maneira criativa

Terrenos de descarte de lixo tornam-se hortas orgânicas em Hortolândia

Moradores iniciaram plantio para combater o despejo irregular de entulhos nas áreas

Eliane Santos/ [email protected]
18/06/2022 às 09:37.
Atualizado em 18/06/2022 às 09:37
André Nascimento Amorim Santos, morador do Terras de Santa Maria, fez uma horta nos fundos de seu quintal, onde planta hortaliças e frutas para sua família, parentes e vizinhos (Gustavo Tilio)

André Nascimento Amorim Santos, morador do Terras de Santa Maria, fez uma horta nos fundos de seu quintal, onde planta hortaliças e frutas para sua família, parentes e vizinhos (Gustavo Tilio)

Moradores da cidade de Hortolândia, na Região Metropolitana de Campinas, encontraram uma maneira criativa, ecológica e sustentável para combater o descarte de restos de construção e até de lixo em áreas próximas às suas residências: o cultivo de hortas orgânicas. A iniciativa — que ajuda a preservar o meio ambiente e evitar a proliferação de insetos, como o Aedes aegypti — chamou tanto a atenção que a própria Prefeitura lançou um Programa de Horta Comunitária.

Um dos moradores da cidade, Márcio Agostinho da Silva, de 39 anos, que trabalha como leiturista de uma companhia de água, viu a oportunidade de cultivar verduras, frutas e até mesmo legumes sem o uso de agrotóxicos em um terreno próximo a uma linha de transmissão de energia no Parque Terras de Santa Maria. A ideia cresceu e envolveu outros moradores do bairro, que também começaram a plantar e se envolver no que se transformou em uma 'horta comunitária'.

Hoje, a horta comunitária atrai pessoas de várias idades, desde os mais jovens até aposentados. Alguns, inclusive, plantam de forma 'particular' e acabam até tirando um dinheirinho com a venda, a preço acessível, e complementando a renda familiar.

Silva conta que tudo começou justamente para combater o despejo irregular de entulhos e lixo. "Começamos a plantar próximo a uma linha de transmissão onde antes tinha muito lixo. Recentemente, perto da minha casa, a Prefeitura retirou vários caminhões de lixo e de entulhos", conta.

Agora, é possível encontrar pés de morango, banana, cana, mamão, hortaliças como alface, agrião, tomates, temperos (cebolinha, salsinha), entre outros produtos orgânicos, em vários pontos do bairro. 

André Nascimento Amorim Santos, de 38 anos, também morador do Terras de Santa Maria, se empolgou e acabou fazendo uma horta nos fundos de seu quintal. Hoje, fornece principalmente hortaliças, não só para sua família, mas para parentes e vizinhos. Ele começou plantando em pneus usados. "Tinha uma ideia antiga de plantar, mas não contava com muito espaço. Agora, já faço meus canteiros e planto bastante coisa, morango, pepino e até mandioca. Além de ajudar o meio ambiente, também ajudo meu bolso, pois tudo está muito caro no mercado", brincou Santos, que utiliza até a água da chuva para regar a plantação.

A professora titular do Departamento de Química da Universidade de Campinas (Unicamp), Ana Flávia Ferreira, avaliou como importante a existência de pequenos e médios espaços se transformarem em hortas sustentáveis, sejam comunitárias ou não. De acordo com ela, muitas vezes, os legumes, frutas e verduras que os consumidores adquirem no mercado tradicional são plantados com agrotóxicos em toda sua cadeia de produção, colaborando para a poluição do meio ambiente.

"Sou extremamente a favor que cada pessoa deixe um espaço de terra em seu quintal para cultivar uma horta. Os ganhos são muitos. Além de fazer o próprio ciclo de alimentação, sem poluir o meio ambiente, há aspectos importantes para outros fatores, como menos poluição, já que um quintal abandonado pode servir também como depósito de lixo e de criadores do mosquito da dengue. É muito importante que esses espaços sejam aproveitados de maneira sustentável", completou.

