ACUSADO DE CORRUPÇÃO

Volta de Zé Carlos é marcada por ‘defesa’ sem consistência na Câmara de Campinas

Presidente retoma condução das sessões; PSOL adere à abertura de investigação

Ronnie Romanini e Thiago Rovêdo
23/08/2022 às 11:11.
Atualizado em 23/08/2022 às 11:11
Mariana Conti e Paulo Bufalo, vereadores do PSOL, aderiram ao grupo de Nelson Hossri, que segue buscando 11 assinaturas necessárias para abrir Comissão Especial de Inquérito (CEI) (Kamá Ribeiro)

Mariana Conti e Paulo Bufalo, vereadores do PSOL, aderiram ao grupo de Nelson Hossri, que segue buscando 11 assinaturas necessárias para abrir Comissão Especial de Inquérito (CEI) (Kamá Ribeiro)

O vereador e presidente da Câmara de Campinas, Zé Carlos (PSB), alvo de uma operação que o aponta como responsável por pedir propina a empresas terceirizadas da Casa de Leis, retornou aos trabalhos na segunda-feira (22), presidindo a 21ª Reunião Ordinária. Zé Carlos fez um pronunciamento em que disse estar na tribuna "por uma questão de respeito aos meus eleitores, aos cidadãos de Campinas, aos meus pares e a essa instituição" e afirmou estar certo de que será comprovado que as acusações feitas contra ele não são procedentes. Entretanto, ele não entrou em detalhes sobre as denúncias.

"Neste momento, por orientação do meu advogado, não me pronunciarei porque ainda não tivemos acesso aos autos do processo. Neste país todos são inocentes até que se prove o contrário (...) Estou no meu quinto mandato de vereador e tenho uma biografia ilibada, tanto na vida pública como na privada, e farei questão de deixar clara a verdade por trás do que está sendo dito assim que minha manifestação for possível."

Ainda durante o discurso, o presidente da Câmara agradeceu ao Ministério Público e à Polícia pelo tratamento respeitoso que tiveram no dia da operação e garantiu: "Pode ter certeza que ninguém vai atrapalhar investigação nenhuma (...) estou esperançoso na minha defesa".

Zé Carlos também esteve pela manhã no Teatro Bento Quirino, que vem sendo utilizado pela Câmara, onde realizou alguns despachos. Nos bastidores, quando falava sobre o caso, o parlamentar negava qualquer acusação e se dizia vítima de perseguição política.

A pressão que vem sendo feita para que Zé Carlos deixe o cargo de presidente da Câmara pode resultar em outro feito inédito na Casa de Leis de Campinas. Se ele sair, quem vai assumir será a primeira vice-presidente Débora Palermo (PSC). Com isso, ela será a primeira mulher a presidir a Câmara na história da cidade.

Caso ela decida ficar no cargo, há um porém - Débora não poderá concorrer a uma nova eleição, já que o Regimento Interno da Câmara não permite reeleição para a presidência na mesma legislatura. Se Débora não quiser assumir, o próximo e último na linha sucessória é Luiz Rossini (PV), que também é líder de governo e segundo vice-presidente. Em caso de nova renúncia, uma eleição para um mandato tampão deverá ser feita.

CEI

Na Reunião Ordinária de quarta-feira (17), dia da operação, quatro vereadores - Nelson Hossri e Marcelo Silva, ambos do PSD, Major Jaime, do PP e Paulo Gaspar, do NOVO - apresentaram um requerimento conjunto solicitando a abertura de uma CEI. Na segunda-feira (22), os dois vereadores do PSOL, Mariana Conti e Paulo Bufalo, assinaram a lista que agora tem seis nomes. São necessárias 11 assinaturas para dar andamento ao pedido. 

