novaes, que ganhou fôlego como ator pela atuação. Contraponto Estamos na casa grande dos ricos decadentes, o que implica na existência do seu contraponto, a senzala. Pode soar um tanto maniqueísta esta separação especialmente porque, na história, são tendências opostas, e Jean, uma vez que não encontra eco nas mentiras e na hipocrisia da família abastada recorre à senzala. No entanto, essa impressão passa quando nos damos conta de que Jean é um pouco o alterego do diretor, ele próprio nascido em meio a uma família rica e formado nos melhores colégios particulares. Portanto, fala com conhecimento de causa. Então nós entendemos de onde vem a transparência e a sinceridade do filme — qualidades nada desprezíveis.

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