EXECUÇÃO FISCAL EFICIENTE

TJSP decide extinguir 130 mil processos, a maior parte de cobrança de tributos

Quantidade abrange as 59 comarcas da 4ª Região Administrativa Judiciária sediada em Campinas; maioria envolve ações de até R$ 10 mil

Edimarcio A. Monteiro/[email protected]
20/08/2024 às 05:14.
Atualizado em 20/08/2024 às 11:55
Os processos extintos na região representam 13,5% dos cerca de 1 milhão abrangidos pela medida em todo o Estado de São Paulo; em Campinas, a medida envolve 8.746 execuções (Kamá Ribeiro)

Os processos extintos na região representam 13,5% dos cerca de 1 milhão abrangidos pela medida em todo o Estado de São Paulo; em Campinas, a medida envolve 8.746 execuções (Kamá Ribeiro)

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) extinguiu 130.504 processos neste ano nas 59 comarcas da 4ª Região Administrativa Judiciária (RAJ), com sede em Campinas, com base nas novas regras de execução fiscal estabelecidas pela resolução nº 547 do Conselho Nacional de Justiça, de fevereiro passado.

Cerca de 60% dos 20,4 milhões de processos em andamento na Justiça paulista se referem a tributos municipais e estaduais em atraso e inscritos no cadastro da dívida ativa, como os impostos Predial e Territorial Urbano (IPTU), sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e multas.

De acordo com o TJ, a maior parte dos processos extintos envolve valores inferiores a R$ 10 mil, que não cobrem o custo do próprio processo, desde que estejam sem movimentação útil há mais de um ano e sem citação do devedor, ou nos casos em que houve a citação, mas os devedores não possuem bens penhoráveis.

“A ideia do projeto Execução Fiscal Eficiente é dedicar o esforço de trabalho aos casos envolvendo valores mais altos. Isso é eficiência”, afirmou a coordenadora adjunta do Núcleo de Cooperação Judiciária para Tratamento Adequado da Alta Litigiosidade Tributária do Tribunal de Justiça, juíza Paula Fernanda de Souza Vasconcelos Navarro. A medida deve resultar na aceleração das ações em andamento, uma vez que retira esses processos da fila de julgamento.

Os processos extintos na região representam 13,5% dos cerca de 1 milhão abrangidos pela medida em todo o Estado. Em Campinas, a medida envolve 8.746 execuções. A Prefeitura informou que a medida faz parte de convênio assinado pelo município com o CNJ, o TJSP, a Procuradoria Geral do Estado e o Tribunal de Contas do Estado.

A Secretaria Municipal de Justiça e a Procuradoria-Geral do Município já trabalham para dar início à identificação dos processos com valor menor que R$ 10 mil e passíveis de extinção para gestão de uma execução fiscal eficiente. A medida é realizada a partir do Protocolo de Execução nº 01, vinculado ao Termo de Cooperação Técnica assinado pela cidade em maio.

“A finalidade deste trabalho é trazer maior recuperação da dívida ativa, ao mesmo tempo em que se incentiva a desjudicialização das cobranças, facilitando o acerto dos débitos pelos contribuintes hoje inadimplentes com os tributos e multas municipais”, disse o secretário de Justiça, Peter Panutto.

A 4ª RAJ abrange 19 das 20 cidades da Região Metropolitana de Campinas, além de outras, como Amparo, Jundiaí, Limeira, Mogi Mirim e Mogi Guaçu, totalizando 60 municípios. Na RMC, a única cidade fora da área de cobertura é Indaiatuba, integrante da 10ª RAJ, sediada em Sorocaba.

A previsão é que a iniciativa resulte na extinção de dois milhões de ações ao longo de 12 meses. A resolução 547 do CNJ inclui processos sem movimentação útil há um ano, sem citação do inadimplente ou sem apreensão de bens. A medida, porém, gerou crítica por parte das prefeituras. “Nós somente conseguimos enfrentar excessos se temos instrumentos de penalidade. Se isso não se efetiva, entendemos que perdemos um instrumento de gestão”, afirmou o secretário-geral da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) e prefeito de Araraquara (SP), Edinho Silva (PT).

