LALÁ RUIZ

Carnaval do desapego e outras folias

14/02/2013 às 05:00.
Atualizado em 26/04/2022 às 04:43

Quando a gente vai mudar de casa é que percebe quanta coisa acumulou ao longo dos anos. Foi o que aconteceu comigo no Carnaval. Durante boa parte do feriado, pratiquei a arte do desapego, ou seja, troquei a folia pela revisão das quinquilharias, já que terei novo endereço em breve. Além de picar recibos de contas antigas e papelada inútil guardada não sei porque razão (fato que me valeu uma boa reação alérgica por conta dos ácaros), comecei a me desfazer de bens queridos — mas esquecidos nos armários entulhados — para iniciar um novo período na minha vida com menos bagagem.Confesso que não foi fácil começar esse processo de deixar os objetos irem embora para serem aproveitados por outras pessoas. Não é uma coisa tão simples como picar papel, por exemplo (apesar do perigo de alergia iminente que essa atividade mecânica carrega). Você pega aquela caneca que não usa há milênios e pensa: “Puxa, comprei não lembro muito bem quando mas tomei tanto café com leite nela...” Mas, não tem jeito, é um processo inevitável. Desapegar é preciso.O saldo da minha folia na faxina foram sete sacos (enormes) de lixo reciclável, caixas de louças, talheres e eletrodomésticos antigos já doados para uma igreja e taças, tulipas e canecas de chope presenteadas aos amigos. Porém, a Quarta-Feira de Cinzas não marcou o fim da folia do desapego. Para mim, ela apenas começou: nos próximos finais de semana tenho outros encontros marcados com estantes de livros e discos. Aí é que a coisa vai pegar. Será que consigo me libertar? Só o caminhão de mudança vai mostrar...***E entre uma faxina de armário e outra, aproveitei também para ir ao cinema, afinal, era feriado. Assisti a 'Lincoln', de Steven Spielberg. Grande atuação de Daniel Day-Lewis, fato importante da história norte-americana retratado de forma interessante, bons personagens secundários, mas nada que vá mudar a história do cinema. É um filme correto, com o selo de qualidade que marca os trabalhos de Spielberg, mas que não entra para a minha lista de melhores do ano (e, se fosse votante da Academia, não daria o Oscar ao longa).Além de 'Lincoln', finalmente fui conferir 'Django Livre', de Quentin Tarantino. Sabe aquela frase típica de final de semana-feriado-férias “acho que vou sair e pegar um cineminha”? Definitivamente ela não se aplica ao mais recente trabalho do diretor norte-americano. 'Django Livre' é cinemão. Do roteiro à trilha sonora fenomenal, passando pelos diálogos impagáveis e pelos momentos 'Balada do Pistoleiro' com sangue a perder de vista, esse tributo aos westerns spaghetti é um alento em meio à avalanche de filmes sem graça produzidos por Hollywood nos últimos tempos. Esse, sim, merece um Oscar, mas, acho difícil que isso venha a acontecer. É politicamente incorreto demais. Afinal, que outro diretor batizaria um escravo de Luigi; daria um close no saco escrotal de um ator ganhador do Oscar; escolheria como peso da balança de um mundo dividido pela escravidão um alemão caçador de recompensas; e misturaria James Brown com Enio Morricone? Tarantino, Quentin Tarantino.

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