95 ANOS

‘Terror ataca os EUA’, destacou o Correio sobre o 11 de Setembro

Jornal dedicou seis páginas para relatar ataques terroristas nos Estados Unidos

Isadora Stentzler
04/08/2022 às 10:01.
Atualizado em 04/08/2022 às 10:08
Dois aviões foram sequestrados e lançados em ataques kamikazes contra o World Trade Center, transformando em ruínas as duas torres, consideradas símbolos norte-americanos (Cedoc/Rac)

Dois aviões foram sequestrados e lançados em ataques kamikazes contra o World Trade Center, transformando em ruínas as duas torres, consideradas símbolos norte-americanos (Cedoc/Rac)

Há 21 anos, as páginas do Correio Popular davam lugar a uma cobertura histórica que marcou o mundo moderno: os ataques terroristas de 11 de setembro. Com a manchete "Terror ataca os EUA", o jornal dedicou seis páginas para contar os impactos do atentado contra o país que é considerado a maior democracia do mundo.

A icônica capa que circulou no dia 12 de setembro trazia uma foto que ocupava quase o tamanho total da página e, ao lado, o resumo do que havia ocorrido no dia anterior. "Foi a maior onda de ataques terroristas aos EUA. Dois aviões foram sequestrados e lançados em ataques kamikazes contra o World Trade Center — um dos ícones sagrados dos norte-americanos —, em um intervalo de 18 minutos. As duas torres gêmeas desabaram. Outro avião espatifou-se contra o Pentágono, em Washington, a central de defesa e de inteligência dos EUA. Em Nova Iorque, a estimativa é de que haja pelo menos 10 mil mortos. O mundo teme a 3ª guerra", lia-se em duas colunas da capa.

Os atentados começaram ainda pela manhã. Assim como o mundo parou para acompanhar as imagens que eram transmitidas pela TV naquela terça-feira, jornalistas na redação do Correio se alvoroçaram ante um dos fatos mais emblemáticos que precisariam narrar. Sem a possibilidade de estarem in loco, buscaram — por meio de agências internacionais — informações e imagens que transformaram a edição da época.

Na sequência daquelas seis páginas, que circularam nas mãos dos campineiros no dia 12 de setembro, a página 2 destacava as ruínas que restaram dos símbolos americanos. Uma das imagens mostrava a chocante cena de um homem que pulou de uma das janelas ante o terror. Em outra, uma das torres do World Trade Center tomada pelas chamas. O que restava do prédio, que antes tinha 400 andares, eram ruínas, fumaça e fogo, em uma altura próxima ao chão.

O jornal lembrou, no entanto, que aquele não era o primeiro atentado ao prédio. "O World Trade Center (WTC) foi alvo de um ataque terrorista em 26 de fevereiro de 1993 contra uma das torres gêmeas do complexo de sete edifícios, causando a morte de seis pessoas, ferimentos em cerca de mil e prejuízos estimados em US$ 1 bilhão. Uma bomba com 600 quilos de dinamite colocada em uma rampa de acesso no segundo piso de uma garagem subterrânea de seis níveis, sob a Torre 2, abriu uma cratera de 30 metros de diâmetro e cerca de 60 de profundidade, provocando ainda dois incêndios nas imediações", lembrou o jornal.

Crônicas do medo

A complexidade da cobertura, no entanto, não estava apenas em lembrar o passado e narrar o episódio, mas também em citar seus reflexos futuros e denunciar os impactos na vida daquela população.

Um espaço para isso foi criado no rodapé daquela edição. Chamado de "Crônicas do Medo", a seção trazia relatos de pessoas que tanto viviam na região como estudavam o tema.