Para a professora Julicristie Machado de Oliveira, doutora em Saúde Coletiva da Unicamp, as hortas são espaços potenciais de construção de sustentabilidade, pois auxiliam na preservação das espécies vegetais, da agroecologia e na construção do senso de preservação ambiental. "Nesse sentido, as hortas ecológicas podem contribuir com a redução da emissão de gases do efeito estufa, na fixação do carbono, na eliminação do uso de fertilizantes sintéticos e agrotóxicos, além de reduzir a utilização do transporte rodoviário e dos combustíveis fósseis."

Projeto municipal

A Prefeitura de Hortolândia também pretende combater o despejo clandestino na cidade com um novo projeto de Horta Comunitária. A cidade tem 90 pontos clandestinos de descarte. A primeira horta criada pela comunidade com o apoio da Prefeitura foi no Jardim Colinas. A ideia deu tão certo que, em maio deste ano, o programa ganhou um upgrade com o anúncio de novas áreas. Desta vez, o projeto é encabeçado pela Secretaria de Inclusão e Desenvolvimento Social, junto com a pasta do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Coordenadoria de Extensão do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) e a Organização da Sociedade Civil (OCS) Amater, que capacitará os moradores sobre as técnicas de manejo do solo e do plantio de legumes, hortaliças e ervas. Os próximos passos serão dados pela equipe do Instituto Federal de São Paulo, por meio do programa 'Fruticando', com o apoio de servidores da Economia Solidária e do programa Capacita Hortolândia.

A previsão é que as novas hortas comecem a ser implantadas na segunda quinzena de julho. Uma ficará ao lado do campus do IFSP, na Vila São Pedro, e outra no Jardim Amanda II. A expectativa agora, segundo o diretor de Gestão e Economia Solidária do Município, Amarantino Jesus de Oliveira, conhecido como Tino Sampaio, é beneficiar 40 famílias. "São terrenos grandes: o do Jardim Amanda 2, ao lado do condomínio popular Bromélias, tem três mil metros quadrados, e o do Instituto Federal possui cerca de seis mil metros quadrados. Ambos estão sendo usados como pontos de descarte irregular de lixo e entulhos diversos e provocam poluição ambiental, contaminação do solo e criadouros do mosquito da dengue", enfatizou. 

"A Prefeitura limpa os terrenos, e o pessoal volta a jogar lixo. Isso nunca tem fim, sem contar que os gastos para limpeza são expressivos. Então, resolvemos dar outra destinação para essas áreas e expandir o projeto", completou. 

Para tirar o projeto do papel, a Administração investiu cerca de R$ 30 mil na parceria com a Amater. "As hortas comunitárias, além de colocar alimento na mesa dos moradores da cidade, vão conscientizar sobre a importância do trabalho coletivo e da preservação das áreas que hoje são usadas para o descarte irregular", afirma o secretário de Inclusão e Desenvolvimento Social, Francisco Raimundo da Silva.

Poderão participar do Programa Hortas Comunitárias os moradores dos bairros Vila São Pedro, Terras de Santa Maria, Jardim das Colinas, Vila Real e Parque Orestes Ôngaro. Após a implantação da horta, um estudo sobre o potencial de empreendedorismo do projeto será aplicado. Verificadas as oportunidades, a Prefeitura não descarta futuramente a cessão definitiva da área pública para a comunidade.

Os vizinhos Silva e Santos, inclusive, já fazem trabalho de conscientização entre os demais moradores para que passem a plantar também na área do IFSP. 

Segurança alimentar

Hortolândia também desenvolve um Plano Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional. No final de 2021, a Prefeitura deu um passo importante para isso ao publicar uma lei municipal que trata da definição de parâmetros para elaboração e implementação da Política e do Plano Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional no município.

(Com informações de Lauro Sampaio)

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