COLÔNIA PORTUGUESA ||| ENTREVISTA

Zé Português mantém chama lusitana

Comerciante José dos Santos Antônio divide o balcão do City Bar com a presidência da Casa de Portugal

Rogério Verzignasse
22/09/2018 às 17:51.
Atualizado em 22/04/2022 às 01:22
Zé Português é associado há mais de 30 anos à Casa de Portugal: "participar do grupo é muito apaixonante e as pessoas se entregam" ( )

Zé Português é associado há mais de 30 anos à Casa de Portugal: "participar do grupo é muito apaixonante e as pessoas se entregam" ( )

O comerciante José dos Santos Antônio, de 65 anos, nasceu no Lugar dos Bernardos. A aldeia ficava lá no distrito de Leiria, em Portugal. O pai dele era lavrador. Com 15 anos, mudou-se para o Brasil à procura de trabalho. Fugia do país economicamente arrasado pela ditadura de Salazar. E, assim como ele, os irmãos se mudaram para cá, estabeleceram-se e nunca mais voltaram. Em Campinas, o José se tornou dono do Bar Copacabana, na esquina da Barão de Jaguara com a Benjamin Constant. Virou patrão, ganhou dinheiro, comprou a padaria Inca. E ficou famoso na cidade como o Zé Português. Há 28 anos, veio a consagração. Ele comprou o City Bar, estabelecimento sessentão, ali ao lado do Centro de Convivência, reduto de gerações e gerações de estudantes, políticos, empresários, operários, artistas… A cidade inteira passa pelo City. José passa o dia no balcão. Mas ainda assim foi escolhido como presidente da Casa de Portugal. A missão é difícil, ele sabe. Os membros da colônia local se desdobram para manter de pé um clube que nasceu, há 60 anos, com um único propósito: manter acesa a chama da cultura lusitana, que veio do além-mar e não pode morrer. Confira os principais trechos da entrevista do Zé Português ao CorreioCorreio Popular - O Zé Português, do City Bar, já era famoso demais em Campinas. Mas hoje está à frente de uma nova empreitada. Responde pela presidência da Casa de Portugal. O cargo assustou? Afinal, é uma novidade para quem trabalhou como comerciante a vida toda. O senhor teve de se preparar, estudar, pensar? Zé Português: Que nada. Eu fui eleito presidente agora, mas sou associado há mais de 30 anos. E ocupei cargos lá dentro. Fui diretor, por exemplo. Procurei dar uma alavancada no Rancho Folclórico, que mantém a tradição de trazer para o público a cultura portuguesa. E eu me envolvi demais. Tocava reco-reco, carregava piano, ia pra baixo e pra cima levando o grupo. Então, trabalhar na Casa de Portugal não foi nenhuma novidade. E tem mais. A diretoria atual é formada pelos associados engajados de sempre. Gente da velha guarda, que mantém a entidade. Mas não existe renovação? Os associados também são os mesmos de sempre? A Casa de Portugal está aberta a novos associados, qualquer quer seja a origem. Espanhóis, italianos, alemães, japoneses… Porta aberta. A gente vê pela multidão que participa das festas, dos jantares. A origem não importa. É vinho e bacalhau pra todo mundo. Essas pessoas ajudam a manter a casa, aparecem nos eventos. Sócios mesmo, uns 90 ou 100, que pagam mensalidades simbólicas, são sim portugueses ou descendentes. É o grupo que nunca perdeu vínculo, que não se afasta. Então são os jantares e as festas que mantêm a Casa de Portugal, certo? Não dá para pagar as contas só com as mensalidades dos sócios… Certo. Temos o sócio, temos milhares de convidados que comparecem aos jantares e aos shows, o próprio Rancho Folclórico se apresenta pelo País todo e ajuda a compor o caixa. O fato é que a Casa de Portugal, com 60 anos de idade, está firme. Não é fácil. Mas não devemos um tostão. Fica difícil pagar funcionários, certo? Tem a questão dos encargos trabalhistas… Na verdade, temos quatro funcionários. Todo evento, todo jantar é feito com mão de obra voluntária. Os associados se oferecem para ajudar. Claro, a gente investe muito na gastronomia. Porque a comida de primeira é que lota os salões. Mas aí a gente contrata pontualmente, para cada evento. A minha mulher Isabel, por exemplo, coordena a cozinha. E trabalha com pessoas contratadas especialmente para aquela noite. E os músicos do Rancho Folclórico? Eles ganham? E como a Casa de Portugal faz com as despesas de hospedagem e viagem, já que eles se apresentam por todo o Brasil? O Rancho também é formado por voluntários, gente de todas as idades. As despesas com hotel e viagem são pagos por quem contrata a apresentação. Muitas vezes o show acontece em espaços culturais, escolas, e são gratuitos. Aí, até quem convida oferece o próprio lar para o pessoal passar a noite. É aquela história: tudo por amor à arte. Tudo para preservar a cultura portuguesa.   Mas se não há pagamento ao músico, a rotatividade deve ser alta. O que eles apresentam? Preservamos a cultura trazida pelos portugueses: músicas regionais, de domínio público. Ninguém sabe nem quem foi o autor. Versos passados de pai para filho, de geração em geração. De Norte a Sul de Portugal. Mas os membros do Rancho são brasileiros mesmo. E de todas as idades. A rotatividade é alta, sim. Muitos jovens deixam o grupo para estudar, para trabalhar… Então quem entra é apresentado aos integrantes, aprende sobre o folclore e se apaixona. O senhor não teme que a Casa de Portugal acabe? Não enquanto um desses associados da casa estiver vivo. Participar do grupo é muito apaixonante e as pessoas se entregam. E a dedicação mantém a Casa. Vai durar muito.

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