Quem escreveu uma delas foi o engenheiro Paulo Negrão, que na época morava em São Francisco. No seu texto, ele lembrava que um dia anterior àquele 11 de setembro, Campinas havia perdido o prefeito Toninho (PT), assassinado no município. "O sentimento de angústia que tive no início da noite de anteontem tomou proporções de quase pânico ao acordar com as notícias de que os Estados Unidos estavam sob uma onda de ataques terroristas sem precedentes. Fiquei pasmo em frente à TV enquanto acompanhava ao vivo a queda das torres do World Trade Center em Nova Iorque. As rádios locais davam conta de que os prédios federais de São Francisco estavam sendo evacuados, que as pontes estavam operando em regime de alerta e que as pessoas deviam ficar em casa", narrou, em trecho. "Certamente os acontecimentos de ontem vão repercutir em toda a geopolítica mundial."

O brasileiro Raul Costa, de 33 anos, estava em um escritório no 25º andar de uma das torres no momento do atentado. Ele conseguiu falar com jornalistas por telefone, após fugir do local. "A explosão foi assustadora. Um barulho inacreditável. O prédio balançou de um lado para o outro. A sensação era de que não ia ficar em pé", disse. Devido à fumaça, Costa contou que sentia dificuldade em respirar e enxergar, mas subiu para o 33º andar, onde encontrou um bombeiro que o auxiliou a deixar o prédio. "Quando saí, vi as torres em fogo e vi que iriam cair a qualquer momento. Só parei de correr 20 minutos depois."

Reação internacional

Horas depois do atentado, os órgãos de inteligência dos Estados Unidos já apontavam para um possível mandante. O nome de Osama Bin Laden logo foi estampado em veículos de comunicação que traziam a trajetória do homem que já integrava a lista dos 10 mais procurados pelo FBI. Naquele 11 de setembro, Bin Laden estava desaparecido e seu paradeiro era uma incógnita.

Analistas políticos ouvidos na época também associavam grupos do Oriente Médio ao ataque. O psicólogo e pesquisador norte-americano Clark Cauley, autor do livro "Pesquisando o Terrorismo", explicou em uma das matérias publicadas na série do Correio Popular que "grupos extremistas em geral acreditam que valores ameaçados são mais importantes do que a vida" e por isso, esses grupos sentiriam que valia a pena correr o risco de retaliações.

A análise vinha ao encontro do que o então presidente dos Estados Unidos George W. Bush havia prometido em cadeia nacional após o ataque. Em um pronunciamento a partir do Salão Oval da Casa Branca, após deixar o refúgio de 100 metros abaixo do solo onde permaneceu, disse que os EUA iriam retaliar contra aqueles que estavam por trás dos "atos maldosos".

No resto do mundo, o chefes de Estado de diversos países enviaram comunicados ao governo americano, lamentando os atentados terroristas e oferecendo solidariedade. O jornal Correio Popular compartilhou a manifestação de oito desses países. Um deles foi do chanceler cubano Felipe Pérez Roque. Devido ao embargo econômico de EUA contra Cuba, havia especulações de que o país caribenho estivesse por de trás dos ataques. O chanceler negou e ainda condenou energicamente a onda de violência.

Reação brasileira

No Brasil, o então presidente Fernando Henrique Cardoso emitiu uma nota e deu um pronunciamento oficial no Palácio do Planalto a jornalistas. Na ocasião, ele comparou a explosão ocorrida no World Trade Center a uma guerra e disse que o Brasil estava sujeito a "turbulências e dificuldades econômicas" devido ao atentado.

"É provável que, diante da virulência dos atos praticados, haja consequências em todo o mundo, principalmente econômicas. O Brasil é parte do sistema mundial e pode vir a ser direta ou indiretamente afetado por essas turbulências e pelas dificuldades que eventualmente venham a surgir na área econômica", falou.

As seis páginas que circularam no dia 12 de setembro de 2001 no Correio Popular traduziram a violência sem precedentes que causou tristeza e desespero.

A lembrança do dia 11 de setembro de 2001 ainda hoje resiste no imaginário e memória de muitas pessoas. Mesmo as que não estiveram lá sabem onde estavam e o que faziam naquela hora. Para os jornalistas do Correio Popular da época, a resposta a esta pergunta é unânime: contando a história.

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