Propostas apresentadas por vereadores querem criar regras que dificultem a prática nas universidades de Campinas; regras envolve instituições de ensino e empresas
CPI da Assembleia Legislativa ouvidos depoimentos de estudantes e professores da PUC-Campinas ( César Rodrigues/ AAN)
Foram protocolados nesta sexta-feira (27) na Câmara Municipal de Campinas três projetos de lei que visam coibir os trotes violentos na cidade. As medidas preveem o fim dos trotes em ruas, avenidas e praças públicas, o fim do patrocínio de eventos estudantis por empresas que fabriquem, comercializem ou distribuam bebidas alcoólicas. Também será cobrada maior responsabilidade das instituições de Ensino Superior, que ficarão obrigadas a instaurar processo disciplinar contra o aluno que praticar trote. A iniciativa do legislativo campineiro foi motivada pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instalada pela Assembleia Legislativa que investigou uma série de denúncias de violação de direitos humanos nas universidades paulistas, entre elas a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Punições A expectativa é de que as leis coloquem um ponto final na prática de ações violentas contra ingressantes das universidades públicas e privadas. A primeira norma determina a proibição de realização de trotes em espaços públicos. Outro projeto determina que mesmo que o trote ocorra fora dos das dependências da universidade, a instituição instaure processo disciplinar contra o aluno que praticar violência física, psíquica e verbal contra os calouros. Empresas que fabricam, comercializam ou distribuam bebidas alcoólicas ficam impedidas de patrocinar qualquer evento estudantil, sob pena de multa para aquelas que descumprirem. Os projetos, feitos em coautoria pelos vereadores Thiago Ferrari (PTB) e Pedro Tourinho (PT), também preveem pagamento de multa por quem promove trote nos espaços públicos. “Não são os estudantes que vão por conta própria. Eles vão como parte do trote, com meta de dinheiro que tem que coletar no sinal. Sempre tem uma entidade ou alguém que está promovendo por trás”, explicou Tourinno. Debate Os valores das multas ainda não foram definidos. Sobre a fiscalização, os vereadores esperam definir em um debate. “A gente não pode criar uma atribuição, mas através de provocação popular, poderá ficar a cargo da Guarda Municipal”, afirmou Ferrari. Os vereadores também irão buscar a realização de um convênio entre a Prefeitura e o Disque-Denúncia para que as informações sobre trotes possam ser feitas de forma anônima através do serviço. A medida também deve facilitar a fiscalização. Tourinho ressaltou que o trote acontece em muitas instituições de ensino e que algumas contam com o próprio serviço de disque trote, outras não. “Um serviço municipal irá centralizar as denúncias”, explicou. “É um canal para receber as denúncias sem expor o denunciante”, acrescentou Thiago Ferrari. Após CPI O pessebista ressaltou que, em decorrência da CPI do Trote da Assembleia Legislativa, ficou claro que Campinas é uma das cidades com maior incidência de trote violento. “As medidas que estamos propondo visam deixar claro que Campinas abomina o trote violento, a nossa preocupação está em proteger os alunos que tiveram e que têm os direitos individuais transgredidos e criar instrumentos para que as próprias instituições e o poder público possam agir”, completou Ferrari. As propostas irão passar pelas comissões de legalidade, mérito, educação, políticas públicas e em seguida vai para votação. Atualmente, está em tramitação na Câmara um projeto de autoria de Pedro Tourinho, que institui a semana de combate ao trote violento e prevê ações solidárias. "A ideia é que o poder público trabalhe junto com as universidades, acompanhando e estimulando a realização de eventos que promovam a recepção solidária, produtiva e positiva aos ingressantes", afirmou. "A gente entende que o poder público pode contribuir no combate às violações de direitos humanos e trote violento" , completou Tourinho. Depoimentos em audiências A iniciativa adotada pelo legislativo campineiro foi motivada pela CPI do Trote da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), que investigou denúncias de violação de direitos humanos em universidades paulistas. Ela encerrou seus trabalhos no último dia 10. Depois de 40 audiências, nas quais foram ouvidos mais de 100 depoimentos, o relatório, de 190 páginas, reúne em torno de 9 mil documentos, entre fotos, vídeos de trotes violentos e depoimentos de sete mulheres estupradas em festas universitárias. A CPI foi presidida pelo então deputado Adriano Diogo (PT) e pede que o trote seja classificado como crime de tortura no Código Penal Brasileiro. Duas das audiências da CPI foram realizadas em Campinas já que as denúncias recebidas envolviam estudantes da PUC-Campinas e da Unicamp. Denunciados se calam Professores alunos e profissionais já formados foram ouvidos. Grande parte dos denunciados de Campinas deixou de comparecer às audiências. Cinco deles apresentaram justificativa de que conseguiram na Justiça um habeas corpus. Contra os acusados pesam denúncias de assédio sexual, de coagir os calouros a consumir e fabricar drogas para serem consumidas durante festas. Uma das vítimas relatou ter sido forçada a lamber o chão do banheiro e cheirar cocaína e só após ter inalado o pó soube que se tratava de farinha de trigo. O relatório final da CPI do Trote faz 39 recomendações que foram encaminhadas ao Ministério Público e pede prosseguimento das investigações sobre violação de direitos e a punição dos agressores. O documento também seria enviado a diversas autoridades brasileiras e ao papa Francisco. No caso do papa, o relatório será encaminhado porque duas das universidades denunciadas são vinculadas à Igreja Católica: a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e a Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).