PESQUISA DO OBSERVATÓRIO DA PUC-CAMPINAS

RMC tem 305 mil jovens em situação de vulnerabilidade

São pessoas de 0 a 24 anos, que representam 10% de toda população da região

Edimarcio A. Monteiro/ edimarcio.augusto@rac.com.br
15/10/2022 às 06:03.
Atualizado em 15/10/2022 às 06:03

Gabriel Malta, Luís Carlos da Silva Coelho, Guilherme Ghittonni, e Adriane Ramos (Rodrigo Zanotto)

Adriane Ramos, de 15 anos, estava na sexta-feira (14) no primeiro dia de teste de emprego em um estabelecimento comercial do Centro de Campinas. Para a função de promotora, o salário é de R$ 600, vale-transporte e almoço, mas tudo na informalidade, sem registro em carteira. Ela espera ser aprovada para ajudar o pai no sustento da família, composta por mais dois irmãos menores. Após a mãe abandoná-los, a renda é composta pelo Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família) de R$ 600 e os bicos que o genitor faz para conseguir algum dinheiro extra.

A situação de vulnerabilidade social de Adriane é um exemplo compartilhado por outras aproximadamente 305 mil crianças, adolescentes e jovens de 0 a 24 anos de idade da Região Metropolitana de Campinas (RMC), aponta estudo feito pelo economista e docente extensionista Cristiano Monteiro da Silva, do Observatório Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC). O número mostra o contingente dessa faixa etária inserido em famílias que dependem dos programas sociais dos governos federal, estadual e municipal para sobreviver.

Ele ganha contornos mais alarmantes ao revelar que essas crianças e jovens representam 10% de toda a população de 3,3 milhões de habitantes da RMC. É como se toda a população de uma cidade do porte de Sumaré ou a soma dos moradores de Americana e Nova Odessa dependesse de ações sociais para ter o que comer.

O estudo “Os aspectos da vulnerabilidade agravantes da vivência social dos jovens em cidades da Região Metropolitana de Campinas” joga a lupa sobre essa realidade ao analisar os dados da ferramenta Consulta, Seleção e Extração de Informações do Cadastro Único (Cecad 2022), que é a inscrição obrigatória para as famílias terem acesso aos programas sociais. O trabalho “alerta para a necessidade da proteção social complexa para os diversos agrupamentos de pessoas, incluindo os jovens nas cidades da Região Metropolitana”, diz Monteiro Silva.

Ações estratégicas

Em um momento de campanha eleitoral para governador de São Paulo e presidente da República, o pesquisador ressalta que nenhum dos candidatos para esses cargos apresentou propostas para tentar reverter esse quadro. Com isso, o fato da RMC ser uma das regiões mais ricas do Pais, ter um Produto Interno Bruto (PIB) de US$ 60 bilhões (R$ 319 bilhões), equivalente ao de países como o Uruguai, ser um polo de alta tecnologia e possuir universidades de ponta se mostra um mundo muito distante da realidade dos jovens em vulnerabilidade social. 

Aos 18 anos, Gabriel Malta já foi borracheiro, entregador de pizza e passou por outras atividades, mas nunca teve registro em carteira. Atualmente, trabalha como divulgador no Centro, das 9 às 17 horas. Antes de ir trabalhar, faz curso de mecânico e à noite estuda no 1º ano do ensino médio. Ele joga suas fichas nos estudos para mudar sua realidade. “Assim que terminar os cursos e tirar a minha carta de motorista, vou ser mecânico e ser registrado”, afirma, em tom de esperança. Ele mora atualmente com a avó e uma irmã, com a renda vindo principalmente de uma aposentadoria e do Auxílio Brasil.

Luís Carlos Silva Coelho, de 16 anos, trabalha como promotor de venda para ajudar os pais nas despesas domésticas e na criação do irmão, de 15, e da irmã, 7 anos. Durante cinco horas por dia, das 11 às 16 horas, atua na Rua 13 de Maio, no Centro, para atrair clientes. “Só de aluguel são R$ 600, mas tem outras despesas”, diz. O pai trabalha como vigilante e a mãe é ajudante de cozinha. 