"Nós conversamos e avaliamos que não dá para esse processo não ser investigado, analisado pela casa e essas informações ficarem apenas nos noticiários. É preciso que a Casa se debruce sobre as informações e possa ter acesso aos detalhes delas. Pelo que tem sido discutido, a origem dessas denúncias foi em gravações feitas pelos próprios envolvidos, mas o Ministério Público aparentemente colheu outras informações que queremos ter conhecimento. É necessário que façamos essa avaliação. Como nós destacamos, invariavelmente as situações de contratos terceirizados têm levado a desdobramentos como esses", avaliou Bufalo.

Além de acreditar que a CEI poderia dar mais respaldo para que a Casa conheça o conteúdo completo das denúncias, os vereadores do PSOL entendem que é necessário ampliar o que está sendo investigado pelo MP. "Existe uma discussão sobre se (a Comissão) se restringe a esse fato, que tem que ser investigado, mas é necessário aprofundar. Essa Casa tem um papel diferente e complementar ao MP, não apenas o de fazer o trabalho que ele já vem fazendo. O MP tem investigado esse escândalo de corrupção, mas é necessário que se trate politicamente, (descobrir) onde está a origem, como a gente faz para impedir que esses contratos terceirizados continuem acontecendo dessa forma corrupta e escandalosa como já temos experiências aqui na cidade de Campinas", acrescentou Mariana Conti.

Acesso aos autos

As defesas do presidente da Câmara de Campinas, Zé Carlos (PSB), e de seu funcionário comissionado Rafael Creato, ainda buscam o acesso aos autos para se pronunciarem de forma mais consistente e também montar a estratégia de defesa. Ambos são acusados de cometer corrupção passiva e pedir propina a empresários que prestam serviços terceirizados na Câmara e foram alvos de mandados de busca e apreensão na última semana.

O advogado de Zé Carlos, Ralph Tórtima Filho, informou que Zé Carlos ainda não teve acesso ao conteúdo das denúncias. Ele já pediu à Justiça acesso aos autos e também ao Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), mas não houve respostas de ambos os lados. Outro acusado do mesmo crime, Rafael Creato, servidor comissionado de Zé Carlos, por orientação da defesa, entrou em férias a partir desta segunda-feira. "Por orientação do advogado que o representa, o servidor decidiu se afastar utilizando-se de suas férias regulares e legais, permanecendo de qualquer forma à disposição das autoridades", informou a Câmara.

Haroldo Cardella, que representa Creato, desconhece por completo os elementos de prova que ensejaram a deflagração da operação e também informou que já pediu acesso aos autos, mas não teve sucesso. "É inadmissível e lamentável que em um Estado democrático o cidadão não tenha assegurado o seu direito constitucional de ter pleno acesso à íntegra do material colhido e já documentado em uma investigação. Essa demora absolutamente injustificada no compartilhamento dos elementos de prova contraria frontalmente os princípios da ampla defesa, do devido processo legal e da comunhão da prova", disse. 

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) informou que os autos ainda não foram liberados porque há diligências a serem feitas e publicizar os fatos pode atrapalhar a investigação. Assim que todos os documentos forem juntados, os advogados de defesa terão acesso.

A investigação começou a ser realizada no segundo semestre do ano passado, após denúncia feita pelo também vereador Marcelo Silva (PSD) junto ao MPSP. Ele recebeu de um funcionário de uma empresa terceirizada três gravações realizadas nas dependências da Câmara que demonstravam os pedidos de propinas feitos pelos investigados.

O MPSP apontou que após Zé Carlos assumir a presidência da Câmara, em janeiro de 2021, ele começou a chamar as empresas que prestam serviços terceirizados na Casa de Leis e propor pagamento de propina para que os contratos continuassem a ser renovados. O promotor Felipe Bertolli informou também que há gravações que corroboram com as acusações, nos quais é possível identificar tanto Zé Carlos, como Creato, pedindo a propina para que os contratos fossem renovados.

Um dos empresários abordados foi o dono do Grupo Mais (Mais Comunicação Integrada e Marketing), empresa que em 2019 ganhou a licitação de R$ 4,6 milhões para a gestão da TV Câmara. Ele é uma das testemunhas do MPSP que gravou em áudio os pedidos de propina que foram feitos pela dupla.

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por