NO PÁTIO FERROVIÁRIO

‘Shopping Popular’ avança e parte para tomada de preços

Sindicado dos ‘camelôs’ garante que obras terão início neste primeiro semestre

Edimarcio A. Monteiro/ [email protected]
27/02/2024 às 08:08.
Atualizado em 27/02/2024 às 08:08
Armazém de Importação da extinta Companhia Paulista de Estradas de Ferro, localizado ao lado da Estação Ramos de Azevedo; patrimônio tombado será restaurado e revitalizado (Alessandro Torres)

Armazém de Importação da extinta Companhia Paulista de Estradas de Ferro, localizado ao lado da Estação Ramos de Azevedo; patrimônio tombado será restaurado e revitalizado (Alessandro Torres)

O Shopping da Economia Informal, conhecido como Shopping dos Camelôs, encontra-se atualmente na fase de levantamento de preços conduzida pelo Sindicato dos Empreendedores Individuais de Ponto Fixo Público e Móvel de Campinas (Sindipeic). O início das obras está programado para ocorrer no primeiro semestre deste ano, conforme anunciado pelo vice-presidente da entidade, o vereador José Carlos dos Santos, também conhecido como Carlinhos Camelô (PSB). Essa decisão vem após a recente aprovação do estudo técnico preliminar, ou estudo conceitual, para a utilização de dois edifícios do complexo ferroviário localizado no Centro pela Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas (Condepacc). Carlinhos Camelô afirmou que as obras devem ter início em maio ou junho. A polêmica transferência de cerca de 1.250 camelôs das ruas do centro para esse novo shopping persiste há pelo menos 15 anos.

O vice-presidente do Sindipeic relatou que três construtoras foram consultadas para a elaboração de orçamentos, e o sindicato aguarda a entrega das propostas. Posteriormente, será realizada uma assembleia da categoria para a escolha da empresa responsável pela execução da obra, cujo prazo de conclusão está previsto para dois anos e meio. O projeto arquitetônico é totalmente inovador, destacando a restauração do centenário prédio do Armazém de Importação e da Nova Casa de Carros. Essa abordagem visa minimizar o impacto causado por novas construções, além de integrar-se ao projeto de implantação do Trem Intercidades (TIC) São PauloCampinas, que terá sua estação na Estação Cultura (antiga Fepasa). Vale ressaltar que o empreendimento está alinhado com a proposta da prefeitura para a recuperação de todo o complexo ferroviário, abrangendo uma área de 200 mil metros quadrados e incluindo 42 prédios históricos tombados.

O PROJETO

Segundo Carlinhos Camelô, o novo centro de compras está projetado para ocupar uma área construída de 48 mil m2, contando com um andar, elevador panorâmico e um mirante que proporcionará uma visão panorâmica do complexo. Destacam-se o Prédio do Relógio, atualmente em processo de restauração, e a Rotunda, uma construção circular historicamente utilizada para manobras de locomotivas. O vereador aguarda a apresentação das propostas das empreiteiras para definir o custo do empreendimento, o qual será integralmente financiado pelos próprios camelôs que se estabelecerão no local.

"O que todo mundo quer saber é quanto o shopping vai custar e quanto pesará no bolso de cada um", afirmou. Ele acrescentou que todos esses pontos serão discutidos na assembleia da categoria, ainda sem data marcada. O projeto anterior, que foi descartado, previa o shopping com 51 mil m2 de área construída e um investimento de R$ 115 milhões. A nova proposta é inspirada no desenho de um trem, com o espaço ocupado pelos boxes sendo os vagões e uma parte a ser construída remetendo a uma locomotiva. Ela também inclui estacionamento térreo com vaga para 700 a 800 veículos, praça de alimentação e um pergolado. O novo projeto prevê uma faixa de distância da linha férrea para permitir a circulação do TIC, que terá o leilão para escolha da empresa ou consórcio que implantará o projeto realizado na quinta-feira (29).

