ESCÂNDALO NA CASA DAS LEIS

Vereador Zé Carlos silencia, mesmo após ter acesso a autos

Advogado do presidente diz que qualquer menção incorre em violação do sigilo imposto pela juíza

Thigo Rovêdo/ [email protected]
26/08/2022 às 09:26.
Atualizado em 26/08/2022 às 09:26
O presidente da Câmara Municipal de Campinas, vereador Zé Carlos, durante a sessão ordinária realizada anteontem, quarta-feira: apesar de ter acesso aos autos, não tocou no assunto (Kamá Ribeiro)

O presidente da Câmara Municipal de Campinas, vereador Zé Carlos, durante a sessão ordinária realizada anteontem, quarta-feira: apesar de ter acesso aos autos, não tocou no assunto (Kamá Ribeiro)

O vereador e presidente da Câmara de Campinas, Zé Carlos (PSB), e o subsecretário de relações institucionais da Casa, Rafael Creato, mantiveram o silêncio um dia após, finalmente, terem tido acesso os autos das denúncias realizadas pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) na semana passada. A dupla é acusada de pedir propina a empresas terceirizadas que atuam na Casa de Leis em troca de renovação dos contratos.

O advogado Ralph Tórtima Filho, que representa Zé Carlos, afirmou que, apesar de a defesa ter tido acesso, o processo continua tramitando em segredo de Justiça e, por isso, nenhuma declaração sobre o conteúdo poderá ser dada. "A juíza decretou sigilo dos autos. Isso significa que apenas os advogados podem ter acesso ao conteúdo do processo, da investigação. Ao menos por enquanto não podemos divulgar nada, porque estaríamos violando a questão do sigilo", explicou.

Com o acesso, as defesas de Zé Carlos e de Creato puderam, finalmente, conhecer os conteúdos gravados por empresários, que provariam o pedido de propina. Um dos abordados foi o dono do Grupo Mais (Mais Comunicação Integrada e Marketing), empresa que, em 2019, ganhou a licitação de R$ 4,6 milhões para a gestão da TV Câmara. Ele é uma das testemunhas do MPSP e gravou os supostos pedidos de propina que foram feitos pela dupla.

Haroldo Cardella, responsável pela defesa de Creato, explicou que também utilizou o dia de ontem (quinta-feira) para avaliar os documentos, mas que também não iria falar sobre o seu conteúdo por enquanto. 

O acesso aos autos e, principalmente, aos áudios é também uma demanda dos vereadores da Câmara. Os parlamentares necessitam das gravações para dar andamento em ações no Legislativo, como a da instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e até mesmo um pedido de afastamento do mandatário da Câmara.

Até agora, Marcelo Silva (PSD), o denunciante do caso; Nelson Hossri (PSD), que propôs a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI); e a bancada do PT já procuraram o MP ou a Justiça de forma oficial em busca de acesso aos autos e aos áudios. Por enquanto, nenhum deles obteve sucesso. 

"Eu ainda não tive acesso e estou aguardando. Creio que nos próximos dias teremos novidades", afirmou Marcelo. 

Já Nelson Hossri acredita que a Justiça vai precisar liberar os autos e, consequentemente, os áudios, em breve. "Acredito que a resposta chegará em breve. Nós reforçamos mais uma vez o pedido, aos autos, uma vez que ele foi disponibilizado à defesa. Acho que mais cedo ou mais tarde tudo vai ter que se tornar público", comentou.

Nelson Hossri, que capitaneou a criação de uma CPI - já assinada por Marcelo, Major Jaime (PP) e Paulo Gaspar (Novo) -, conseguiu mais duas adesões esta semana: os dois vereadores do Psol, Mariana Conti e Paulo Bufalo, assinaram a lista, que agora soma seis nomes. São necessárias 11 assinaturas para dar andamento ao pedido. 

"Até ontem o Ministério Público não tinha respondido ao nosso pedido de reunião. Vamos reforçar e seguimos aguardando, visto que consideramos necessárias mais informações para dar andamento nos processos que podem ocorrer na Câmara", afirmou a vereadora Guida Calixto (PT).

O caso

No dia 17 deste mês, Zé Carlos e Rafael Creato foram alvos de uma operação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), que apura cobranças de propinas para a manutenção ou prorrogação dos contratos de execução de serviços terceirizados junto ao Poder Legislativo. 

Foram cumpridos mandados na residência do vereador, no Conjunto Habitacional Padre Anchieta, um na casa de Creato, em Jundiaí, outro no seu escritório de advocacia em Campinas, na Câmara Municipal e no Teatro Bento Quirino, onde atualmente funciona o gabinete do presidente e outros setores da Casa. 

Houve a apreensão de diversos documentos, computadores, pen drives e aparelhos de telefone celular.

De acordo com o promotor do Gaeco, Rodrigo Lopes, a investigação começou a ser realizada no segundo semestre do ano passado, após denúncia feita pelo também vereador Marcelo Silva (PSD) junto ao MPSP. 

O órgão apontou que, depois de Zé Carlos assumir a presidência da Câmara, em janeiro de 2021, ele começou a chamar as empresas que prestam serviços terceirizados na Casa de Leis e propor pagamento de propina para que os contratos continuassem a ser renovados. "Eram pedidos genéricos de dinheiro, uns com valores mais baixos e outros mais altos, dependendo do tamanho da empresa. Os investigados chegaram a ameaçar uma das empresas, afirmando que, se ela não pagasse o que era pedido, haveria outra prestadora de serviço que estava disposta a pagar", afirmou o promotor no dia da ação.

O promotor Felipe Bertolli informou também que há gravações que corroboram as acusações, nas quais é possível identificar tanto Zé Carlos quanto Creato pedindo a propina para que os contratos fossem renovados. "Quando ele [Zé Carlos] desconfiou que poderia estar sendo gravado, passou a pedir que deixassem os celulares e relógios no banheiro antes das reuniões ocorrerem. Vamos aprofundar as investigações sobre outras empresas e outras diligências podem ser feitas", garantiu.

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