PENALIDADES

“É por meio das penalidades, infelizmente, que nós conseguimos coibir excessos de trânsito e, inclusive, de criadouros de dengue”, acrescentou Edinho Silva. Ele afirmou que a única maneira de enfrentar despejos irregulares de lixo é com instrumentos de penalidade.

A FNP propôs ao presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, em março, o aprimoramento das execuções fiscais para evitar transtornos para as prefeituras. Sem nenhuma alteração definida até o momento, a extinção dos processos judiciais segue em andamento.

Para a coordenadora do Núcleo de Cooperação Judiciária, os órgãos públicos têm outros instrumentos para cobrar os inadimplentes e buscar receber as dívidas.

“Os débitos mais baixos podem ser cobrados administrativamente pelas prefeituras e pelo Estado e, para isso, é preciso haver uma mudança de mentalidade, porque cobrar dívida tributária não é, necessariamente, entrar com processo de execução fiscal. Os entes credores têm outros meios, como o protesto, o parcelamento incentivado e a conciliação, que já se mostraram mais efetivos nos municípios que adotaram essas práticas”, disse a juíza Paulo Navarro, que também é assessora do Gabinete Civil da Presidência do TJSP.

As mudanças envolvendo a execução fiscal ocorre em um momento que os cartórios de Campinas registraram um aumento de 172,8% no número de protestos, de acordo com balanço divulgado pelo Instituto de Estudos de Protestos do Títulos do Brasil – Seção São Paulo (IEPTB/SP). Responsáveis também por Paulínia, os cartórios fecharam junho com o total de 369.671 registros de pessoas físicas e jurídicas com contas em atraso contra 135.506 de igual mês de 2023. Para a tabeliã substituta do 2º Cartório de Protesto de Campinas, Michele Saconi Sigoli, a alta está relacionada à menor tolerância dos credores com a inadimplência e ao aumento no número de empresas e órgãos públicos que fecharam parcerias para fazer os registros.

Dentro do projeto de Execução Fiscal Eficiente, foi firmado um acordo de cooperação técnica entre o CNJ, TJSP, Procuradoria Geral do Estado, Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) e dezenas de prefeituras paulistas. A resolução 547 também estabeleceu novas normas para o ajuizamento de novos processos de execução fiscal. O órgão público precisa ter realizado a tentativa de cobranças administrativas, como o uso do protesto; a comunicação aos serviços de proteção ao crédito; a anotação em órgãos de registro de bens e imóveis; a tentativa de conciliação (ou parcelamento da dívida ou oferecimento de desconto); a adoção de solução administrativa (como notificação do executado para o pagamento) e a indicação de bens ou direitos penhoráveis do devedor.

A resolução 547 do CNJ e a portaria nº 2.738 do TJSP seguiram a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ao julgar Tema 1184. “Se decidiu que era possível e legítimo que o Poder Judiciário extinguisse a execução fiscal de baixo valor”, explicou a presidente da Comissão de Direito Tributário Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Subseção Campinas, Susy Gomes Hoffmann, doutora em Direito Tributário. Para ela, a medida vai trazer muito mais eficiência para o Poder Judiciário, já que houve o entendimento de que é muito caro ficar arcando com os custos de um processo parado e possivelmente sem êxito, ao não conseguir fazer com que o contribuinte pague esse valor.

“A OAB vê com bons olhos essa ação para que o Poder Judiciário não seja um local de cobrança, uma empresa de cobrança, mas que seja uma instituição que vai julgar conflitos quando houver alguma dúvida sobre aquele tributo a ser pago”, afirmou Suzy Hoffmann. Para ela, o protesto em cartório já surte efeito em relação ao contribuinte devedor, ao ficar impedido de conseguir financiamento ou abrir conta bancária, obrigando-o a quitar os débitos para conseguir esses acessos.

Para a Frente Nacional dos Prefeitos, a resolução, apesar de legítima ao ter o propósito de reduzir o volume de ações judiciais para agilizar o trâmite processual, impacta a arrecadação, o combate à sonegação e as atividades ordenadoras dos municípios, especialmente do IPTU e das multas administrativas. De acordo com a entidade, o efeito concreto será o estímulo ao descumprimento deliberado das exigências legais em relação às dívidas de valores mais modestos.

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