A conta no futuro

“Ele estão em uma situação de vulnerabilidade e é preciso que os poderes públicos adotem políticas estratégicas para resgatá-los nos mais abrangantes aspectos, educacional, de saúde, cultural, social”, cobra o pesquisador do Observatório PUC-Campinas, que há cinco anos se dedica a estudar a evolução social da RMC. Ele alerta que, se nada for feito, a Região Metropolitana perderá um enorme contigente de crianças e jovens que ficará segredado em um momento em que se discute a reindustrialização do País. É preciso preparar esse público para o um mundo mais digital e tecnológico.

Essa será uma conta que será cobrada logo, já a partir de 2030. Monteiro Silva ressalta que a população da RMC está envelhecendo em função da queda das taxas de natalidade, fecundidade e de crescimento populacional.

O estudo do economista aponta a queda da participação dos jovens de 0 a 15 anos na composição da população. Em Campinas, no ano de 2010, eles representavam 28 pessoas em cada 100 habitantes, proporção que caiu para 26 em 2020 e a projeção aponta para 26 na próxima década. 

Outras cidades sofrerão uma queda ainda maior. Em Hortolândia, por exemplo, a proporção que era de 34 em 2010 chegará a 26 em 2030.

Engenheiro Coelho tinha, na década passada, 38 jovens de 0 a 15 anos a cada 100 habitantes, número que caiu para os atuais 30 e a projeção é de 27 no próximo período. “Sem dúvida, a estrutura etária da população evidencia a diminuição da participação relativa dos jovens na sociabilidade das cidades da Região Metropolitana”, afirma Monteiro Silva.

Se nada for feito, ele explica que isso terá impactos importantes no futuro, como redução da População Economicamente Ativa (PEA), falta de mão de obra e até de recursos para a Previdência Social. Isso ocorrerá porque haverá mais aposentados e pensionistas se utilizando desse serviço e menos jovens contribuindo para a sua manutenção. Para o economista, é preciso que as intervenções ocorram agora para evitar as consquências futuras.

A falta de investimentos em ações públicas para permitir a preparação das crianças e jovens vai perpetuá-los na pobreza. O estudo feito pelo pesquisador do Observatório PUC-Campinas mostra que, com exceção da administração pública, a maioria dos trabalhadores da RMC ganha no máximo de 1 a 2 salários mínimos (R$ 1.212 a R$ 2.424). No setor de comércio, essa faixa salarial chega a 62,41% do total. No caso de serviços, 49,3%. Quem ganha de 4 a 7 mínimos (R$ 4.848 e R$ 8.484) é maioria apenas na administração pública, mesmo assim representa 24,45% do total. Isso leva a um desalento e os jovens a buscarem outros caminhos para a ascensão social. 

O body modification Guilherme Matheus Ghittonni, de 26 anos, já desistiu de buscar emprego convencional. Trocou essa estabilidade por trabalhar por um fixo, comissão e flexibilidade de horário para fazer tatuagens e colocar piercing. “O meu futuro está em continuar no body modification, carreira artística ou ser designer de joias, porque também levo jeito”, diz.

Prorrogação

O Ministério da Cidadania prorrogou, mais uma vez, o prazo para que integrantes do CadÚnico atualizem seus dados junto ao governo federal e continuem a receber os benefícios dos programas sociais. A data-limite, que terminaria ontem foi estendida para 11 de novembro. A decisão foi tomada por causa das enormes filas formadas em todo o País nos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), locais onde os dados são atualizados. 

A Secretaria de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direito Humanos de Campinas estima que 6.316 famílias integrem o CadÚnico no município. Desse total, 4.767 ainda não regularizaram a situação. A maioria, 1.015, é beneficiária do Auxílio Brasil e 690 do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Em Campinas, as famílias assistidas devem agendar o atendimento para atualização dos dados por meio do serviço 156 ou do WhatsApp do Cras da região onde mora. Veja os números: 

Região Norte: 99392-4913

Região Sul: 99443-8253

Região Sudoeste: 99493-1419

Região Noroeste: 99548-1412

Região Leste: 9-9476-4677

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Anuncie
(19) 3736-3085
comercial@rac.com.br
Fale Conosco
(19) 3772-8000
Central do Assinante
(19) 3736-3200
WhatsApp
(19) 9 9998-9902
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por