lago dos cisnes

Um espetáculo que deixou saudade

Inspirada na famosa peça teatral, a praça dava um toque de charme à região central

Francisco Lima Neto
05/04/2020 às 12:54.
Atualizado em 29/03/2022 às 16:22

Campinas é uma cidade que inicialmente foi forjada pelos ciclos do açúcar e do café. Com o passar dos anos, por conta dos novos tempos que chegavam, trazendo consigo a modernização e uma nova economia, a cidade expandia em construção urbana e em população. Havia a necessidade de dar espaço ao novo. Muitas vezes isso foi feito sem critério e sem o devido cuidado com o que, à época, talvez nem fosse enxergado como patrimônio histórico, colocando a baixo construções que foram símbolos de uma era e de uma sociedade. A cidade está cheia de exemplos desses, um deles é o Parque Lago dos Cisnes, que as gerações mais novas, principalmente aquelas que vieram a partir da década de 1980, não puderam conhecer. O lago ficava onde hoje é o Terminal Central, no meio do Viaduto Miguel Vicente Cury. Ele foi inaugurado na década de 1960 e era uma das principais praças da cidade. A beleza do espaço atraía gente de todas as regiões. Aos finais de semana, um dos principais programas das famílias era levar as crianças para brincar ao ar livre em meio às plantas floridas, pinheiros e as altíssimas palmeiras. Era difícil quem não ficasse encantado com os cisnes, patos e outras aves que dominavam o lago. Casais de namorados passeavam de mãos dadas, descalços, curtindo a tranquilidade daquele cenário de uma Campinas que ainda se movimentava em outra velocidade. Os que queriam um pouco mais de privacidade para curtir o momento ficavam nas pontes sob o lago, curtindo todo aquele cenário quase bucólico. Quem teve a sorte de viver aqueles anos com certeza se lembra com saudade daquele espaço de convivência e que conferia um charme especial à região Central. A praça tinha até um relógio de sol, que foi projetado pelo engenheiro Renato de Almeida Prado Costallat e que foi doado por Francisco Monteiro Salles, até ser transferido para a Lagoa do Taquaral. A temática da praça foi pensada sob inspiração da peça teatral "O Lago dos Cisnes" e serviu de cenário para as fotografias de vários casamentos. A construção do Viaduto Cury, que a envolvia, começou em 1961 e foi projetada porque antes havia apenas uma passagem que ligava o Centro à Vila Industrial. Ela substituiu a Porteira da Capivara, que era estreita e permitia a passagem de apenas um carro por vez, sendo controlada por um guarda. O viaduto foi planejado para criar uma ligação entre a entrada da cidade, pela Avenida Prestes Maia, e a região central, dando acesso pela Avenida Moraes Sales. O viaduto foi inaugurado em 1963. O destino da praça queridinha dos campineiros, que existiu por cerca de 21 anos, começou a ser definido em 2 de junho de 1984, quando o prefeito Magalhães Teixeira anunciou a construção do terminal. Aliás, o local já era cotado para essa finalidade desde a década de 1970. Um terminal provisório foi construído na Avenida Moraes Sales, onde hoje é a sede da Guarda Municipal (GM). Foi chamado de Terminal II, em alusão à já existência do Terminal I, em frente ao Mercado Municipal, o chamado Terminal Mercado, na Avenida Benjamin Constant. O terminal II resistiu até a década passada. Algum tempo antes de seu fim, a Praça Lago dos Cisnes já não conservava o glamour e a beleza de seus tempos áureos. As famílias, crianças e casais apaixonados passaram a dar lugar aos moradores de rua, usuários de drogas e até prostituição, como um prenúncio de como ele estaria hoje. As obras logo foram iniciadas, não sem a reclamação e desaprovação dos que adoravam aquele espaço. Mas, em dezembro de 1985 foi inaugurado o Terminal Central. Contudo, nem os 35 anos de apagamento daquele espaço foram suficientes para que a população esquecesse aquele ponto que ficou imortalizado na memória, no coração e nas fotografias de muitos. Modernidade ‘engoliu’ igreja e teatros O crescimento de Campinas está permeado por histórias de construções que foram apagadas, como por exemplo, a Igreja do Rosário, que ficava em frente ao Palácio da Justiça, na Avenida Francisco Glicério, e foi demolida como parte do plano desenvolvimentista da cidade. A igreja, que teve grande participação dos negros na sua construção e na sua viabilização, teve de sair para dar lugar ao alargamento daquela que é a principal via do Centro. Essa história teve destaque nessa página, na edição do dia 27 de outubro de 2019, com o título "A igreja apagada pelo ‘progresso’. A falta de um olhar mais delicado para a história também fez com que a cidade tivesse dois imponentes teatros demolidos no mesmo lugar, como é o caso do Teatro São Carlos, que ficava na Rua Treze de Maio, atrás da Catedral. O teatro, inaugurado em 1850, foi demolido em 1922, com a promessa de dar lugar a outro ainda mais imponente e moderno, digno de uma cidade que crescia. A nova casa de espetáculos foi inaugurada em 1930, com o nome de Teatro Municipal, batizado mais tarde, em 1959, de Teatro Carlos Gomes. No entanto, em 1965, ele também foi demolido, com a justificativa de problemas estruturais. Em seu lugar hoje existe uma loja de departamento, conforme história publicada nesta coluna, no dia 29 de setembro de 2019, sob o título "Uma ruidosa ausência".

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