No final de 2021, o Sindipeic chegou a assinar contrato com uma construtora para execução do centro de compras popular, mas as obras não tiveram início por falta de aprovação do projeto pelo Condepacc. Ele acabou descartado e um novo foi elaborado com consultoria do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, que aprovou a proposta no final de novembro passado. Ela está agora em fase de avaliação pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat), subordinado à Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, que também tombou a estação ferroviário. Porém, vereador disse estar confiante na aprovação, pois este órgão também foi consultado durante a discussão com o conselho municipal.

As próximas etapas incluem ainda a aprovação dos projetos executivos pelo Condepacc, da planta do empreendimento pela prefeitura e a obtenção da licença para execução. Segundo Carlinhos Camelô, foi solicitado um novo orçamento a construtora contratada inicialmente e a outras duas para avaliação da melhor oferta. 

A previsão de inaugurado do shopping popular é no final de 2027. A realização da obra e a liberação das ruas pelos camelôs faz parte do projeto de revitalização da área central da prefeitura. Os comerciantes deverão deixar o entorno do Terminal Central e ruas como Álvares Machado e Benedito Carvalho Pinto, que foram ocupadas nos anos 1990. "Uma das ações mais efetivas de revitalização do Centro é o shopping popular, que vai tirar 1,2 mil camelôs dessa área e colocar um ambiente comercial com estacionamento, praça de alimentação, organizado", afirmou o secretário municipal de Relações Institucionais, o vice-prefeito Wanderley de Almeida (Wandão - PSB).

PRÉDIOS HISTÓRICOS

O novo projeto do centro de compras prevê a restauração e ocupação de dois prédios tombados. O mais antigo tem em torno de 150 anos e é um marco do auge da cafeicultura na região. É o Armazém de Importação da antiga Companhia Paulista de Estradas de Ferro, inaugurada em agosto de 1872. Ela marcou a extensão da linha férrea de Jundiaí até Campinas, passando a ser a principal ligação da cidade com o Porto de Santos para exportação das casas de café, com o trem substituindo os burros, jegues e mulas que faziam o transporte em longas e demoradas viagens por estradas de terra.

A estrada de ferro "foi fundamental para grandes transformações, tanto do ponto de vista urbano quanto arquitetônico e econômico", explicou a arquiteta, urbanista e historiadora Ana Villanueva. Ela lembrou que pouco antes da chega da linha de trem, em 1869, Campinas tinha em torno de 8 mil habitantes, 1,4 mil prédios, 41 ruas e 175 estabelecimentos comerciais. A estação de trem passou a ser uma barreira física que dividiu a cidade, tendo na frente o Centro e na parte de trás deu origem a Vila Industrial, bairro de operários onde também morava parte dos funcionários da Companhia Paulista e depois também foram instalados abatedouros, curtumes e outros equipamentos.

Ela mostra ainda que o shopping ocupará o vão existente da atinga garagem de carros, ponto de discórdia que levou ao veto do projeto anterior. O desenho atual mostra uma construção alta que preserva o esqueleto do galpão, inclusive a parte de ferro da armação da cobertura, que passa a ter a função de um pergolado para a área de alimentação.

A coordenadora de Extensão Cultural da prefeitura, Fabíola Rodrigues, destacou que o galpão de carros da Companhia Mogiana, que depois foi incorporado pela Fepasa, foi tombado pelo Condepacc em 2014, o que o impede a sua demolição. Ela explica que, apesar de suas linhas arquitetônicas simples, o prédio tem uma grande importância histórica por ter feito parte de processo de industrialização ferroviária.

"Nesse galpão foram construídos os carros [vagões para transporte de passageiros] usados na única linha férrea que se dirigia a Brasília em sua inauguração e que partia de Campinas. Abrir mão dele é jogar a história no lixo", afirmou, por sua vez, o historiador Henrique Anunziata, da Coordenadoria Departamental de Patrimônio Cultural (CDPC), órgão da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo. Ele destacou ainda que o prédio, construído entre 1954 e 1955, usou técnicas de construção consideradas inovadoras para a época.

Até então, o padrão era o uso de tijolo, cimento e pedra. Já o galpão foi feito erguido com estrutura de ferro presa com parafusos, o quer permitiu ter pé direito alto a um grande vão para a produção dos carros. O galpão está hoje tomado por lixo; muitas telhas de amianto, que não são as originais da construção, estão quebradas; e as paredes estão pichadas. 

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